Diálogos na Casinha – Luis Algarra XX de XXX de XX (arquivo: repo_3975_3975_2-Gambiarra_Aprendizados.mp3) Voz Masculina - “(...) Porque neoliberal esse neo não convém, né, não tem nada de novo aí. Fala que esse tipo de educação tá formando idiotas úteis (...) úteis no sentido de utilitário, porque a escola é pra se criar uma profissão, não é esse o objetivo final? Você entra ali no jardinzinho de infância, no berçario você já sabe o que vai sair lá na ponta lá da linha de produção, como formado em...” Lu: “A pessoa, tipo... não tem um trabalho que leve o indivíduo que está ali naquela escola a descobrir o que ele gosta de verdade de fazer, o que a gente vê, eu tô cansada de ver e os pais falarem: faz direito porque dá grana, faz, escolhe uma coisa que da dinheiro, aí o neguinho faz o vestibular pra ver quanto é lá o salário, nos próprios guias do vestibulando tem do lado da profissão o quanto ganha. Não é por aí.” Voz Masculina - “Só a idéia de ser alguma coisa, você ter que ser advogado, você ter que ser médico, você ter que ser só uma coisa já é estranho. Não há opção de: ah eu vou ser alguma coisa agora e depois quem sabe. Essa noção de especialista é o caminho que, o cara entra lá no jardim de infãncia e sai especialista em alguma coisa. Se ele quis, se ele tivesse vontade, mesmo se ele tivesse vontade, uma pessoa que gosta de medicina, por que que uma pessoa que gosta de medicina não pode fazer letras? Quer dizer, ela pode fazer, mas uma pode virar hobby e a outra profissão.” Voz Masculina - “Veja só, quando você vai ao médico você procura um especialista para a doença que você tem, não é isso? Você adapta sua doença... (Interrompe a fala e escuta-se: não, eu vou no curandeiro). É sério, velho?” Diálogo - “Mas o curandeiro também tem sua especialização... O felipe é daqueles caras que já tomou a vacina do sapo, né não felipe? Então, e o curandeiro te dá injeção ou não Não cara, ele cura com um palito de dentes. É foda velho, o cara cura qualquer coisa Qualquer coisa, males da alma, do espírito e do corpo E galinha preta rola? Galinha preta só... Ai é outra linha né? Então essa é tua especialização né, mesa branca, mesa azul.. Voz Masculina - “Bom eu acho assim, outro dia eu aprendi que tem uma coisa chamada pedagogia e uma outra coisa chamada andragogia. Pedagogia é a educação das crianças e andragogia é a educação de adultos. E aí assim, parece que a característica principal da pedagogia, uma delas é que o aprendiz não escolhe o conteúdo que ele vai aprender, alguém determina pra ele o conteudo que ele vai aprender. Alguém, aí entra nessa questão do poder que você tava colocando, alguém tem o poder de escolher o que minha filha, o seu filho, a mirian, o gabriel, eles tem que aprender, né, o alec, vocês têm que aprender geografia hoje, escolhem o conteúdo e escolhem quando a criança vai aprender o quê. No caso dos adultos, a tal da andragogia, parte-se do princípio de que o aprendiz tem condição de escolher o que ele vai aprender. Então assim, quero aprender como é que eu consigo curar as pessoas batendo o tambor, aí você vai atrás desso conhecimento e aprende. Você vai e puxa esse conhecimento, você vai buscar esse conhecimento, ele não é empurrado pra você. Ocorre o que eu acho o que está acontecendo é que essa linha de criança e adulto na nossa sociedade tá cada dia mais ampla e complicada. Então assim, eu sinto que a minha filha de 10 anos de idade, já tem necessidade de escolher o que ela quer aprender, e ela não tem esse direito, então acho que começa daí essa violência. O programa curricular que é uma coisa reproduzida ano a ano, e que desrespeita o direito das crianças dizerem o que elas querem aprender. Tem algumas escolas que não é assim, né. Parece que a lumiar aqui em são paulo, algumas outras, não é isso. A escola da ponte lá em portugal, summer rio, que é cara pra dedeu, né. E aí você encontra uma escola dessas que tem uma proposta e aí você tem que deixar lá 1300 todo mês. Como é que fica, então a questõ não é só alternativas para nossos filhos, mas quando é que vai popularizar isso? Pra isso chegar na gente?” Voz Masculina - “Quando é que vai ter ensino de elite para todos? Uma coisa muito estranhana também e que a gente se acostumou a ter numa sala de aula 40 pessoas ouvindo e uma falando né, e um ensinado, porque que a gente concede este status a esse cara que tá lá, sendo que qualquer pessoa pode ensinar. Que tipo de benzimento, que tipo de áurea, de dom, de dom que permite ele assumir esse lugar de poder? Que que vocês acham disso?” Voz Masculina - “Eu acho que primeiro a maioria das pessoas que estão nessa posição de poder, alguém falou isso logo no começo, não lembro mas, acho que foi você, tava falando que tinha professores que você perguntava se estava lá por dinheiro ou por educação, acho que um pouco disso não é porque x professorx pode estar no lugar de poder, talvez ela nem se perceba nesse lugar, ela tá fazendo alguma coisa ali, que é o trabalho dela, trabalho trabalho, sabe, função técnica. Ela tá cumprindo a função que foi dado a ela, não há nada pensado ali. E aí nesse sentido, eu acho que muito dessa relação do saber, poder é até talvez perdido em um outro sentido, porque a gente tá tratando aqui do poder de delimitar qual o saber que vai tá acessível a cada um, mas tem aquele outro, que você saber alguma coisa também é um poder, aquele questão, é sei lá, a partir do momento em que você tem o conhecimento, tá me faltando exemplos aqui, você saber alguma coisa é uma capacidade de você não ser enganado, ludibriado, de você saber raciocinar, que também é uma relação de saber/poder que já é mais intrínseco ao próprio saber, que é essa questão. Mas essa coisa de hierarquia dentro da sala da aula, que é da escola formal, agora, eu fico me perguntando se na própria escola informal essa hierarquia não surge também. Porque muitas vezes a gente fica esperando pelo menos que vai dar um caminho inicial, que seja uma educação mais participativa, mas a gente sempre quer um pouco um início, alguém que guie também. Então assim tudo bem, essa posição hierárquica, talvez seja questionável, mas até que ponto não é certo também, alguém com mais saber, do que o outro, porque só há troca, aquela coisa da lei termodinâmica, só acontece troca quando alguém sabe mais do que o outro.” Voz Masculina - “Um estudo de caso assim, eu estudei quase a vida inteira em escola pública no rio grande do sul, estudei só o primeiro ano do colegial em escola particular, e assim muito por sorte, e sorte mesmo, mas também um pouco de esforço pessoal eu consegui entrar na universidade federal do rio grande do sul, e cara assim, uma coisa que eu percebi e que na época eu achei que era por causa da escola pública mas depois eu fui sacar que escola particular tem a mesma história, meu primeiro ano de faculdade foi uma decepção total, porque assim eu não tinha nenhuma, não só expectativa, mas assim eu não conseguia ter pensamente abstrato, eu não tive aula de filosofia, não tive aula de literatura e não tive aula matemática direito no colegial, mas assim, meu primeiro ano de faculdade foi um sofrimento total. E aí meu segundo ano de faculdade foi legal, o terceiro ano eu já tava de saco cheio, eu não aguentava mais palestras, eu tenho problemas, eu sou ddah, eu tenho distúrbio de deficit de atenção, hiperatividade, eu não consigo ficar sentado, olhando alguém falar, e ter que esperar meia hora pra mandar um papelzinho pro cara e se pá ele vai responder. Eu tenho uma coisa muito de conversação de entrar no meio, e eu falo o que eu quero e de repente as coisas voltam e tal. Então eu tenho uma grande dificuldade com o modelo expositivo assim, e isso é uma coisa que eu vejo assim, a gente pode falar de universidade pública e a gente pode falar de faculdadizinha particular caça niqueis ali da esquina, que o modelo não é questionavel. O modelo de ter uma pessoa falando e as outras pessoas ouvindo ele é na verdade muito pouco em densidade de aprendizado, porque na verdade ele presupõe que eu vou absorver o conhecimento, e na verdade nos sabemos que o pensamento não é transmissivel ele não é, não dá pra usar o paradigma de telecomunicações, shernel wiver (?) e a aqui pra lá, se não tiver ruído legal passou a mensagem e aprendeu, na verdade as coisas não são assim o aprendizado é muito mais de ambiente, (Interrompe a fala, ouve-se: falando pra 40 pessoas e achando que todo mundo...). Mas assim já tentando puxar um pouco pro outro lado um contraponto, e já tentando falar de internet e falar de como que Paulo Freire acontece de verdade com internet e que acontece nesse tipo de coisa. O brasil tem muito forte de ferramentas sociais, de tecnologia social de blog, orkut, fotolog, msn e sei lá o quê. Uma experiência muito doida foi o que aconteceu no Projeto metáfora, assim, eu vinha com essa coisa de decepção com ensino tradicional, com universidade, de desistir de universidade, passar por três universidades, eu vim prá são paulo, vim prá uma faculdade particular, desisti, tentei entrar na usp, não consegui, desisti de novo, e de repente surgiu uma coisa na internet, que eram ferramentas fáceis de criar listas de discussão, e em 2002 nós fizemos uma lista chamada projeto metáfora e aquele ano que durou de sei lá, junho de 2002 à setembro de 2003, foi provavelmente o período da minha vida que eu mais aprendi. E isso é uma coisa muito maluco assim... era um ambiente auto organizado, que era uma lista de discussão, e que nós conseguimos chamar pessoas de vários repertórios diferentes, tinha jornalistas, tinha programador, designer, tinha professora, tinha, enfim, bacharel em filosofia... E a gente consegiu conversar, manter um nível de conversa com todo mundo em que todo mundo podia se entender e eram aprendizados simultâneos e assim muito tácitos em que eu aprendi assim: um cara mandou um e-mail com 5 links diferentes sobre determinado assunto e eu aprendi não só com o conteúdo que tinha nos sites mas com a seleção dos links, então tinha uma coisa de aprendizado tácito era totalmente espontâneo que acontecia por conta da interação entre as pessoas e uma aceleração muito grande de meu próprio processo de aprendizado pessoal, de participar de troca de informação com um monte de gente. Então era um ambiente em que todo mundo conversa, fala tudo na hora que quer, não tem moderador, mas as coisas se auto-organizam e começam a acontecer aprendizados ao mesmo tempo de um monte de gente.” Voz Masculina - “Glauber, tudo bem? Roberto, Henrique, Felipe Fonseca, Alberto, Maria lu os que trabalham com a gente... estamos streamando aqui, gravando. Estivemos ao vivo tá? (Risos.) É interessante porque sem dúvida nenhuma esse modelo de aprendizado organizado em listas, em wiki ou mesmo numa blogosfera qualquer funciona, sem dúvida nenhuma, mas funciona pelo que eu sei para adultos ok? Não tô dizendo que não funciona para crianças, eu adoraria que funcionasse... mas apesar de eu trabalar no projeto da escola da minha filha não consigo propor esse tipo de coisa porque de alguma maneira eu preciso de um agente facilitador alguém que esteja garantindo o ambiente de aprendizagem, cuidando da lista, zelando pelo o wiki e o professor não faz esse papel, e não tem uma outra pessoa na escola que faça. Os funcionários da escola são o professor, a diretora, o dono e a faxineira... você vê que o faxineiro é o cara, nesse caso... Como é que se aprende a ser faxineiro? Olhando, observando, vendo como é que o outro faz, imitando principalmente... é uma coisa natural... Os modelos naturais de aprendizagem...” Corte no áudio. Voz Masculina - “Como é que constituiu a idéia de uma loucura que é normal, devendo portanto ser tratada? Houve um médico, um hospital que teve a tarefa de trazer o indivíduo à normalidade, um especialista que traz o louco à normalidade. Nesse sentido o médico vai se constituindo enquanto sujeito conhecedor da doença, detentor de um saber científico. Esse saber permite ele falar sobre a doença, sobre o seu tratamento, seja com acupuntura, com umbanda ou qualquer coisa, ao mesmo tempo que propicia o desenvolvimento de uma poder fazendo com que seja o único capaz de discursar sobre a doença em questão. Essa associação entre saber e poder vai construindo o médico enquanto perito. Frequentemente a escolha de um médico depende do quanto espacialista ele é, os sujeitos são atraídos por esse saber minucioso, procurando o médico para resolver seus problemas e ao mesmo tempo em que fazem isso proporcionam uma re-afirmação do poder do médico, uma coisa alimenta a outra. O saber e o poder do médico tem uma relação entre si, um permitindo a sustentação e a manutenção do outro. Interessante que ele fala sobre a loucura uma doença que foi criada durante a história e esse mesmo discurso a gente pode colocar prá pedagogia né? O saber da escola foi sendo criado, quem foi selecionando o que se faz na escola? (…) Na época lá dos faraós, o faraó ele tinha um professor particular, um tutor, o cara nascia já com uma pessoa designada que acompanhava ele até certa idade, durante a vida toda. Isso para o faraó. Para cada tutor de filho de faraó existiam 10 mil escravos (…) quantos escravos foram necessários para construir a pirâmide, 20 mil, 30 mil em 20 anos? Então esta constituição do saber, do conteúdo, está muito ligado ao currículo, que pode ser o currículo de uma ciência, do saber estabelecido... (…) Esse autor aqui citado, primeiro ele coloca o saber e o poder como coisas separadas, como muita gente ainda acredita que seja mas num determinado momento ele une esses dois conceitos num só...” Voz Masculina - “A gente consegue citar situações de aprendizado em grupo onde não tem essa figura do professor para aprender? Por exemplo... comunidades, comunidades de prática... como o clube do jipe, o clube do jipe tem o quê? Não tem professor, tem o jipeiro. Os jipeiros se reúnem, vivem experiências em conjunto fazem o rally e em função dessas experiências são criadas interações, interações ligadas a problemas normalmente como a quebra do jipe por ali e tal... e a solução de problemas ligados em grupo gera aprendizados e cada vez mais os jipeiros sabem mais, ao mesmo tempo em que eles não sabem nada porque o próximo problema traz uma situação nova, não existem conhecimentos consolidados, finalizado, uma enciclopédia dos problemas do jipe, nunca vai terminar... Uma outra situação por exemplo pode ser os alcoólatras anônimos, os alcoólatras anônimos trabalham em um modelo de sala onde o grupo se reúne, tem um agente facilitador mas ele não é detentor do conhecimento, ele não está ali para dizer: você tem que parar de beber por conta disso ou daquilo por que afeta o fígado e mostra o gráfico do fígado sendo destruído.. nada disso. As pessoas trabalham em roda de aprendizado, trocando experiências, compartilhando conhecimentos e em algum nível um aprendizado é construído. Tem algumas regras que são combinadas entre o grupo, não é totalmente livre, mas as regras são regras de funcionamento da dinâmica tá? Então o que eu conheço é isso o que eu consigo citar, comunidades de práticas como o clube do jipe e esses grupos de auto-ajuda... não sei se vocês conhecem mais...” Voz masculina - “Mas isso cria uma autoridade em jipe jipe? Uma autoridade para falar sobre o jipe? Ou quais são os problemas do jipe?“ Voz masculina - “Se essa situação cria autoridade sobre o jipe? Dentro da comunidades não... dentro dessas comunidades o que acontece é a uma troca um conhecimento e ao mesmo tempo uma meritocracia. Realmente no clube do jipe tem um cara que sabe regular carburador melhor do que nós, não é bem um especialista porue não é eleito, não é institucionalizado, não tem cargo no clube do jipe, diretor de carburagem, não tem... no clube do jipe não tem cargo, não tem sentido. Assim, pifou o carburador o cara leva o carburador para o outro que ele sabe que sabe e aí tem uma troca, um conhecimento mas aí por um outro lado tem uma meritocracia, o cara conhece mais de carburador do que eu (Ao fundo: Mas e todos os conteúdos de como funciona um jipe... é um saber ou conhecimento?) Bem, vou lhe dizer o meu ponto de vista, na troca, se esse conjunto de informações, como funciona o jipe, se ele existe na troca e no compartilhamento ele é um conhecimento tá? Se ele foi consolidado num livro, num site, numa enciclopédia aí você pode chamar de saber, ou de informação. Pra mim o conhecimento é uma coisa viva, dinâmica que acontece na interação do grupo. Se o cara chegar para mim e dizer: eu tenho o conhecimento, eu vou dizer não acredito, ele tem uma informação. “ Voz feminina – “E entre os índios, entre os índios seria um exemplo também? “ Voz masculina - “Depende dos índios, da tribo, eu não conheço muito dos índios mas acredito que eles vivem muito num modelo natural, trabalham, aprendem e vivem juntos, mas também tem uma certa meritocracia... vamos ver o que o cara escreveu ali... “ Voz masculina - “Coloquei ali três itens pra gente pensar em conceitos mesmo, porque se a gente abrir em exemplos a gente vai citar exemplo puxando exemplo puxando exemplo e são vários claro, mas para a gente ter alguma coisa, sair com alguma coisa daqui, levar pelo menos uma ferramenta, uma chave de fenda de como conserta jipe... (Risos). Aí eu coloquei ali: saber, conhecimento, informação, que é coisa que se confunde, se mescla muito. Como para mim é muito forte essa associação saber – poder eu gostaria de saber se eu subir aquilo de nível, qual seria o equivalente ali, se saber é igual a poder, qual o equivalente de conhecimento nessa escala e depois qual o equivalente de informação? Segura aí que eu vou escrever..“ Voz masculina - “Só prá jogar esse jogo eu acho assim que idealmente no nível do conhecimento não há poder... isso saber está para poder, no mesmo nível, aí na linha de cima tem conhecimento, o que vai estar ao lado dele? Eu colocaria participação, do lado de conhecimento ok? Aí o poder está diluído, todas as pessoas participam, no mesmo nível, em cima do poder... tem participação ali, interação, compartilhamento, é por aí né? Um coisa que o grupo, a equipe, todo mundo constrói, conhecimento é uma coisa decidida em grupo, se tiver um núcleo de poder ali, não é conhecimento. Autoridade? Em que sentido? Autoridade sobre o assunto ou sobre as pessoas? (Interrompe a fala e escuta-se ao fundo: autoridade é interessante porque ela vem de autor... Grupo de pessoas grita: vai se foder, vai se foder...) Gente, desculpa mas a vizinhança nesse bairro é terrível... (Risos.) Parece que tá tendo um jogo de futebol aqui, tem uma igreja aqui do lado e quando desce o demônio no pastor a coisa fica complicada... (Risos.) Mas vamo lá porque você tá vendo autoridade aí?“ Voz masculina - “Eu vejo autoridade pela mesma relação de saber e poder, quando você cria o cara que sabe de alguma coisa você está dando um certo poder a ele... “ Voz feminina - “Mas você tá dizendo poder no sentido pejorativo né? “ Voz masculina - “Não aí é que está... não no sentido pejorativo mas em todos os sentidos, o poder nem sempre é negativo se você tem o poder de fazer alguma coisa você pode melhorar uma situação, você pode melhorar ou piorar, acho que até por isso ele une saber e poder até porque não tem como você poder fazer alguma coisa sem poder... alberto fala alguma coisa...“ Alberto – “Eu não consigo fazer essa relação direta que você faz porque na verdade o poder cabe em qualquer uma das três posições, se você tiver informação, dependendo da situação, você tem poder, se você tiver conhecimento, dependendo da situação você tem poder, e o saber como uma coisa mais ampla também te dá poder em relação às outras coisas, o poder sempre está ligado a isso... (Interrompe a fala.) Sim mas aí você poder dar o nome que quiser... poder, ascendência, dominação e por aí vai. (Ao fundo: Participação também é uma forma de poder?) Participação não, é o contrário... participação tem a ver com o conhecimento em sua forma de construir, o poder tem a ver com o saber, se a gente for seguir a linha que o luiz propôs ali: saber – poder, conhecimento – participação eu diria que o saber está ligado ao conhecimento porque ele é um saber instituído, ele está ligado a uma instituição, ele é um saber autorizado, permitido, consolidado, aquilo que é a verdade que está ligado à ideia de verdade, de saber absoluto. Nesse sentido ele está ligado ao poder, assim, como o conhecimento está ligado ao outro, à interação, à troca, o conhecimento construído ali no trabalho, o conhecimento que o pai transmite pro filho no uso da foice, que o pintor transmite pro seu aprendiz, isso é conhecimento, uma coisa construída junto.“ Voz masculina - “Mas o carpinteiro, tendo conhecimento de marcenaria, ele tem autoridade pra falar sobre marcenaria? No sentido de autor...“ Ouve-se duas respostas: “Sim“ e “Não acredito.“ Voz masculina - “Primeiro eu acho que a carpintaria não existe, como não existe a engenharia... Assim, aquele homem que trabalha com madeira, que usa uma série de técnicas e um conjunto de ferramentas ok? E a gente pode qualificar essas técnicas e ferramentas dentro de uma categoria chamada carpintaria mas é alguém que classifica porque na verdade essas habilidades podem ser consideradas como inclassificáveis... Esse que é o ponto, quando alguém classifica, esse sim chama para si uma autoridade: olha, o que você está fazendo se chama carpintaria e você é um carpinteiro... mas aquilo não tem nome... as formigas andam porque andam.. (Ouve-se ao fundo: mas a carpintaria é uma profissão.) O que é que ele faz? Banco? Sim, ele tem um conjunto de habilidades mas ele não pode falar sobre carpintaria. O que é que ele faz? Banco? Ele não pode fazer tudo... Tem inúmeros trabalhos de madeira mas carpintaria ele não fala, ele fala do ue ele sabe e ele só fala sobre o que sabe... (Comentários ao fundo: Existe um campo de conhecimento...) Com quem ele aprendeu a ser carpinteiro, com o pai dele? Ou ele tem uma capacidade intuitiva, eu não quero falar dom, uma inteligência inata.“ Voz masculina - “A dificuldade pode levar ele a inventar uma técnica que não existia antes dele, ele pode descobrir uma fiação nova na lâmina e com isso ele consegue cortar a madeira de uma determinada maneira e isso é uma técnica que ele criou ali, agora, e não porque ele tem um dom mas em cima de uma necessidade, de um momento em que ele tinha as condições para criar aquilo.“ Voz masculina - “E ele pode até registrar como sendo dele.“ Voz masculina - “Ai a gente está falando de propriedade, de um componente adicional para complicar esse nosso mapa.“ (Comentários ao fundo. “Ele não cria uma autoridade?) Ele é uma autoridade no que ele conhece, no que ele vive, mas ele não cria autoridade numa área do conhecimento... Por exemplo, o doutor tal é especialista em estômago, estomatólogo, legal, ele sabe tudo de estômago mas o que os médicos da medicina chinesa dizem sobre o estômago ele não conhece nada, ele é um analfabeto sobre o estômago chinês. Só que aqui no brasil a gente se reúne, e elege ele o presidente da sociedade médica dos estomatologistas. Aí sim, aquele sentido de autoridade, aquela palavra tem a ver sempre com a participação de uma outra pessoa, alguém é que dá a ele aquela autoridade, alguém que condecora o nobre professor emérito e declara que ele é emérito, mas aquilo não é intrínseco do conhecimento, a partir do momento em que você tem o conhecimento você passa a ser autoridade no assunto, quem te declara uma autoridade no assunto é sua comunidade, ou não. De repente Tom Zé, a comunidade por muitos anos achava que Tom Zé era um boçal, um idiota e a partir do momento em que a comunidade alcança um determinado nível de entendimento do que é arte e cultura aí eles falam Tom Zé é uma autoridade, descobriram o Tom Zé, sabe essa história? (Ouve-se ao fundo: “Antes não tinha poder nenhum e agora...“) Mas ele não tinha conhecimento? Um vasto conhecimento, e o conhecimento é o mesmo. (Ouve-se ao fundo: “Mudou a aceitação, mudou o parâmetro.“) Então eu não acho que a autoridade não está intrínseca ao conceito de conhecimento. Pode ser agregado pelos outros elementos da comunidade e a gente pode eleger aquele cara uma autoridade, mas acho que o conhecimento em sua forma natural (…) e acho que aquela palavra participação não está boa acho que interação estaria melhor, interação entre as pessoas ou interação com a madeira, com sua própria realidade, seu próprio tempo, essa interação no cruzamento das interações nasce o conhecimento, e isso é legítimo.“ Voz masculina - “Então existe conhecimento na interação não só com as pessoas mas na interação das pessoas com os objetos? “ Voz masculina - “Sem dúvida. Até porque tudo está carregado de carga sócio-cultural né? Sem dúvida nenhuma né? (Ouve-se ao fundo o diálogo: quer falar? Não, não... Já temos uma autoridade aqui, os caras que entendem, três que falam e duas que ouvem... Nosso grupo não tá mais funcionando, já tem dono de conhecimentro... É fácil cair no modelo né? É fácil a gente descer..) Voz feminina - “ Sim, é fácil. E eu sei que a idéia desse encontro aqui é que todo mundo participe, que circule, que não que desça...“ Voz masculina - “E informação? (…) Saber, conhecimento parcem um grau, são substratos, claro que são todos a mesma coisa, poder e autoridade é a mesma coisa, só muda conhecimento que se pode circunscrever, saber não, saber é mais amplo, é por isso que eu acho que conhecimento cria circularidade, cria participação através da interação. (…) Mas se eu triturar mais o conhecimento reduzir ele simplesmente até a informação, sem o sujeito, tira o sujeito dessa história...“ Voz masculina - “A informação é uma unidade, uma mônada, um pedacinho, eu acho que tem algo até menor que a informação, que é o dado, o bit, (Ouve-e ao fundo: o carlos eduardo). Vou dar um exemplo: dentro de uma empresa um dado a palavra rua num documento algum lugar ali num papel impresso, aqui mesmo se a gente procurar a gente vai enontrar a palavra rua num papel impresso, mas não faz sentido, não quer dizer absolutamente nada, eu tô falando isso aui e a gente não consegue conectar isso com nada. Antes de mais nada ela é uma palavra, um dado, ela tá dissociada de qualquer contexto. Agora se eu pegar essa palavra rua e colocar a palavra luminária, 243 aí eu tenho uma informação, aí se eu contextualizar essa informação e te disser que é nosso endereço, aí você tem o conhecimento. Eu separo o dado e a informação. Por exemplo a letra A da palavra dado é um dado, auilo não é uma informação um conhecimento não é nada mas tá ali. E a junção daquelas quatro letras D A D O que forma a palavra dado.“ Voz masculina - “E aonde eu armazeno dados?“ Voz masculina - “Os dados necessariamente têm que ser armazenados fora das pessoas. Para poder entrar no sistema humano não entra como dado, entra como informação e dependendo no nível de elaboração da pessoa já pode entrar como conhecimento.“ Voz masculina - “Eu não consigo ver a diferença entre informação e dado porque pra mim informação é algo dado, dado existente, então a rua no sentido de rua é só um nome, uma palavra, mas street é outra palavra mas a informação é a mesma...“ Voz masculina - “O que informa a palavra rua? A idéia de rua... A porta de entrada para algum lugar... mas ela não me leva para lugar algum, eu só consigo ter uma imagem mental, um símbolo do que significa rua, ou street ou calle pra mim é só isso, mas quando se transforma isso num endereço, rua tal número tal, aí eu crio uma informação, eu consigo estabelecer uma ação, um meio sobre aquela palavra, eu sei que é uma rua não é uma avenida, é um lugar onde tem gente instalada, é um lugar que o correio pode encontrar, que a polícia pode encontrar...“ Vozes ao fundo. Ouve-se: “A informação fica no sujeito ou não?“ Voz masculina - “Olha, eu puxei aqui, quem quiser dar uma olhada no wikipedia, a hierarquia dykw, é uma hierarquia informacional, deixa eu aumentar a fonte... utilizada principalmente no campo das ciências da informação e da gestão do conhecimento onde cada camada acrescenta certos atributos sobre a anterior. Então vamos lá... dados, data é o nível mais básico, informação acrescenta contexto e significado ao dado, conhecimento que é o k, acrescenta a forma de como usar adequadamente a informação, e sabedoria acrescenta o entendimento de quando utilizá-lo. Ok, tudo bem... é só uma categorização formal não quer dizer que é a coisa, mas tem a reflexão de alguém aqui tá? Aí tem assim (…) bom, o cara fez um gráfico né? Passado, futuro... fez algumas análises, mas é interessente o nível de categorização, quer dizer, dado é só... (Interrompe a fala, ouve-se: “Dado é um nível mais básico do quê? (…) do saber.” Do saber externo ao ser humano, fora do homem. Como ele diz aqui ó, uma categorização da ciência da informação e da gestão do conhecimento: temos que organizar essa bagunça aqui, por onde a gente começa? Esse conhecimento tá fora daqui, da gente, ele começa pelo dado. Por exemplo, ordem alfabética, você tá organizando o dado, pura e simplesmente, pondo ordem. (Interrompe a fala.) Mesmo que você não ordene, ele tá ali enquanto dado. Ele tá escrito, é o papel que tá escrito, a música que tá gravada né? (Interrompe a fala. Ouve-se: “Mas e a ordenação, modifica o dado?) Não, de forma alguma. Tanto faz, se você pegar a palavra DADO e invertir DODA, ele... Muda significado. (Risos.) A ordem muda a informação mas não o dado. Um dado é dado, ele tá ali. E você pode considerar dado qualquer conjunto de pequenas informações. Você pode pegar a letra A e ela é um dado, ou de repente pegar o triângulo que tá dentro da letra A, um triângulo, isso é um dado. A capacidade de desconstruir a representação da informação é a capacidade de você entender os dados. Você pode pegar tudo isso e transformar em 0 e um, isso é dado literalmente, isso não é informação. (Pessoa vai interromper.) Prá fechar: se você pegar um arquivo, nós estamos lendo essa página aqui, uma página que tá escrita em HTM e tal mas não tem nada aqui, tem 0 e um, e se a gente ler esses zeros e uns que estão gravados aqui no HD, a gente não vai entender nada, mas o dado tá aí. A partir do momento em que a gente vai organizando, dando legibilidade, ele também continua sendo dado, até que você chega e dá um contexto para esse dado. (Interrompe a fala.) Não importa, sempre vai ter o contexto. (Interrompe a fala. Ouve-se: ”São vários contextos para o mesmo dado.” Ou não...” Voz masculina - “Tipo a questão da rua mesmo, pessoas diferentes, de países, culturas, línguas diferentes verão a rua como um dado diferente?” Voz masculina - “Verão não. No sul (?) um homem que mora na rua quando ouve a palavra rua é a mesma coisa que a gente ouvisse a minha casa, ou já a ausência de minha casa. Já para um homem que mora na rua, a rua terá um monte de significados. Mas isso já tá ligado ao contexto daquela pessoa mas não está ligado ao dado, tem a ver com a pessoa.” Voz masculina - “Por exemplo a palavra mãe, a palavra mãe é um dado? “ Voz masculina - “Já não é conhecimento? Isso é que não consigo entender... porque isso já não é conhecimento nessa fase?” Voz masculina - “Quando entra no sistema humano e o sistema humano faz conexões com seu repertório próprio, já não é mais dado, nem informação, independente do contexto. Você é o contexto. Quando você ouve a palavra mãe pronto já não é um dado nem só uma informaçao você contextualizou com seu repertorio pessoal, já é conhecimento.“ Voz masculina - “Dado não é a pessoa que gera aquilo?“ Voz masculina - “Mãe, não... essa é sua definição de mãe, esse é o contexto digamos enciclopédico da palavra mãe, um m um a um til e um e. Ouve-se ao fundo - Ou uma série de vibrações sonoras. Isso, por exemplo, é um dado.“ Voz masculina - “Mas todas essas diferenças revertendo sempre a um dado único“ Voz masculina - “Como assim um dado único? Ouve-se ao fundo - Pois é tudo uma passagem de nível.“ Voz masculina - “... existe mãe um som sindo da minha boca e chegando no seu ouvido, existe mãe escrever letrinhas, existe mãe numa foto, na verdade são dados diferentes...“ Ouve-se-se ao fundo. “Discordo, mãe só tem uma. “ Voz masculina - “quem é que trouxe esse cara, meu... Desculpa a brincadeira... mas eu concordo com ele...“ Pergunta que não se ouve. Voz masculina - “Olha esse negócio de poder, você tá com esse negócio de poder aí na cabeça, não tô entendo esse negócio aí, esse trem... “ Voz masculina - “... Informação tem um meio aí, você quer saber como é que o poder se relaciona com a informação, você pode colocar a palavra meio ali. Ou seja, o dono do livro na idade média, a igreja é proprietária do livro na idade média, o meio é dela, o governo chinês é proprietário de rede de conexão na china, a internet é do governo ok? Ouve-se ao fundo: “Mídia“. Mídia? pode ser, mas estou falando meio mesmo, meio físico.“ Voz masculina - “Tá meio foucaulniano esse diálogo nosso mas vamos lá, é um jeito de ver.“ Voz masculina - “Eu tava falando pra ele antes, na verdade você pode estabelecer... na informação, dominar a informação, dominar o conhecimento, dominar o saber, a questão está na dominação, e não em tê-o, ou acessá-lo, tratá-lo, está além do controle, você pode controlar a água e isso também é poder. Um commodity. Água enquanto um bem de subsistência, se você controla a água você tem poder, você poder ser um analfabeto, você pode não falar a mesma língua que as pessoas, como é o caso da light aqui há 50 anos atrás podem controlar e ter poder prá controlar a vida de milhões de pessoas. Existe poder sem saber, poder é uma questão de dominação, tá ligado a dominar meios, a dominar processos, a dominar pessoas, passagens por exemplo, o cara que é dono de um portão ele cobra um pedágio, ele tem poder. Interrompe a fala. Ouvem-se comentários. Continua: necessariamente poder e saber não estão ligados, o que tá ligado ao poder é a dominação, é o controle, é o fechamento, é a possibilidade de abrir ou fechar o acesso a informação ao saber e à informação.“ Voz feminina- “Eu comentei com ele, se a relação saber e poder, ele tava colocando poder como um sentido pejorativo da palavra, mas não é isso.“ Voz masculina - “Eu tinha respondido prá você que poder acaba ficando como uma coisa pejorativo porque está ligado à dominação, mas poder pra mim é uma operação, não é algo que você tem ou não tem, uma operação, uma relação, não dá pra você ter poder em um lugar que não tem a quem exercer esse poder. Você não vai ser rei de um reino que não tenha súdito. E é uma relação de saber (…) uma relação de força, mas a força não é pra exercer esse poder? Para manter, não pra concentrar... “ Ouvem-se comentários sobre “a relação entre dominador e dominado.“ Voz masculina - “Mas aí fica meio estranho, simplesmente eu vou ser dominado hoje. Você é súdito de um rei porque você autoriza um rei a ser rei.. mas a legítima ação do rei é celestial.“ Voz masculina - “As instâncias de poder não funcionam assim, estão ligadas a mecanismos psiquicos internos das pessoas, quer dizer, a gente estabelece uma relação de dominado/dominante com qualquer um, com o zelador do teu prédio... então só pra fechar, tem gente que mora em um prédio de luxo ok? e tem uma certa dificuldade de entrar depois das onze porque acha que o zelador não gosta, imagina, ela mora num prédio de luxo, ela que paga o... um décimo do que ela paga é o salário daquele cara. Mas ela estabeleceu com zelador do prédio uma relação de poder, e o zelador me olha com uma cara feia, porque ela quis, isso tem a ver com o material interno dela, psiquico dela, ela não é dominada só pelo estado, mas a escolha é dela, é uma coisa de repertório individual, (Ouve-se: uma coisa natural?) então, dependendo da tua natureza, sim, dependendo dos mecanismos psiquicos aí dentro, você vai ser dominado, então você pode achar que não está sendo dominado. Você pode ser um cristão na arena sendo devorado por um leão, e tá feliz rindo e falando assim, vocês não podem nada, vocês não podem fazer nada contra mim (…) eles se apoiam numa percepção externa se ele está sendo dominado ou não. (Comentários ao fundo.) Tá meio difícil ligar todas as palavras aí. (Comentários ao fundo.) Estamos na história de poder. “ Vozes ao fundo. “Qual relação que eu estabeleço entre saber e professor, mestre, digamos assim?“ Voz masculina - “A relação que você quiser, que você quiser... se você for prá aula e quebrar a relação pré-estabelecida, você coloca a sua ali. (Comentários ao fundo.) Você pode tentar, você não vai conseguir ok? Mas acho que tem uma instância interna né? (Comentários ao fundo.) Tá, ele tem poder sobre o espaço mas não o poder sobre a relação de aprendizado. Ele tá falando e eu não tô ouvindo, aliás o que mais tem na escola é isso. “ Ouve-se ao fundo o diálogo: “A escola tem os conteúdos, disciplinas, currículos...“ “Mas é por isso que a escola não dá certo (…) dominam os conteúdos que todo mundo aceita.“ “É um pacto isso, um acordo?“ “Um contrato social.“ “Eu tô sendo irônico. Mas justamente a escola não dá certo justamente porque esse é um pacto que não existe. Os caras tão lá pra zoar, eles estão lá pela obrigação do pai e pela mãe a relação com a sociedade não existe, não representa nada para eles.. “ “E como seria uma escola diferente dessa?“ Voz feminina ao fundo. Lú comenta. Voz masculina - “Vai ser complicado, na verdade o que eu digo é o seguinte, quando a gente tá falando que saber é poder, assim tudo bem, voltando pra trás um monte, que é uma maneira de eu entender isso. quando a gente avança, evolui, aprende, lê, conhece, a gente ganha poder, a gente tem o poder de se locomover, poder de encarar, poder de enfrentar, poder de disputar o espaço da sala de aula com o professor, de poder encontrar um espaço na família, de poder reverter a dominação, de poder ser um igual, claro, na verdade saber é poder nesse sentido. (…) Isso só existe quando você se coloca como um igual, quando você acredita que é um igual, quando você estabelece um relacionamento de conjunto onde você sabe que é um igual, então a igualdade é que é o valor na construção do conhecimento, do saber, na manipulação dos dados, porque aí eu posso contestar, se você coloca um poder sobre mim, se você impõe seu poder sobre mim, eu posso contestar o seu poder porque nós somos iguais, eu posso alterar os dados e dar uma outra versão da informação na base da igualdade. “ Vozes ao jundo. Ouve-se: “Exatamente, a todo momento ele está reagindo...“ Voz masculina - “...de uma forma dialética, vai lá, ou de uma forma iconoclasta, simplesmente quebrando a estrutura e não deixando pedra em cima de pedra, não deixando nada nem pro dominador nem pro dominado.“ Voz masculina - “Numa escola como eu ensinaria isso?“ Voz masculina - “Vou dar um exemplo: O jornal do dia, eu chego na banca do jornal e compro o jornal do dia, o camarada chega na banca de jornal e compra o jornal do dia, ele olha o jornal e fala assim: isso aqui é a verdade sobre as coisas mais importantes que aconteceram no mundo, e eu olho pro jornal e digo: isto aqui é o que eles querem que eu saiba. Então eu acho que a questão é assim, se as pessoas têm uma relação reflexiva com a realidade elas desmontam mecanismos de poder, em grande parte. Crítica, eu chamei reflexiva pensando em crítica, melhor ainda, pensar sobre, refletir sobre, ou criticar, que seja, então a minha relação com o jornal é uma relação crítica, eu reflito sobre aquilo, eu não pego aquilo e mando prá dentro, eu sou uma minoria, maria lu falou que eu sou uma minoria. Os outros caras que compram o jornal não tem essa relação, isso só pra fechar. Fundamentalmente acho que a grande crise do modelo educacional que a gente tem hoje é que os alunos não são preparados para serem críticos e nem reflexivos. O que eu faço na minha casa é a tratar a consciência da minha filha pra que ela seja crítica e reflexiva o tempo todo, e aí ela pode ir lá na escola e entrar e participar daquele jogo ridículo e o senso crítico dela vai fazer com que ela tire de lá o que ela precisa dentro da medida da necessidade dela e o que ela não precisa ela joga fora... Então nota, negócio na nota, 8,5 – 9,0, filha isso é uma babaquice é uma bobagem, não mede, e aí eu vou construindo isso com ela, e aí cria-se pessoas críticas. A grande crise no modelo educacional é essa, as escolas não formam pessoas críticas e reflexivas com relação à realidade, porque a própria escola não aceita crítica e reflexão sobre ela mesma, a escola não se repensa e não dá aos alunos o direito de repensar a pŕopria escola e consequentemente a sua própria realidade.“ Voz masculina - “Só pensando no seu discurso, a escola pensa, (…) A escola pensa? Eu acho estranho falar a escola, o prédio pensa, um grupo de pessoas, nós precisamos definir quem pensa nesse caso. Aí de novo, me desculpem insistir nisso, mas vai cair de novo na relação de poder, porque ela sendo reflexiva e crítica ela tem capacidade de mudar essa estrutura? O aluno?“ Segue o diálogo: “O aluno tem.“ “Como?“ “Tem a capacidade dele, do tamanho dele, ele não vai mudar a estrutura.“ “Então você se submente aquilo...“ “Não, você não se submete, porque quem é critica não se submete a nada.“ “Mas você não muda.“ “Não, muda pra você.“ “Mas só pra você não resolve nada cara. Sua meta é pessoal e não social.“ “Como não? É mais do que... soma um milhão de vocês e aí você pensa se isso significa alguma coisa.“ “E como faz a passagem da crítica pra ação?“ Vozes ao fundo. Segue: “E a escola ensina isso?“ “Não, a escola não ensina, isso na verdade tem que existir na célula, no caso das crianças tem que existir na célula das pessoas que estão cuidando, criando aquela criança, prá não chamar de família, senão já vai trazer um outro termo aqui...“ Vozes ao fundo. Continua a mesma pessoa: “Isso, perfeito, existem espaços institucionalizados de expressão do aluno dentro da escola, a reunião dos pais com os professores, a reunião com a coordenadora pedagógica, o jornalzinho da escola, tem lá, é pouco, mas tem esses espaços, Esses espaços têm que ser ocupados, e o aluno pode levantar a mão e tentar conquistar novos espaços, ele tem que batalhar pelo espaço dele. O que eu coloco pra minha filha: se você não batalha dentro dos espaços, de estruturas arcaicas, ninguém vai batalhar prá você, não vai vir ninguém de fora prá mudar tua escola, você tem que levantar a mão e dizer, professora, não concordo com isso que você disse, certo? (Comentários ao fundo.) No primeiro momento individual, depois se todo mundo conpactuar que isso tem que ser feito de modo sistemático, você invade a reitoria (…) não, você precisa desenvolver a consciência e não convencer, e você desenvolve a consciência propondo a reflexão. (Comentários ao fundo.) Tem a hora do pátio, eles podem trocar experiências, ele podem conversar, podem estudar juntos em casa. (Comentários ao fundo.) Muda... vou te dar um exemplo, teve um problema lá com o professor de português, a minha filha reclamou uma vez, duas vezes, três vezes eu fui na escola, conversei com três pais fui falando com um monte de gente, fizeram uma reunião na classe pra tratar o problema com o professor de português, porque o cara é desequilibrado, Aí ele teve que ouvir isso da minha filha numa reunião com todo mundo, com a dona da escola junto, teve um trabalho de grupo pra tratar isso. O que que eu queria, eu tava querendo criar esse espaço. (…) Não essa filha não, é uma outra, uma pequenininha, essa já tá quase se virando... (…) Então assim, veja bem, foi criando um espaço, de reflexão, esses espaços de reflexão eles tem que acontecer. E eles acontecem primeiramente na instância individual, aqui dentro, eu tô refletindo, aí acontece numa relação de interação de modo informal, eu tô refletindo, aí depois da reflexão individual vem a interação, pô o quê você acha daquele professor? Você acha que ele pode falar assim com a gente? E aí começa a interação reflexiva. E aí você tenta contaminar o grupo, pode ser que você não consiga, somos só nós três, contaminar no ponto de vista da consciência, só nós três estamos insatisfeitos, vamos nos expressar, tem espaço de expressão? Não. Vamos criar esses espaços, vamos batalhar, aí entra o poder. Não tem espaço de expressão. Então meu amigo, tchau, tô fora dessa escola. É hora de ir embora. “ Voz masculina - “Um exemplo bom atual é a ocupação do USP, né? Você invadiu um espaço de poder tipicamente que é a reitoria, é de onde as pessoas acreditam que o poder é centralizado, né? Na verdade não é bem isso, né, porque o poder é distribuido, não é centralizado, mas onde se institucionalizou que o poder está operando de modo mais forte.“ Voz masculina - “As reflexões que acontecem na sala da reitoria, normalmente, entre o reitor e o conselho são reflexões que causam impacto de mudanças na estrutura como um todo, as reflexões que acontecem no refeitório, o nível de impacto é menor. Então, se nós queremos criar um espaço de reflexão amplo, e queremos que todos reflitam conosco, vamos ocupar a reitoria, já que não dá pra pegar o reitor pela cueca e sentar no refeitoria durante horas e horas então a gente vai pra lá, porque ninguém falou pro reitor sair daqui, eles entraram lá e falaram vamo conversar? o reitor é que saiu...“ Voz masculina - “Mas o que impediria, por exemplo, a reitoria simplesmente mudar de prédio e continuar exercendo seu poder?“ Voz masculina - “Nada, nada, não tem problema, o poder está estabelecido, essas estruturas de poder são uma oportunidade de desenvolvimento prás pessoas. É muito legal você ter um reitor escroto, uma professora idiota, e uma coordenadora pedagógica imbecil. Porque se tem a oportunidade de criticar, refletir, interagir e propor mudanças. O nível de desafio é alto numa escola careta. Você pode formar indivíduos que tem uma capacidade de expressão e questionamento até maior do que pessoas que foram criados numa escola onde... pô legal nosso grupo.... Isso é latente, isso tem que ser despertado, quem que pode despertar? No caso das crianças, os pais. Tenho certeza que a maria lu conversa um monte com o gabriel. quando ele tá em casa, porque ele sai o dia inteiro... vem pra dentro menino, mas quando ele tá lá ela interage. Vozes ao fundo. Voz masculina - “Sim, o espaço de reflexão dessas escolas é amplo, gigante. O nível de oportunidade, sistematicamente você desperta a reflexão que tá latente em todo mundo. Você forma pessoas reflexivas? Não sei, forma pessoas que tem práticas reflexivas. Práticas de discussão. Voltando lá no começo, a gente começou falando da aprendizagem informal. O que que a gente tenta estabelecer quando a gente chega numa comunidade pra apresentar modelos de aprendizagem informal? Criação de espaços. (Comentários ao fundo.) que modelo, não, não, a gente não oferece modelo de nada, é o contrário, o que a gente faz na verdade é contrapor o modelo vigente. A gente mais desconstrói do que constrói, eu não tenho uma metodologia, uma apostila do que é aprendizagem informal, se entrar no nosso wiki e ver lá a definição, você vai ver que uma definição bah...... não tem lá uma receita de bolo. A gente chega lá e fala assim, bom primeira coisa, vamos fazer práticas de reflexão individual e depois de trocas de reflexão e vamos criar espaços prá isso, basicamente é isso, começa aí, aí o resto grupo vai dando, é mais ou menos o que o meta faz. (Comentários ao fundo.) Imagino que sim, eu não fui metareciclado, mas na minha fantasia de leitor de lista, acho que é isso que acontece... (Comentários ao fundo.) Deve ter metarecicleiro aí que disse que tem uma relação de poder com as pessoas disfarçado, sem dúvida, seres humanos são seres humanos, carrasco tem em todo canto. Montar uma estrutura necessariamente aberta não uer dizer que não tem um cara lá dominando. Lá na lumiar deve ter uns professores que de um modo mais sutil, mais inteligente, mais refinado, tão dominando.... então acho que é por aí, propor a reflexão individual, trocar essas reflexões e garantir a existência de espaços prá que isso ocorra com regularidade. Com isso você inaugura um contra vetor ao modelo que tá colocado lá, seja numa escola, seja numa empresa, seja numa comunidade. Vamos pensar, vamos dizer o que a gente pensa uns pros outros e vamos fazer isso com frequência.“ Maria Lú - “Uma coisa que eu achei legal foi o que você falou, foi que você chega prá tua filha e fala, vê o que te serve e o que não te serve joga no lixo, e daí, é bem isso mesmo, eu fico com medo de ser hipócrita com meu filho, porque ele já tá de recuperação, já tirou nota vermelha não sei o que, e aí eu acho que qualificar o aluno pela nota, se ele tirou nota boa ele é uma cara legal, não é isso que diz se é um cara legal ou não. Você tocou em um ponto importante assim... que eu vou pensar quando for falar com ele, ah tirou nota ruim vai ficar de castigo, não vai. (Comentários ao fundo.) E repensar isso, porque dá medo de eu mesmo acabar caindo em um truque.“ Vozes ao fundo. Voz masculina - “É que naquela época eu não conhecia aprendizagem informal, só queria saber do tambor...“ Voz masculina - “Modelo waldorf, o que vocês acham? É um modelo alemão mas tem uma...“ Voz masculina - “Waldorf é um modelo espiritualista, uma escola que tenta dar uma visão espiritual pros caras, então, eu conheço bastante gente que estudou lá, e estuda lá, os caras aprendem manualidades, a fazer comida, a construir seus próprios cadernos, marcenaria, tem uma série de coisas, mas tá tudo ligado a cosntrução do espírito tá, segundo a teoria do rudolf steinern (?). Inclusive, tem distorções, tem uma história, essa é boa... o hector babenco, tinha uns filhos, tem uns filhos estudando lá, e assim uma vez eu acho que no sétimo ano, acho que sexto ano, coisa assim, os caras fazem um livro, os caras elegem um herói, ou alguém, um parcial da vida deles lá, e vão lá e constróem um livro com a biografia daquele cara contando, uma elegia, contando o que o cara tinha feito de legal, etc etc, e expõem isso nos corredores. E o hector é judeu né, e aí visitando a escola e visitando os livros todos e tinha lá um livro sobre hemless(?) se não me engano, um dos generais, um deles, um dos generais nazistas lá. E isso gerou uma polêmica enorme etc etc, mas na verdade a escola não conseguiu tratar isso, até onde eu sei, porque ela considerava que aquilo no ponto de vista da espiritualidade, da teoria espiritual do steinern (?) etc etc, aquilo fazia parte da construção do espirito daquele cara lá. Babenco ficou possesso, fez um monte, porque é proibido por lei, tem uma série de restrições a esse tipo de coisa, que na verdade proselitismo nazista né, ele chamou assim, eu não vi o livro, não sei os detalhes todos, lá, mas isso é um exemplo bem claro de como a escola não tá preocupada, o real, a história, aquilo... (Vozes ao fundo.) é na verdade ele participou da feitura do filho dele, que tava na mesma turma, mas isso era uma coisa subterrânea, não tava exposta, não é que a escola faz proselistimo nazista né, nem de longe, nem é uma escola alemã como parece, steinern (?) era alemão, e eles aprendem alemão na escola, mas só pra poderem ler os livros do steinern (?), é exatamente isso, mas tem gente lá também, conheço uma outra pessoa mais velha, que estudou lá nos anos 60 e 70 que foi expulso duas vezes da escola, você conhece ele, é o carlos o irmão do fabrício, duas vezes... (Comentários ao fundo.) É, mas ele não reagiu, não era isso, tinho uma história, não é exatamente assim é uma coisa espiritual tá? (Comentários ao fundo.) Pode, pode, tem tudo isso, tudo isso é mito, nada disso é exatamente tudo verdade. Mas só para esclarecer tem esse encaminhamento espiritual.“ Ouve-se uma pergunta. Continua a mesma pessoa. Voz masculina - “Depende da idade da criança... eles acham que a tecnologia... por isso essa coisa da madeira, o caderno feito a mão, tem a ver com a história da espiritualidade, tem a ver com a filosofia desse tal de waldorf..“ Comentários ao fundo. Voz masculina - “Mas o nível de reflexão sobre si próprio na escola waldorf é alto. Ocorre que na minha opinião, não conheci muito de perto, na verdade eu me relacionei com uma pessoa que foi criada em waldorf, e eu tenho muita percepção dela, e minha percepção sobre ela, então assim, a sensação forte que eu tenho de waldorf é que as pessoas elas aprendem a refletir e interagir dentro do ambiente waldorf, e não com a nossa realidade, tá? Então acaba formando uma certa intra-comunidade assim, não é uma seita, num chega a tanto, mas assim entre eles, eles tem um repertório de reflexão e de relacionamento muito legal, mas quando você pega um garoto lá do...“ Voz masculina - “Eu conheço um monte desses waldorfianos, desses starvinzinhos (?).“ Voz masculina - “Eu tô trabalhando com um comunidade, é uma favela, um bairro na periferia de são paulo, e dentro desse bairro tem uma escola waldorf, não eu prefiro nem citar ainda, então e essa escola ela tava nesse local, era uma chácara, antes do bairro aparecer, o bairro cresceu em volta da escola waldorf. E aí o pessoal, pô é uma comunidade pobre, vai haver alguma contribuição dessa escola pra comunidade? Aí sim, vamos contribuir, não vamos colocar os alunos, as pessoas dessa comunidade, porque a escola é paga, e vocês não podem pagar, mas nós vamos então compensar, aquela história da responsabilidade social, e aí o que eles fizeram, criaram uma associação, uma ong a partir da escola e dos preceitos de rudolf steinern (?), e tal, mas seria uma ong e não uma escola. (Ouve-se ao fundo: Amigos da favela. ) Exatamente.. e num determinado momento, na hora em que essa ong tentou ser independente aí eles não queriam que fosse mais parte da escola, essa ong só conseguiu fazer o que ueria fazer junto da comunidade depois que separou legalmente e tal, criou uma em ong separado e tal, tal tal, o interessante é o seguinte, apesar de ter essa independência eles não conseguiram largar a pedagogia, eles continuam usando a pedagogia, e aí qual a relação de autonomia que existe? (…) Então esse projeto que eu fiz foi nessa ong já, e aí de novo criou uma relação de poder muito forte, que é exercida até não mais quando existe uma relação formal, contratual, jurídica.. (Ouve-se ao fundo: a mim não me incomoda essa relação de poder...) A mim também não, eu exerço relação de poder quando várias pessoas...“ Voz masculina - “A mim não incomoda a relação de poder, o que incomoda é assim, tem espaço pra reflexão sobre isso? A gente pode pensar, discutir, refletir? E se a gente pode, automaticamente esse poder está sendo questionado no nível mais importante que é no nível interno, no nível interno que a gente tem... (Interrompe a fala.) Como é que nós estamos de tempo hein?...“ Ouve-se: Já deu bastante já. Foi bom. Só tem mais quatro minutos. Voz masculina - “Aí tá vendo tem uma relação de poder aí, limitada pelo meio, o meio limita o dado, tô brincando, imagina... bom 4 minutos, 4 pessoas, um minuto por pessoa para os encerramentos.“ Vozes ao fundo. Voz masculina - “Eu sinto-me encerrado obrigado a todos, foi super legal, gostei da casinha, gostei da recepção gostei das pessoas...“ Voz masculina - “Eu desci a rua, vinha lá de cima, vi a casinha branca, disse que era um bom lugar para um negócio...“ Voz masculina - “Maria lu quer deixar em aberto, quer dizer que amanhã ela volta aqui.“ Maria Lú - “Eu adorei participar, tô ainda processando...“ Voz masculina - “Eu adorei participar também, mas ainda não consegui colocar as perguntas que queria, descuilpa aí é um método que tenho de trabalhar não ter uma coisa pronta, já dada, modelos, mas uma coisa que semptre falo para o Algarra e que falei pra outros é que gosto de divagar o pensamento dos meus amigos..“ Comentários.