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COP out – Earth’s Rights neglected in favour of market driven forces
By Cormac Cullinan, Cullinan & Associates, 29 February 2016
When world leaders celebrated a ‘decisive’ outcome at COP21 they were inadvertently demonstrating the utter futility of continuing to believe that we can rely on United Nations processes to prevent catastrophic climate change.
Commenting on the December 2015 Paris Agreement that emerged from COP21 climate talks George Monbiot wrote: “By comparison to what it [the Paris Agreement] could have been, it’s a miracle. By comparison to what it should have been, it’s a disaster.” (Guardian, 12th December 2015). Monbiot was pointing to the fact that while negotiators and their French hosts had done much better than expected, what they agreed remains woefully inadequate to prevent catastrophic climate change.
The Paris Agreement is probably as good a deal as could have come out of COP 21, and the participants deserve credit for that. However if the apex of 21 years of climate negotiations is an agreement that far, far too weak to protect the right to life (let alone to dignity) of many millions of people and other species, then what is there to celebrate and what do we do now?
As the political leaders and diplomats worked to polish the text of the Paris Agreement that would “cover all the crucial areas identified as essential for a landmark conclusion: …. for nations to build clean, resilient futures” (http://www.un.org/apps/news/story.asp?NewsID=52802#.VnACGtJ9600), across town at the Maison des Métallos others were already constructing that future. Organisations and communities from around the globe demonstrated that if governments don’t deliver, people must take the initiative, by signing a Peoples’ Convention to establish an International Tribunal on the Rights of Nature. For two days the Tribunal judges heard a wide range of cases concerning alleged violations of the Universal Declaration of the Rights of Mother Earth, including cases on climate change, the commercialization of Nature, genetically modified organisms (GMOs), fracking, mega dams in Brazil and ecocide.
More than 65 people from 32 nationalities[1] (including many indigenous people) speaking in seven languages[2] participated as judges Earth Defenders, experts or witnesses. People flocked to the hearings and more than a thousand people who wanted tickets had to be turned away because the venue was full.
Read full article at COP out – Earth’s Rights neglected in favour of market driven forces
About Cormac Cullinan
Cormac Cullinan is a founding member of the Executive Committee of the Global Alliance for the Rights of Nature. He served as President of the Paris International Rights of Nature Tribunal. Cormac is an author, practising environmental attorney and governance expert who has worked on environmental governance issues in more than 20 countries. He lives in Cape Town, South Africa and is a director of Cullinan & Associates, a specialist environmental and green business law firm (www.cullinans.co.za) and of the governance consultancy, EnAct International (www.enact-international.com ).
His groundbreaking book “Wild Law A Manifesto for Earth Justice” has played a significant role in informing and inspiring a growing international movement to recognise rights for Nature. In 2008 he was included in Planet Savers. 301 Extraordinary Environmentalists, a book that profiles environmentalists throughout history. At the invitation of Bolivia, Cormac spoke at the 2009 Climate Change Conference in Copenhagen and led the drafting of the Universal Declaration of the Rights of Mother Earth which was proclaimed on 22 April 2010 by the People’s World Conference on Climate Change and the Rights of Mother Earth in Bolivia. In September 2010 he played a leading role in establishing a Global Alliance for the Rights of Nature and currently sits on the Executive Committee of the Alliance.
Política de Drogas nas Favelas e no Asfalto: Uma Guerra Sem Vencedores
Na última quarta-feira, na Biblioteca Parque Nacional, o ativista de direitos humanos e das redes sociais Raull Santiago, do Coletivo Papo Reto, juntou-se à pesquisadora Ana Paula Pellegrino, do Instituto Igarapé, para discutir a “Guerra sem Vencedores: a Política de Drogas na Favela e no Asfalto“, uma iniciativa da revista VozeRio, e sua série de debates “Conversas na Biblioteca”.
Como o título do evento sugere, na guerra contra as drogas não há vencedores. Santiago apontou que aqueles que inevitavelmente perdem são moradores de favela negros e pobres: “E, no fim das contas, a guerra às drogas é feita por pretos, pobres e nordestinos contra outros pretos, pobres e nordestinos”.
Ana Paula Pellegrino concordou, e acrescentou que, embora o porte de drogas seja parcialmente descriminalizado no Brasil, a falta de critérios objetivos para distinguir entre usuários e traficantes leva os policiais e os meios de comunicação a caracterizar de forma incontestável certas pessoas como usuários e outras como traficantes: “Quando se fala de droga na favela, é sempre tráfico, nunca uso. Quando pegam um menino com droga, nunca é usuário, é traficante”.
A pacificação tem sido a mais recente repetição da guerra contra as drogas, que continua a caracterizar favelas como locais de tráfico, levando a políticas públicas unilaterais. “Durante os últimos cinco anos de pacificação”, observou Santiago, “A única atuação das políticas públicas no Complexo tem sido através da política de segurança: os moradores são olhados pela mira de um policial”. Essa guerra liderada pela segurança levou os moradores a verem a polícia apenas como mais uma “facção” que busca o controle territorial de forma violenta.
Ana Paula Pellegrino enfatizou como a Guerra às Drogas é, em última análise, equivocada. “A primeira coisa a ser lembrada é que a criminalização não impede ninguém de usar drogas. Quem quiser drogas, vai conseguir e vai usá-las” afirmou, acrescentando que a criminalização pode levar a um maior uso de drogas por “criar um fetiche em relação ao que é proibido”. Para Ana Paula Pellegrino, o uso de drogas é, em última instância, uma questão de saúde pública. Ao torná-la uma questão criminal, a guerra às drogas estigmatiza aqueles que procuram tratamento, uma vez que temem ser entregues por seus próprios médicos.
Santiago destacou outro lado do debate da saúde pública quando se fala de guerra às drogas: as altas taxas de mortes que assolam os moradores das favelas, mesmo aqueles que não estão envolvidos com o tráfico: “Na favela, não tem bala perdida: porque a bala vai reta e a favela é curva”.
Como disse a moderadora em sua introdução ao evento, as perspectivas de Santiago e Ana Paula Pellegrino se complementaram muito bem. Ana Paula Pellegrino tendia a se concentrar no global, enfatizando como, apesar dos impactos da guerra às drogas liderada pelos Estados Unidos em toda a América Latina, alguns países, mais especificamente o Uruguai, optaram por adotar políticas mais progressistas de descriminalização. As leis ambíguas do Brasil e as altas taxas de encarceramento–a população carcerária no Brasil é a quarta maior do mundo–representam um passo atrás.
Raull Santiago baseou sua experiência no contexto da vida local na favela. Em uma história especialmente emocionante, ele contou ao público sobre seu amigo Fábio, que tentou conseguir um emprego, mas quando os empregadores descobriram que ele era do Complexo do Alemão, recusaram-se a contratá-lo, levando Fábio à vida do tráfico e à sua eventual morte. Santiago lamentou a imagem unilateral que temos do seu amigo: “No imaginário geral, Fábio não morreu por causa de um processo de negações, no imaginário geral ele morreu porque era traficante, vendia drogas, resolveu fazer isso e acabou”.
As perguntas da plateia pareciam refletir dois sentimentos dominantes: os que acreditavam que a descriminalização das drogas levaria a mais viciados e, portanto, a mais crime nas favelas, e aqueles que olharam para as políticas de outros lugares para ressaltar quão violenta e desigual, e, portanto, sem sucesso, tem sido a guerra contra as drogas no Brasil.
Ana Paula Pellegrino ressaltou a necessidade da ciência informar a política. Embora para a ciência pareça claro que a atual política não está funcionando–as taxas de utilização não caíram–ela instou os presentes a estarem abertos a várias possibilidades: “Há um mundo de políticas que precisamos testar de forma responsável”.
Raull Santiago, com lágrimas nos olhos, instou os membros da plateia, e ele próprio, a acreditar nessas outras políticas e possibilidades, apontando para o “Acredite” tatuado no braço: “Carrego esta tatuagem não é porque eu acredito muito não. Pelo contrário. É porque, diante do que eu vivo, diante do que eu vejo, diante do que eu sinto, diante do tanto de situações que me afunilam, me deixam sem ar…quando a gente está triste, cansado, [a gente] olha para baixo. E aí, se eu ficar desanimado e olhar para baixo, vou ver isso no meu braço: “Acredite”. Porque, ao mesmo tempo que é muito difícil fazer o que a gente faz, a gente vê alguns resultados positivos. Vocês estarem aqui hoje, isso é positivo”.
Polícia Mata Jovem e Aterroriza Moradores Durante Intensa Operação Policial na Maré
Igor Silva, de 19 anos, foi morto pela polícia na segunda-feira (22) durante uma operação na favela Parque União, no Complexo da Maré, Zona Norte do Rio. No mesmo dia um vídeo gravado por um morador e postado numa rede social mostrava policiais da Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE) colocando o corpo já sem vida de Igor na caçamba de um carro da polícia. O vídeo e subsequentes reportagens alegando o envolvimento de Igor, que trabalhava em uma farmácia, com o tráfico de drogas–uma justificativa comum para o uso fatal de violência policial–indignaram moradores e organizações comunitárias que denunciaram as ações da polícia e da mídia.
Segunda-feira foi um dia de intensas operações policiais na Maré com trocas de tiros começando às 6 horas da manhã, segundo informações de páginas do Facebook. Ao longo do dia o Maré Vive postou atualizações relatando tiroteios na Nova Holanda, Baixo do Sapateiro, Rubens Vaz e Parque União.
Escolas, hospitais e creches fecharam e moradores postaram que estavam com medo de sair de suas casas. Uma moradora escreveu: “Meu Deus!!! Eles vão matar todo mundo!”.
A jornalista comunitária Thaís Cavalcante ficou presa em meio de uma troca de tiros. Mais tarde ela tuitou: “A vida muda de sentido quando a gente vê a morte de perto. Que dia difícil”.
Igor Silva levou um tiro da polícia no peito durante um tiroteio na favela Parque União naquela manhã. Um morador filmou a polícia maltratando o corpo, alterando a cena do crime e colocando o corpo de Igor num veículo da CORE antes de sair dirigindo. O vídeo tem sido amplamente compartilhado no Facebook deixando moradores e defensores dos direitos humanos horrorizados com o tratamento do corpo do jovem.
Moradores ficaram ainda mais indignados com as reportagens sobre o incidente. O G1 da Globo e o R7 publicaram o vídeo informando que a polícia estava “prestando socorro” à vítima.
Reportagens do G1 e O Dia sobre a morte de Igor enfatizaram o comunicado em que a polícia afirma que Igor tinha uma pistola, um rádio e três coletes a prova de balas, e citam o delegado: “São pessoas que desde novas estão acostumadas a trocar tiros. Hoje não foi diferente. Tivemos diversos confrontos e em um deles, um policial conseguiu reagir e alvejou esse garoto”.
A reportagem e a alegação do G1 foram questionadas numa postagem do Maré Vive, que publicou a fala do delegado e a imagem destacada no G1 dos coletes a prova de balas ao lado de uma foto de Igor na farmácia: “Me digam, quem é o maluco que vai trocar tiro de pistola 40 com uma tropa da CORE pesadona de fuzil, blindado, e helicóptero? E se ele tava com 3 coletes a prova de balas, porque diabos ele não vestia um?” A postagem, compartilhada mais de 1.900 vezes, rebateu com força as reportagens e o comunicado da polícia ao concluir com a seguinte afirmação: “Queremos justiça e não vão nos calar!”.
A organização comunitária Redes da Maré publicou uma nota denunciando as operações policiais e a morte de Igor: “O tiro que acertou o Igor também nos acerta, pois é uma violação gravíssima contra o direito mais sagrado que temos, ou seja, o direito à vida. A nossa democracia não pode conviver com a ideia de que algumas vidas valem mais do que outras, não se pode naturalizar o assassinato de jovens brasileiros moradores de favelas“.
A nota pedia por uma resposta imediata: “É preciso que a sociedade se mobilize e cobre do Estado sua responsabilidade e cobre também uma mudança radical na política de segurança baseada na guerra. O Governador do Estado do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, por sua vez, tem a obrigação de se pronunciar sobre o que ocorreu hoje na Maré e imediatamente paralisar ações como essa que só resultam em violência e morte”.
O Complexo da Maré abrange 16 comunidades e tem uma população em torno de 130.000. Localizado entre a Avenida Brasil e a Linha Vermelha, próximo do aeroporto internacional do Rio, o complexo de favelas foi ocupado pelo Exército em março de 2014, antes da Copa do Mundo, com a instalação das UPPs projetadas para o ano seguinte. Dois anos depois, e com as Olimpíadas se aproximando, nenhuma UPP foi instalada e como os eventos de segunda-feira tragicamente mostram, conflitos violentos e a agressiva política de segurança do Estado baseada numa guerra continuam.
SOS Vila Autódromo! Associação de Moradores e Casa de Heloisa Helena Foram Demolidos Ontem
No início da manhã de quarta-feira, 24 de fevereiro, o prédio da Associação de Moradores da Vila Autódromo foi demolido após uma ordem de desapropriação ter sido emitida. No mesmo dia, à noite, a casa da mãe de santo Heloisa Helena Costa Berto também foi demolida.
Durante várias semanas os moradores têm vivido com medo da Tropa de Choque que tem chegado na parte da manhã para demolir casas, como o que ocorreu com as demolições ilegais do dia 11 de fevereiro, ou para modificar os muros de madeira que marcam a fronteira da comunidade com o Parque Olímpico, há apenas alguns dias, em 22 de fevereiro. A ordem inicial para demolir a Associação, prédio simbólico da resistência, foi aprovada no dia 4 de fevereiro, antes dos defensores públicos recorrerem e conquistarem a suspensão da ordem legal.
Na segunda-feira, a imissão de posse foi emitida e os moradores e apoiadores temiam o pior. Grupos de cerca de 13 e 30 apoiadores ocuparam a Vila Autódromo nas noites de segunda-feira e terça-feira, a fim de apoiar os moradores em sua resistência de manhã cedo.
Bem tarde, na terça-feira a noite, a segunda ordem de demolição foi anunciada, cobrindo as casas de Heloisa Helena e da ativista comunitária Maria da Penha. O Comitê Popular da Copa do Mundo e Olimpíadas denunciou essa ordem de demolição, uma vez que a decisão foi anunciada depois das 22h, em um “procedimento totalmente irregular”.
De manhã cedo, por volta das 5:30h, moradores e simpatizantes fizeram uma vigília à luz de velas no exterior do prédio da Associação, ainda incertos se a demolição aconteceria. Durante a vigília, alguns moradores ficaram na frente da Associação, com suas bocas amordaçadas e segurando faixas que pediam o legado social dos Jogos Olímpicos e avisos, em inglês, sobre os perigos da Zika ao redor do Parque Olímpico.
Pouco antes das 7h, a Tropa de Choque chegou em peso. As autoridades municipais entregaram as ordens de demolição para o Presidente da Associação de Moradores, Altair Antunes Guimarães, e alinharam-se para bloquear a área ao redor do prédio. Com a legalidade da ação confirmada, os moradores não podiam fazer muito a não ser fazer suas vozes serem ouvidas. A ativista e moradora Sandra Maria gritou para a multidão “a Associação não é só uma parede!”, e vai continuar a organizar a luta contra as remoções. Enquanto as máquinas de demolição trabalhavam, moradores e simpatizantes, muitos dos quais tinham lágrimas nos olhos, juntaram as mãos em um grande círculo e começaram a gritar:
“Olim…piada, Olim…piada, Olim…piada!”
“Urbaniza já, a Vila vai ficar!”
O edifício foi reduzido a escombros em apenas cinco minutos. Em seguida, os funcionários municipais retiraram os móveis do pequeno restaurante ao lado do prédio da Associação, antes de o demolir também.
Enquanto as máquinas de demolição ainda estavam derrubando tijolos e cercas, a voz apaixonada da ex-moradora Jane Nascimento ecoou sobre a comunidade. Sozinha em uma plataforma com um microfone, ela criticou a política “vergonhosa” do Brasil por trás de demolições como as de hoje. Ela reafirmou seu compromisso na luta pela permanência da Vila Autódromo, independentemente da demolição de hoje ou da demolição de sua própria casa, no último agosto. “Vou continuar lutando. A minha casa caiu, mas a minha luta não caiu”.
O presidente da Associação de Moradores, Altair Guimarães, se uniu ao sentimento de que a demolição de um prédio teria pouco impacto na determinação da comunidade de continuar resistindo à remoção: “Vamos continuar a lutar…vamos lutar até a última casa”. Em apoio a essa promessa, as palavras “Associação de Moradores” foram escritas na fachada da casa de Maria da Penha imediatamente após a demolição da Associação, o que demonstra a tenacidade dos corajosos ativistas comunitários.
Sandra Maria pegou o microfone para discutir o contexto da remoção na Vila Autódromo: “Nós sabemos que tudo que está acontecendo aqui não é por causa das Olimpíadas”. Em vez disso, ela falou sobre a especulação imobiliária desenfreada, a influência do dinheiro sobre os juízes e políticos, e a ganância do empresário bilionário Carlos Carvalho, que admite abertamente que ele quer comunidades pobres removidas para abrir caminho para acomodações de luxo para a elite “nobre”. Mas Sandra argumentou que a história da Vila Autódromo–de maus-tratos cometidos pela Prefeitura e os fortes laços comunitários–não será tão facilmente removida: “Quando estes prédios [de luxo] que o senhor Carlos Carvalho diz que vai fazer, começarem a ser construídos aqui, nós estaremos aqui. Essa imagem de hoje, todas essas imagens, que tem sido registradas aqui, espancamento de morador, tudo isso, ainda existirá”.
Ela também criticou as tentativas da Prefeitura de esconder a realidade da comunidade, e a pobreza em todo o Rio de Janeiro: “A pobreza existe aqui e todo mundo sabe isso. Se não quer mostrar para o mundo, a pobreza, acabe com ela”.
Pouco depois do prédio da Associação ser demolido e a maioria da Guarda Municipal ter ido embora, houve uma discussão acalorada envolvendo guardas municipais e apoiadores que haviam bloqueado a estrada para a casa de Maria da Penha com seus carros. Alguns guardas municipais estavam aparentemente preocupados com o acesso para emergência–algo que não lhes preocupavam na segunda-feira, quando se recusaram a permitir que os moradores ajudassem outro morador que estava tendo um ataque cardíaco.
Mais tarde, enquanto moradores e apoiadores foram se reagrupando na casa da Penha após os acontecimentos da manhã, um homem desconhecido entrou em sua propriedade e começou a filmar. Pelo menos um apoiador da Vila Autódromo disse que o tinha visto chegar e cumprimentar guardas municipais de uma forma amigável. Moradores, liderados por Luiz, marido de Maria da Penha, exigiram que ele saísse e uma pequena briga começou na entrada da casa. O suspeito funcionário da Prefeitura ou policial disfarçado foi seguido pela rua por uma multidão de moradores e apoiadores que exigiam saber quem ele era. Na entrada da comunidade policiais militares mediaram a situação, procurando o carro do homem desconhecido e dizendo-lhe para sair, antes de levar dois moradores à delegacia de polícia para registrar uma ocorrência.
Um dos Defensores Públicos explicou as questões legais, logo depois dizendo que, enquanto eles estão tentando lutar contra a ordem de demolição, suspendendo-a para análise, as casas de Maria da Penha e Heloisa Helena poderiam ser legalmente destruídas a qualquer momento.
Com essa base, guardas municipais se reuniram em grande número em torno da casa de Heloisa Helena logo após às 17h. Os relatórios iniciais diziam que a prefeitura não seria capaz de demolir a casa antes de 18h, suposta data limite para o dia, mas os guardas municipais adquiriram uma extensão até às 20h. À Heloísa Helena foi dada um tempo para remover seus animais de estimação e alguns dos últimos de seus pertences religiosos antes de sua casa ser demolida.
A casa da Dona Penha é um alvo provável para demolição ainda hoje, quinta-feira. Maria da Penha disse aos moradores reunidos na manhã de quarta-feira: “Agradeço muito, a cada um de vocês. O apoio de vocês é fundamental”. Ela e outros moradores da Vila Autódromo pedem que a maior quantidade possível de apoiadores se juntem a eles na comunidade, para dar a solidariedade neste momento de tanta incerteza.
Fique atento/a às atualizações da página no Facebook da Comunidade Vila Autódromo, e do RioOnWatch no Twitter. Nós estamos seguindo as ações da prefeitura direto da comunidade.
SOS Vila Autódromo! Tropa de Choque Retorna à Comunidade com Toda Força
Matéria publicada no dia 23 de fevereiro de 2016 às 22h.
Nesta segunda-feira, dia 22 de fevereiro, a Tropa de Choque e a Guarda Municipal se implantaram novamente na Vila Autódromo, desta vez para reposicionar o muro de madeira que tinham erguido no dia 13 de janeiro. No mesmo dia, a suspensão da ordem de demolição da Associação de Moradores chegou ao fim. Moradores enviaram mensagens de SOS nas mídias sociais para alertar os defensores da probabilidade de novas demolições e intimidações nos próximos dias.
Nesta segunda-feira, dezenas de soldados armados entraram na comunidade em torno das 7 horas da manhã sem nenhum aviso, seguindo o padrão das duas ocasiões anteriores, quando a tropa de choque invadiu brutalmente a Vila Autódromo. Desde 13 de janeiro, um muro de madeira separa uma grande parte da comunidade de uma estreita faixa ao longo da lagoa com duas casas restantes. Agora, barricadas bloqueiam todo o acesso à lagoa e outras comprimem os limites da comunidade, estando partes da comunidade original dentro dos limites do Parque.
Márcio, um morador, cuja casa agora faz fronteira com o novo caminho do muro, parecia estar sofrendo um ataque cardíaco após uma altercação com a tropa. De acordo com os seus vizinhos, a tropa bloqueou o acesso a sua casa até que os moradores insistiram que ele iria morrer se fosse deixado lá sozinho. Depois, finalmente, Márcio recebeu tratamento em um hospital próximo e voltou para casa no mesmo dia.
Em resposta ao fato da construção está invadindo cada vez mais o território da Vila Autódromo, os moradores perguntaram no Facebook: “Nessa longa jornada da Vila Autódromo, quem são os invasores desta terra? Os moradores que receberam do Estado através do ITERJ (Instituto de Terras e Cartografia do Estado Rio de Janeiro) o Título de Posse, que concede esta terra para fins de moradia ou a Prefeitura que sorrateiramente está ocupando uma área que não lhe pertence?”.
Na sequência dos acontecimentos de segunda-feira e com o fim da liminar contra a demolição da Associação de Moradores, os moradores estão chamando a imprensa e os aliados e simpatizantes da comunidade para se juntarem a eles em uma vigília permanente e ocupação na Vila Autódromo. A tensão excepcional desta semana foi realçada quando a página da comunidade no Facebook postou um resumo dos acontecimentos do dia anterior e uma chamada por apoio em inglês, uma ocorrência rara na página, normalmente, somente em português. A última postagem concluiu:
“The situation of Vila Autódromo is very fragile. Residents and supporters are called to support the community as soon as possible. Their struggle is going through a crucial time.”
“A situação da Vila Autódromo é muito frágil. Estamos chamando os moradores e apoiadores para apoiar a comunidade o mais rapidamente possível. A luta da Vila Autódromo está passando por um momento crucial.”
Além da Associação de Moradores, moradores temem que as casas pertencentes à família da Penha e a mãe de santo Heloísa Helena Costa Berto poderiam ser demolidas a qualquer momento. Penha e Heloísa Helena muito se dedicaram e foram ativistas visíveis na luta para permanecer, assim, como a Associação de Moradores, suas casas são de enorme importância simbólica para a comunidade. A casa da Penha agora é a única casa remanescente das que estavam incluídas na declaração do prefeito de desapropriação em março passado. Dona Maria da Penha continua uma otimista incansável. “Eu vou ficar em pé”, disse ela, enquanto varria seu andar em preparação para sediar ativistas e aliados em sua casa durante a noite. “Mesmo que a casa caia, eu vou ficar em pé”.
Outros moradores estavam menos positivos. Uma moradora refletiu sobre a ironia do lema do Brasil: “Que ordem? Não há nenhuma. Que progresso? Só nos bolsos dos políticos”.
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Ameaça à Vida da Mãe de Santo Luizinha de Nanã da Vila Autódromo
Essa é a segunda carta de Heloisa Helena Costa Berto/Luizinha de Nanã, enviada para o RioOnWatch. Leia a primeira, publicada em 17 de setembro de 2015, aqui.
Tem um mês em que vivo em estado de choque chorando e me sentindo fora da realidade.
No dia 11 de janeiro às 9:15 da manhã recebi uma ligação. Ao atender reconheci a voz da Sra R, uma senhora que morou em meu quintal por um ano. Ela disse ter se informado na subprefeitura, que eu devia cinquenta e cinco mil reais e que eu iria pagar a ela de qualquer forma. Acrescentou saber meu endereço e os lugares que eu frequentava. Declarou que iria mandar alguns familiares dela acabar comigo. Eu perguntei, “familiares?” Ela respondeu que eu já sabia o que a família dela fazia.
Comecei a tremer e chorar, pois a Sra R sempre falava da família que pertence a milícia. Acabou o telefonema dizendo que iria voltar na subprefeitura. Quando me acalmei tentei ligar para a Sra Marli Peçanha, funcionária do sub-prefeito da Barra. Liguei muitas vezes, mas ela não atendeu.
Fiz então o que seria melhor para me defender. Liguei para a Defensoria Pública e fui até o Centro da cidade onde encontrei o Dr. João e a Dra. Adriana. Tinha que me informar e saber o que eu poderia fazer, pois nunca me imaginei numa situação como aquela. Embora eles já soubessem de muitos fatos eu contei tudo desde o princípio.
Tenho uma casa religiosa, a Casa de Nanã. Luto há dois anos pela negociação e reassentamento de minha casa. Luto para que o direito dos moradores da Vila Autódromo que desejam permanecer na comunidade seja respeitado. Esta minha luta resultou em muitos confrontos com a subprefeitura do Rio de Janeiro. Fui muitas vezes humilhada, destratada, sofri com preconceito religioso. Cheguei ao ponto de ter uma crise nervosa na subprefeitura, depois de constantes humilhações por parte do Procurador do Município Marcelo Marques. Fiquei depressiva, acamada e meus problemas de dores crônicas pioraram.
Apesar de todos estes problemas minha vontade de justiça aumentou, fui a Brasília com a ajuda de Frei Davi Raimundo, estive em reunião com a Relatora da ONU Sra. Rita Izsak, em reunião no Senado com o Senador Paulo Pain, com o Desembargador do Tribunal do Estado do Rio de Janeiro Paulo Sergio Rangel entre outros. Em audiência pública no Senado Federal na Comissão de Direitos Humanos Presidida pelo Senador Cristovam Buarque, fiz meu discurso em defesa do reassentamento e permanência da Vila Autódromo. Em virtude da luta que travamos recebi a Comenda Pedro Ernesto, a mais importante comenda oferecida pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro e a medalha Dandara oferecida pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
A luta sempre foi árdua para todos da Vila Autódromo. Sofremos pressões diárias constantemente. Frequentemente não temos luz e água, o serviço de lixo foi suspenso, as linhas telefônicas praticamente não funcionam. Isso também se incluem o serviço de internet e televisão a cabo. As empresas suspendem o serviço mesmo com os usuários com os pagamentos em dia. O serviço de correio também não funciona com normalidade. Muitos serviços são suspensos, por conta das empresas terem recebido informações de que não há mais moradores no lugar. Vivemos cercados por crateras que são inundadas de água de chuva e viram criadouros de mosquitos, isto com a junção do desmatamento de toda área do entorno da lagoa, mais a retirada de todas as árvores da comunidade que infesta a comunidade de mosquitos. Levamos 40 anos realizando um trabalho ecológico de florestamento, tínhamos árvores raras como Ipês e Pau-Brasil, todas as árvores da Vila Autódromo foram tiradas e viraram pó.
As pessoas que permanecem na Vila Autódromo e continuam defendendo os princípios de união entre os moradores, defendendo uns aos outros como uma família, são poucos. Pois a estrutura mental para suportar todas as humilhações que sofremos todos os dias tem que ser imensa.
Conheci o Sr M, marido da Sra R, através de um vizinho. Na época o Sr M estava com dificuldades pois a família cuidava e vigiava a casa de seu patrão na Vila Autódromo e este estava negociando com a prefeitura. Portanto, a família dele, que já residia na Vila Autódromo por muito tempo, ficaria sem ter onde morar. O Sr M conseguiu dinheiro com o patrão para comprar material de construção. Pediu para que eu cedesse um espaço, no meu quintal, para ele fazer a quitinete.
O Sr M nunca me forneceu dinheiro, o que houve foi troca de favores. Eu cedia espaço e ele fazia trabalhos de pedreiro para mim. Eu não sabia, na época, que a esposa dele tinha familiares perigosos.
Lembro-me do dia em que a família da Sra R foi despejada da casa do patrão. Foi um domingo de manhã. A Sra R chegou chorando muito e eu a acolhi com todo carinho.
Sempre tentei negociar com a prefeitura e ainda continuo tentando, pois meu principal interesse sempre foi ser reassentada, um direito que tenho perante a lei.
Todas as vezes que eu fui na subprefeitura da Barra da Tijuca para negociar, eu pedi por ela, Sra R, também, tanto quanto pedia pela minha filha. Ainda tenho cópia da carta reivindicando um acordo. No resumo eu pedia meu reassentamento, um apartamento para minha filha, pois ela tinha um lugar independente da minha casa onde morava, e um apartamento para a Sra R, pois ela não tinha onde morar.
A perita quando esteve em minha casa avaliou minha casa, o centro espírita, a quitinete de minha filha e as outras quitinetes. As informações que recebi eram que a pessoa recebia o valor da avaliação ou o apartamento da prefeitura. A Sra R sempre disse que precisava de um lugar para morar e que a prioridade dela era o apartamento.
Por minha casa ficar na beira da lagoa, pela avaliação ser feita em relação a casa e não ao terreno e de acordo com a lei (que diz que em caso de eu ser retirada da beira da lagoa eu posso ser reassentada na área social), resolvi aceitar o acordo, mesmo não concordando.
Começou então uma pressão para que eu saísse, antes de receber, e sem que a Sra R recebesse o apartamento dela. Tenho mensagens da Sra Marli Peçanha me pressionando para que eu saísse da casa antes do pagamento, e antes da prefeitura dar o apartamento para a Sra R. Falei claramente através de mensagens que eu só mudaria junto com Sra R. Só neste momento a Sra Marli marcou com a Sra R para fazer a escolha do apartamento dela.
Logo após, a Sra R ficou sabendo que tinha pessoas recebendo apartamentos e dinheiro de indenização. No dia que Sra Marli concordou em dar a chave do apartamento para Sra R, ela se negou e disse que só sairia com o valor em dinheiro também.
Eu disse que poderia lutar por um teto para ela, mas por dinheiro ela seguiria lutando sozinha. Foi quando ela foi a subprefeitura e disseram para ela que eu havia pego o dinheiro dela. Ela retornou nesse mesmo dia a ligar para mim com esta informação. Eu disse que isso era impossível pois qualquer valor era dado com cheque nominal.
Liguei para a prefeitura, e falei com uma funcionária da prefeitura, a Sra T. Ela me disse que já que eu defendia Sra R então esse valor era para eu pagar. Lembro que mais tarde Sra R me mandou um recado me pedindo cinco mil reais. Foi quando eu parei de responder as mensagens dela.
No dia seguinte uma vizinha minha ligou para eu ir correndo em casa, pois Sra R estava se mudando e a máquina de demolição estava demolindo atrás da minha casa. Quando cheguei Sra R já tinha se mudado, e uma das paredes do meu centro espírita estava no chão. Eles falaram que foi acidente.
A partir deste momento eu e meus filhos nos revessávamos noite e dia para vigiar a casa, pois ficamos com receio de uma demolição repentina, isso já havia ocorrido com três vizinhos nossos. A parede derrubada não foi reconstruída. Em outra ocasião a prefeitura já tinha derrubado parte de outra parede, que também não foi reconstruída. Minha casa atualmente está imprópria para moradia. Com as obras da prefeitura muitas paredes estão rachadas, há vazamentos em todos os cômodos, mofo por toda a casa, portas que não fecham, o teto da cozinha caído e inundações causadas pelo aterramento da rua que colocou minha casa em posição muito inferior ao nível da rua.
Com a ameaça de morte eu fiquei com medo de voltar na minha casa, proibi meus filhos de irem lá também.
No dia seguinte recebi mensagens da Sra Marli Peçanha citando os familiares da Sra R, mas quando eu tentava falar com a Sra Marli não conseguia. Depois recebi recados dizendo que a Sra R tinha invadido minha casa com os familiares dela e que só sairia se recebesse o dinheiro. Me comuniquei com a defensoria pública. Minha casa estava invadida e a prefeitura disse que iria demolir a parte da Sra R. Tive medo de que demolissem tudo. O defensor disse que isso não iria acontecer, que se comunicou com a Procuradoria Geral do Município e que o subprefeito Alex Costa me pagaria na quinta dia 14 de janeiro. Falou para eu esperar a comunicação da subprefeitura.
No dia 14 de janeiro minha casa foi cercada por guardas municipais armados, carros de polícia, o subprefeito Alex Costa, M, R e máquinas de demolição.
Durante a ação meu filho foi até minha casa, onde ele recebeu “conselhos” da Sra Marli Peçanha, que reafirmou que nós tivessemos cuidado com os parentes da Sra R, pois eles eram “muito perigosos”. A Sra R e a Sra Marli foram juntos no carro que serve à subprefeitura. Durante o trajeto a Sra R postou uma mensagem no grupo da comunidade, com informações sobre a negociação da minha casa e da minha vizinha, nome completo da minha vizinha e detalhes de nossas negociações com a prefeitura sobre as quais ela não tinha conhecimento, em um português perfeito com vírgulas e pontos, sendo que a mesma não sabe ler nem escrever.
Sei que devemos ser responsáveis por nossas ações, devemos assumir a consequência dos atos que praticamos. O dinheiro é um fator que cega as pessoas, desune famílias, ainda mais companheiros de luta. Esta é a razão de mencionar, acima, a pressão que vivemos na Vila Autódromo. Temos sido levados a desconfiar do vizinho, pois existe por parte da subprefeitura este trabalho de minar a confiança. Uma traição, por isso, seria então motivo de muitas discussões e separações. Os mais fortes reconhecem estas artimanhas e as afasta. Os fracos caem e a vida um dia cobra. A Sra R não sabe ler nem escrever, os valores dela são materiais, tenta se afirmar na vida pelo número de objetos caros que tem, para se sentir superior em algum ponto. Não tiro dela o erro da ambição, afinal ela foi paga pela prefeitura, e traiu quem a acolheu. Mas é visível, ao meu ver, que foi usada para me afastar da casa. Assim eu apavorada não iria na Vila, não reclamaria, e isso abaixaria meu valor, pois no desespero da ameaça eu aceitaria qualquer valor para ir embora e parar de lutar.
A Rua Autódromo que eu usava foi desativada, minha casa foi cercada e ficou dentro do Parque Olímpico.
Eu não posso mais levar visitas em minha casa, não posso praticar minha religião, o correio não tem acesso a minha casa, para entrar na minha casa tenho que usar crachá. Somente eu e meu filho temos direito a entrar. Tenho animais na casa que não estão se alimentando direito por causa da dificuldade de acesso. Eu tenho problemas de locomoção, pela Rua Autódromo eu conseguia ir andando. Agora eu tenho que entrar pelo Parque Olímpico, e da entrada até minha casa são cinco quilômetros.
As duas primeiras semanas, fiquei em silêncio, tinha medo. Foi a ocasião da formatura de minha filha caçula. Meu pensamento era só um, eu queria ver a formatura de minha filha, queria que tudo fosse lindo, que nada estragasse o momento dela. Lutei muito para conseguir formá-la em uma universidade boa.
Mas como sempre minha comunidade me deu força para falar, então saio como um grito de liberdade. Falei para a comunidade que estava sendo ameaçada, eles me deram força, e eu voltei a lutar.
Organizamos uma passeata dia 27 de janeiro, fechamos a rua principal e fomos entoando gritos de luta e coragem, fomos da comunidade até a entrada do Parque Olímpico. Ao chegarmos na portaria convidei a todos para irem na minha casa para me visitar e na frente de todos, da imprensa, de representantes de ONGs, eles falaram que eu não poderia levar ninguém na minha casa.
Pacificamente, mas com força e persistência a comunidade de Vila Autódromo insistiu. Eu li o artigo quinto da constituição do meu país que diz que estavam impedindo meu direito de ir e vir, e impedindo que eu exercesse minha religião, já que minha casa é um lugar religioso. Havia policiais no local, pedi para que eles interferissem, pois os seguranças estavam cometendo um ato anticonstitucional. A resposta que ouvi era para irmos na delegacia, caso eu estivesse me sentindo ofendida. A alegação era que ele nem sabia se a casa era minha mesmo.
Continuamos unidos por mais algumas horas em frente a portaria, decidimos não ir à delegacia pois já havíamos feito isso na semana anterior e o resultado foi insatisfatório, já que o delegado era familiar da Sra Marli Peçanha.
Depois de algum tempo ouvimos o supervisor da portaria transmitir a resposta dada pelo subprefeito Alex Costa em relação ao meu pedido de receber visitas na minha casa. Ele nos disse que ninguém poderia entrar e que quem assim desejasse deveria antes fazer um cadastro na prefeitura.
A casa da Sra. Marcia Lemos está em situação igual a minha e ela já fez a requisição de entrada há um mês e ainda não teve autorização até o dia de hoje.
No dia 2 de fevereiro, estive mais uma vez na subprefeitura. Fui chamada no mesmo dia, logo após a passeata. Cheguei às 19:00hs. A proposta era para eu receber meu cheque, ir direto a minha casa onde estaria esperando um caminhão de mudança e na mesma noite a casa seria demolida. Não aceitei, tenho compromissos com meus santos e respeito por eles. Nunca iria expor meus santos e as pessoas que confiam em mim, na véspera de carnaval à noite pelas ruas. Marquei uma nova data que não foi bem aceita, com isso me senti mais vulnerável.
No dia 4 de fevereiro fui a ALERJ na Comissão de Direitos Humanos, fiz minha denúncia da ameaça de morte, e de como estou me sentindo. Fui aconselhada a permanecer em casa, não me expor nas ruas e sair da cidade. A preocupação é real e preocupante. Não sou a única a ser ameaçada na comunidade. Fiz inclusive denúncia de injúria, pois funcionários da prefeitura espalharam para a comunidade que recebi em novembro dois milhões de reais e agora em fevereiro quatrocentos e noventa mil reais.
Há dois anos eu não vivo, eu só luto, meu corpo está todo tomado por dores crônicas consequência da cirurgia, dos oito parafusos, das placas, falta de tratamento por falta de tempo e stress emocional.
Muito pior que isso e a minha partida, amo minha comunidade. Sinto-me vazia por dentro, roubada, invadida, violentada. Tiram de mim a razão do meu viver, a atividade de minha religião. O que eu desejava era apenas continuar com minha casa, meus animais, minhas plantas, ajudando as pessoas que vinham me procurar com seus problemas, cultuar meus santos com minha fé.
Agora o que eu quero é justiça. Que o povo da minha Vila Autódromo tenha assegurado seu direito à moradia, com dignidade, com urbanização. E por isso que lutei e continuarei lutando. Por esse povo guerreiro da Vila Autódromo que só deseja ter seus lares de volta.
ATENÇÃO. Os nomes de algumas pessoas foram substituídos por letras, por questão de segurança.
– Heloisa Helena Costa Berto/Luizinha de Nanã
Assista a participação de Luizinha de Nanã em Audiência Pública no Senado em novembro:
Caixa de Surpresa: Um Centro de Produção Cultural na Zona Oeste do Rio
Uma organização comunitária em Bangu, na Zona Oeste, está trabalhando com jovens, crianças e famílias para juntar eventos culturais, aulas, atividades e discussões sobre cidadania e colocar a cultura da Zona Oeste no mapa. O Caixa de Surpresa foi iniciado em 1982 por um grupo de músicos da favela Vila Aliança e foi oficialmente registrado como ONG em 2004. Tendo sua primeira aparição no RioOnWatch em 2011, atualmente a organização usa seus recursos e espaço para oferecer uma gama de oficinas de arte e cultura, além de atuar como um centro cultural para a região.
A coordenadora de projetos do Caixa de Surpresa, Leidimar Machado, explica que a organização tem um grande foco na juventude: “Nossa função é trabalhar com os jovens oferecendo arte e cultura, e também falar das suas vulnerabilidades para fortalecer o potencial deles, para que eles se vejam dentro da arte e vivam transformações dentro das suas comunidades”.
O Caixa de Surpresa proporciona arte gratuita, aulas de atuação e de esportes para os membros da comunidade de todas as idades em sua sede, um prédio abandonado da prefeitura que eles utilizam desde 2008 e vem transformando ao longo dos últimos cinco anos. As aulas incluem judô, capoeira, dança africana, teatro e break dance. Também são realizadas aulas de arte como desenho, percussão e criação de instrumentos. Os projetos atuais incluem um estúdio de gravação, para aqueles que têm interesse em produzir música, e dar continuidade a renovação do local.
Bem como aulas e workshops, o espaço Caixa de Surpresa tem como função ser um ponto de encontro e centro cultural que hospeda uma grande variedade de eventos, incluindo uma roda quinzenal de hip hop, eventos de rock, samba e a Roda Cultural de Bangu.
Distante das regiões do Centro e da Zona Sul onde as iniciativas culturais do Rio estão concentradas, a Zona Oeste historicamente não tinha recursos e espaços para dar suporte a cena cultural. O trabalho do Caixa de Surpresa, oferecendo aulas, espaços para o encontro de artistas e músicos e sediando eventos culturais, é uma resposta essencial.
A coordenadora Leidimar disse: “Finalmente [o movimento cultural] está crescendo muito na Zona Oeste. Tem precariedade de arte e espaços culturais, aí esse aqui tornou-se um espaço múltiplo, um agregador de cultura como um todo atraindo gente de outros lugares”. Ela explica que moradores dos vizinhos Realengo e Vila Kennedy vão aos eventos culturais no Caixa de Surpresa e discutem planos de organização para diversificar os futuros eventos realizados, de forma a incluir o estilo de música forró e charme, além de atender os gostos de toda a comunidade.
Os eventos organizados sempre procuram educar e informar além de entreter, discutir temas como violência, gênero, crime e gravidez na adolescência. A informação é promovida e a discussão estimulada através de peças de teatro, palestras e folhetos.
Investir no potencial artístico da região e criar uma cena cultural forte fez com que o Caixa de Surpresa se tornasse oficialmente reconhecido como Ponto de Cultura. O fundador e diretor do Caixa de Surpresa, Waldemir Correa, tem esperança de que ocorra uma descentralização da cultura e do turismo do Rio de forma, que áreas como Bangu não sejam marginalizadas e sim consideradas centros culturais valiosos. Certamente os esforços da organização em crescer e apoiar os vibrantes talentos locais e movimentos culturais, além de promover oportunidades para os jovens se envolverem com artes, esportes e cultura, mostra que essa cultura pode existir e prosperar.
Confira nosso vídeo de 2011 do Caixa de Surpresa:Bloco de Carnaval Mulheres Rodadas Protesta Pelos Direitos das Mulheres
No dia 10 de fevereiro, último dia oficial do carnaval, um grupo diversificado de cerca de 2.500 pessoas se reuniu no Largo do Machado na Zona Sul para um bloco diferente: o desfile do Mulheres Rodadas que está agora em seu segundo ano. A jornalista Renata Rodrigues, co-fundadora do bloco conta que, em dezembro de 2014, o Mulheres Rodadas foi inspirado por uma foto viral no Facebook de um jovem segurando um cartaz dizendo: “Não mereço mulher rodada”. A postagem provocou indignação entre milhares de mulheres, que responderam com a hashtag #SomosTodasRodadas.
Protesto através da festaRenata Rodrigues e suas co-organizadoras se inspiraram e organizaram um evento para dar continuidade para conversas sobre o machismo, e construir respostas feministas criativas. Renata destacou que trazer questões políticas e culturais é parte da própria trama do carnaval, embora possa não ser claro para os turistas que visitam.
Ela explicou que a adição da discussão feminista na tradição de abordar as questões políticas mais prementes na sociedade através do imaginário e da plataforma do carnaval atinge um novo tipo de público: “Quando você traz a arte e esse tipo de coisa, música e tal, você alcança e toca as pessoas de outra forma [com] uma agenda positiva… A gente fala com outras pessoas, gente que tradicionalmente não está dentro disso [círculos ativistas] e não está pensando nisso”.
Carnaval sem assédioNão só o carnaval permite um tipo diferente de protesto, mas é um momento importante para enfrentar o sexismo, dado que os blocos são locais de muito assédio sexual. O assédio é um problema no Brasil em qualquer época do ano. Um estudo realizado pela Think Olga mostrou que, das quase 8.000 entrevistadas, 98% delas tinham sofrido assédio. No entanto, o problema piora durante a atmosfera do carnaval, e a campanha #CarnavalSemAssédio, com a parceria do Mulheres Rodadas, atraiu muito o apoio do público.
O bloco Mulheres Rodadas reuniu tanto adolescentes, novas para o ativismo, com mulheres mais velhas que já estão por longo tempo na luta pelos direitos das mulheres. Infelizmente, as mulheres de todas as idades tinham histórias para contar de assédio durante o carnaval.
Arlanza Rebello do Núcleo da Defensoria Pública do Rio de Janeiro para a Defesa dos Direitos da Mulher explicou que a parceria do Núcleo com o bloco começou com um telefonema de uma das suas organizadoras. Elas lhe disseram que, em outro evento de carnaval “um homem a viu com a camiseta do Mulheres Rodadas e proferiu insultos e ameaçou até que a estupraria, que poderia, porque ela é uma mulher que se chama de desfrutável, disponível”.
Arlanza Rebello explicou que o bloco “traz ao carnaval o protagonismo das mulheres, que deixam de ser objeto de musiquinhas machistas e do prazer do homem, para mostrar que temos autonomia, queremos brincar, e ser respeitadas”.
Sofia Feitoso, de 16 anos, também teve esse sentimento na experiência do seu primeiro carnaval que passou de forma independente com os amigos: “Para mim esse carnaval foi a maior demonstração que precisamos lutar muito mesmo. Porque eu já sofri muito assédio nesse carnaval. Já virou uma coisa normal”.
A mudança políticaAs participantes do Mulheres Rodadas clamam por uma mudança política, tanto a nível local e nacional, e também por uma mudança cultural, e o bloco de forma criativa mistura os dois. Muitas exibiram cartazes onde se lia “Fora Cunha“. As mulheres do Núcleo dos defensores públicos disseram que Cunha é o “inimigo número um” dos direitos das mulheres, destacando suas tentativas de proibir o aborto legal no caso de estupro e sobre a possibilidade dele contestar a lei Maria da Penha, que desde 2006 apoia vítimas de violência doméstica através de sistemas de penalidade e relatórios diferenciados.
Deste grupo, a advogada Georgia Bello falou sobre como ela havia considerado se fantasiar como a esposa do candidato a prefeito do Rio de Janeiro Pedro Paulo por causa da sua conhecida história de violência doméstica. Ela explicou que tal afirmação: “não é banalizar a violência, é mais uma maneira de dar visibilidade. De chamar atenção para que as mulheres não esqueçam que daqui a pouco vai ter uma eleição e que um candidato que pode entrar, é um candidato que bate em mulher”.
Para além do CarnavalAs atividades do Mulheres Rodadas estão definidas para continuarem para além do bloco. Depois do primeiro bloco em 2015, Mulheres Rodadas fez parceria não só com a campanha #CarnavalSemAssédio, mas também com a ONU Mulheres, e o Núcleo de Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública, com a intenção de realizar ações contínuas durante todo o ano.
A banda começou a tocar no segundo ano do Bloco das Mulheres Rodadas e Renata Rodrigues falou das ações planejadas para o Dia Internacional da Mulher em 8 de março e além: “eu acho que 2016 é um ano promissor… temos muitas pessoas engajadas”.
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