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Raquel Rolnik Lança o Livro ‘Guerra dos Lugares’ na Vila Autódromo
“Não é todo autor de livro, não é todo professor, não é todo pesquisador que tem o privilégio de poder lançar o seu livro exatamente no lugar e na situação sobre a qual o livro está falando.”
Essas foram as primeiras palavras que a renomada arquiteta, urbanista, professora e pesquisadora Dra. Raquel Rolnik falou no lançamento do seu novo livro Guerra dos Lugares: a Colonização da Terra e da Moradia na Era das Finanças na Vila Autódromo no sábado, 5 de março. Aproximadamente 100 pessoas se juntaram no parquinho da comunidade na Vila Autódromo para ouvir a ex-relatora especial em Direito a Moradia Adequada da ONU (Organização das Nações Unidas). De pé sobre uma pedra, Rolnik fez um discurso apaixonado sobre a urgência da situação nesse momento tenso da comunidade.
“Muito do que eu aprendi e que está registrado nesse livro, eu aprendi com a Penha e com os moradores e com as pessoas que ajudaram os moradores aqui da Vila Autódromo. Eles me ensinaram e me contaram coisas durante os seis anos em que eu fui Relatora Especial de Direito a Moradia Adequada da ONU.”
O principal argumento do discurso dela, e do seu livro, é que existe um fenômeno global de apropriação de terras ganhando espaço com terras sendo tomadas para servirem de suporte para mercados financeiros e o acumulo de capital. “Isso é um processo global. Está acontecendo em todo lugar” ela disse.
“Nós estamos falando de um processo de ocupação do espaço e de construção do espaço que não tem nada a ver com a necessidade das pessoas. Que não tem nada a ver com o que as pessoas precisam para viver individualmente e coletivamente, com as necessidades de moradia, com as necessidades de uso dos espaços públicos, com as necessidades das atividades econômicas. Tem a ver única e exclusivamente com as oportunidades de capturar mais lugares onde o capital financeiro pode encontrar maneiras de investir para poder gerar mais rentabilidade para si mesmo.”
Rolnik constatou que terra urbana é o veículo perfeito para esse tipo de investimento por duas razões. Em primeiro lugar, a terra pode diminuir em valor, mas ela nunca deixará de existir. Isso é muito diferente de outros métodos de investimento mais voláteis. A segunda razão é que a terra pode ser usada como garantia para outros investimentos, o que faz com que ela seja valiosa para ser mantida.
O Brasil, Rolnik disse, é diferente de outros países ao redor do mundo. Ele carece de um clima político que garanta a moradia como um direito. Guerra dos Lugares descreve casos em vários continentes e diferentes culturas políticas em torno da moradia e de como o pobre está sendo desproporcionalmente afetado pelo período pós crise financeira global de 2008.
“A realidade é que os pobres e as pessoas mais vulneráveis são os que vão pagar no momento em que uma crise financeira ocorre. Eles são os que não tem nada, que terminam no meio da rua. Estados, cidades, e países onde eles moram não têm uma política alternativa para lidar com eles”, disse Rolnik.
Talvez a declaração mais aguda que Rolnik fez durante sua palestra foi sobre a conexão entre o aumento do uso da terra e da moradia como ativo financeiro e o enfraquecimento dos direitos dos pobres. Isso é tratado com “em outros termos: com despejo”.
O registro e formalização da terra, ela disse, não é em benefício daqueles que vivem nela, mas sim em benefício daqueles que estão tentando usar a terra por motivos especulativos, porque a terra só serve para este fim quando ela está oficializada.
De acordo com a lógica, usar a terra como moradia para os pobres é visto como o pior uso possível, porque isso não maximiza os ganhos financeiros. Com essa lógica, a melhor opção é de lugares para shoppings ou hotéis cinco estrelas.
Rolnik resumiu essa visão: “O único valor é o lucro máximo que pode ser retirado da terra, inclusive de terras públicas”.
Rolnik concluiu sua conversa observando que o Brasil historicamente tem intencionalmente provocado a especulação imobiliária com o governo oferecendo favores a grandes corporações até mesmo durante as administrações de Lula e Dilma do PT.
No entanto, ela observou, há esperança para combater estes problemas, especialmente através da passagem de conhecimento para as gerações mais jovens e continuando a resistir. Ela disse: “O futuro já está aqui. O futuro está aqui através das resistências. O futuro está aqui por esta solidariedade”, se referindo ao caso da Vila Autódromo.
Assista a palestra completa de Raquel Rolnik na Vila Autódromo:Prefeitura Demoliu Casa de ‘Mulher Cidadã’ no Dia Internacional da Mulher
Para as mulheres em todo o mundo, o Dia Internacional da Mulher é um dia de celebração. Este ano, Maria da Penha da Vila Autódromo, reconhecida pela manhã aqui no RioOnWatch, tinha planejado passar o dia comemorando. Dona Penha estava programada para falar em um painel às 14h sobre “Ser Mulher na Cidade”, como parte da mais recente conferência da série Se a Cidade Fosse Nossa, e em seguida participar de uma cerimônia de premiação às 17h na ALERJ, onde ela iria ser premiada com o “Diploma Mulher Cidadã Leolinda de Figueiredo Daltro“, por seus corajosos esforços na luta pelo direito à moradia na Vila Autódromo e em toda a cidade.
Ao invés disso, às 6h Dona Penha acordou com a Tropa de Choque cercando a sua casa, prestes a demoli-la. Ela passou a manhã removendo seus pertences restantes, e foi forçada a cancelar a sua fala às 14h. Em seguida, logo após a demolição, a comunidade recebeu a notícia de que o Prefeito Eduardo Paes agendou um coletivo de imprensa no Palácio da Cidade às 17h, horário simultâneo com a premiação na ALERJ, para anunciar seu plano de urbanização da Vila Autódromo. Resultado que deve ter relação com a crescente pressão global da campanha viral #UrbanizaJá. Porém o anúncio de urbanização não tinha sido apresentado à própria comunidade, em nenhum momento.
Os moradores da Vila Autódromo então planejaram a sua própria coletiva de imprensa fora dos portões do palácio para 16h. Dessa forma, eles poderiam compartilhar suas opiniões com os jornalistas que chegavam no local, e em seguida assistir a coletiva de imprensa do prefeito para saber de seus planos para a comunidade. Mas esta troca democrática não foi uma verdadeira opção. Ao ouvir sobre a coletiva de imprensa da comunidade, o Prefeito Eduardo Paes mudou a localização do seu coletivo de última hora. Com isso, os moradores da Vila Autódromo foram excluídos do evento onde os seus destinos seriam revelados. Eles, junto com os apoiadores, realizaram o seu coletivo de imprensa, e em seguida, foram para a ALERJ para presenciarem Maria da Penha recebendo o seu prêmio. O dia terminou com uma celebração da força e coragem de Penha, na luta para permanecer na Vila Autódromo.
Nos últimos meses, a prefeitura aumentou a pressão sobre a Vila Autódromo, localizada ao lado do Parque Olímpico. Em dezembro, os que se recusaram a sair foram ameaçados, com o Sub-Prefeito Alex Costa declarando: “Se você não sair por amor, sairá pela dor“. Com os Jogos Olímpicos a aproximadamente cinco meses, nas últimas duas semanas têm ocorrido um aumento de demolições simbólicas. A casa do presidente da Associação de Moradores, Altair Guimarães, foi ilegalmente demolida, juntamente com o edifício da Associação de Moradores e as ameaças de demolição da casa de Maria da Penha. Preocupados com essas ameaças, centenas de apoiadores ficaram de vigília, mantendo uma presença constante na comunidade, em proteção a estes proeminentes líderes da comunidade que lutaram por longo tempo por suas casas e comunidade. Terça-feira, no entanto, às 6h, a prefeitura enviou cerca de 100 Guardas Municipais, que ao invés de entrarem por uma das principais entradas da comunidade, entraram pelo Parque Olímpico, desmontando uma cerca existente para ter acesso a casa de Dona Penha.
Após cercar a casa de Dona Penha, eles aguardaram a remoção do resto de seus pertences antes de mover os moradores e apoiadores para trás do cordão de isolamento em preparação para a demolição. A demolição começou sem nenhuma supervisão de um engenheiro e sem água pulverizada sobre os escombros–o que reduz a poeira e é fundamental quando se considera a presença de um bebê de um mês na casa vizinha, de Márcio e Rafaela. Nathalia, filha de Maria da Penha, condenou o fato da demolição ter ocorrido no Dia Internacional da Mulher. Apoiadores e moradores gritavam “Urbaniza Já, a Vila Vai Ficar!”. E alguns destacaram o contraste entre as ações da Prefeitura e o lema nacional “Ordem e Progresso”.
Após a demolição, a Guarda Municipal dispersou, retornando para o Parque Olímpico pela abertura que eles tinham feito na cerca. Logo depois, no entanto, eles voltaram, cercando a casa de Márcio e Rafaela e seus quatro filhos, incluindo Sofia de um mês de idade. Com as crianças colocando suas cabeças para fora da porta aterrorizadas e confusas, os moradores e apoiadores correram para a casa, temendo uma demolição ilegal. Alguns foram capazes de passar para dentro do cordão de isolamento da Guarda Municipal, mas quando o marido de Penha, Luiz, tentou passar para se juntar a eles, ele foi empurrado para trás com escudos. Depois de alguns momentos tensos, Márcio e os defensores públicos disseram aos soldados da Guarda Municipal que eles não podiam, legalmente, estar lá, e eles foram embora, desaparecendo tão rapidamente quanto haviam aparecido. A moradora Sandra Maria alegou que os guardas estavam tentando mover o muro que separa a comunidade e o local da construção do Parque Olímpico Rio 2016, isolando a casa de Márcio. Uma tática semelhante de isolamento e intimidação tinha sido usado contra Heloisa Helena, cuja casa e local religioso foram demolidos há duas semanas.
Maria da Penha falou para uma multidão de jornalistas reunidos na comunidade que testemunharam a demolição: “hoje, no Dia Internacional da Mulher, demoliram a minha casa, uma história de vida, mas não me demoliram… Isto é como as coisas funcionam neste país. Para megaeventos, eles tiram a sua casa e você está na rua”. Ela reafirmou seu desejo de ficar, dizendo que “agora a luta é para eu ficar na Vila Autódromo… a luta continua”. Como Dona Penha, Luiz Claudio falou com a mídia presente, e os apoiadores ajudaram a levar seus pertences para Igreja Católica da comunidade, onde irão ficar.
À medida que a poeira assentou sobre os escombros da casa de Penha, o Prefeito Eduardo Paes, que tem repetidamente prometido que aqueles que querem ficar na Vila Autódromo podem ficar, anunciou um coletivo de imprensa no Palácio da Cidade em Botafogo às 17h, onde ele iria revelar seus planos de urbanização para Vila Autódromo. Nas últimas semanas centenas de pessoas em todo o Rio, no Brasil, e cada vez mais internacionalmente têm participado de uma campanha viral crescente endereçada ao prefeito para manter sua promessa de urbanização imediata da comunidade (#UrbanizaJá).
Os moradores e apoiadores rapidamente planejaram seu próprio evento fora do Palácio às 16h para comunicar com a imprensa a sua perspectiva sobre a história e renovar as suas chamadas para a implementação do premiado Plano Popular, um plano que foi desenvolvido pela comunidade, de forma iterativa, com planejadores urbanos de ambas as universidades federais do Rio de Janeiro respondendo todas as alterações feitas no adjacente plano do Parque Olímpico, desde 2012. Eles, então, tinham planejado participar em seguida da coletiva de imprensa do prefeito para descobrir o que ele iria apresentar como o plano para a sua comunidade, um plano que ele ainda não tinha apresentado aos moradores.
Às 16h, então, os moradores falaram com os meios de comunicação fora dos portões do Palácio, enquanto os apoiadores exibiam cartazes na passagem do trânsito. Principais veículos brasileiros de comunicação participaram da conferência, incluindo o Globo, Record e SBT. Maria da Penha disse à imprensa: “Essa medalha vai me fortalecer para continuar firme na luta… a luta continua”. Os moradores e apoiadores clamavam pela urbanização com os gritos “Urbaniza Já, a Vila vai Ficar!”, antes de explicar e distribuir informações sobre o premiado Plano Popular. A mídia internacional também cobriu, amplamente, a demolição da casa de Penha e os eventos de terça-feira.
Foi durante essa conversa com a imprensa na frente do local previsto para a coletiva de imprensa com o prefeito que os moradores descobriram que o gabinete do prefeito, repentinamente, mudou a hora e o local de seu evento. Eduardo Paes iria então falar no Centro de Operações, na Cidade Nova, às 16:30h. Uma viagem que demora meia hora nas melhores circunstâncias, agora no horário de rush, impossibilitou que os moradores ouvissem o prefeito revelar seu plano pretendido. Uma equipe do RioOnWatch chegou ao Centro de Operações na Cidade Nova a tempo para o evento, mas a entrada foi recusada. Foi dito a eles que somente jornalistas que estavam em lista privada poderiam participar.
O professor de Planejamento Urbano da UFRJ, Carlos Vainer, que coordenou o Plano Popular da Vila Autódromo, definiu o plano do prefeito como “ridículo.” Ele continha 30 casas, em oposição as 50 necessários para abrigar as famílias restantes incluídas no Plano Popular, e as casas seriam significativamente menores que as dos atuais moradores. Elas seriam todos posicionadas em torno de um espaço comum, que Vainer condenou como um projeto que simplesmente dá a aparência de comunidade, em vez de realmente promovê-la. Na verdade, a reformulação completa da comunidade pelo plano do prefeito é característica de renovação urbana, e não de urbanização, como o prefeito prometeu. Uma matéria do Globo da coletiva de imprensa do prefeito relata que a prefeitura tem estado em constante diálogo com a Vila Autódromo, insistindo que os moradores “queriam receber um valor muito alto pelas casas“. Os moradores remanescentes, no entanto, são aqueles que não negociaram com a prefeitura em nenhum momento–e eles são reconhecidos internacionalmente pela sua mensagem de que nem todo mundo tem preço.
Depois que os moradores e apoiadores reunidos no Palácio souberam da mudança de planos feitos em relação à coletiva de imprensa do prefeito, eles rapidamente se encaminharam para a ALERJ, onde Maria da Penha foi receber o prêmio como parte do Dia Internacional da Mulher. Quando eles chegaram, um comício defendendo o direito reprodutivo das mulheres, os direitos econômicos e culturais, bem como a consciência em relação à violência contra a mulher já estava em andamento. No interior, Penha pegou o microfone para falar à multidão reunida, de mais de 500 pessoas. Muitos dos ativistas já sabiam sobre o transtorno que Penha tinha passado no dia, e suas palavras foram acompanhadas com gritos de “Somos todos Dona Penha. Somos todos companheiros. Somos todos Vila Autódromo”.
A luta de Penha foi igualmente reconhecida dentro dos corredores da ALERJ. A Deputada Enfermeira Rejane abriu o evento destacando Penha entre as dez mulheres que estavam sendo homenageadas e fazendo um chamado à administração de Eduardo Paes por suas ações: “Não é só uma casa; é a falta de diálogo “.
Desde 2004, a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia do Estado do Rio de Janeiro homenageia mulheres do Estado que lutam para o avanço dos direitos humanos e das mulheres com o Diploma Mulher Cidadã Leolinda de Figueiredo Daltro. Com sua família e dezenas de adeptos presentes, Maria da Penha e sua luta pelos direitos das comunidades e da habitação em face aos Jogos Olímpicos era uma favorita da multidão, que protestou quando a deputada Rejane agradeceu ao Prefeito Eduardo Paes por seu papel na cerimônia. Ao receber o prêmio, Penha dedicou a seus apoiadores e aos moradores da Vila Autódromo, que lhe dão a força e amor que ela precisa para continuar na luta pela Vila Autódromo.
Rede de Mães Contra a Violência do Estado: Uma Entrevista com Mônica Cunha
O Relatório Anual Estado dos Direitos Humanos no Mundo lançado pela Anistia Internacional no mês passado descreve a impunidade contínua no Brasil quanto à violência policial e o aumento no nível de violência policial, de moda geral, especificamente no estado do Rio de Janeiro. Ano passado, mais de 3.000 pessoas em todo o país foram mortas por policiais em serviço, representando um aumento de 37% em relação a 2013, de acordo com a Anistia Internacional.
Mônica Cunha perdeu seu filho, Rafael da Silva Cunha, dez anos atrás devido a violência policial quando ele tinha vinte anos. Desde o momento que Rafael entrou no sistema de medidas sócio educativas–DEGASE—quando ele tinha quinze anos, Mônica tem sido ativa na luta pela reforma deste sistema e em apoiar outras mães com filhos nesta situação. Sentamos com Mônica na sede da Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência para conversar sobre sua vida, seu caminho na militância, sua liderança, o movimento pela reforma do sistema penal e as alegrias e os desafios de ser mulher no Brasil.
Durante a entrevista, Mônica aconselhou um membro da Rede num caso de violência doméstica, recebeu uma ligação sobre o nascimento de um bebê–em suas palavras “mais uma mulher negra guerreira para a luta”–e parabenizou uma técnica trabalhando no internet por ser uma mulher num campo dominado por homens. Confira a entrevista exclusiva do RioOnWatch com Mônica para o Dia Internacional da Mulher.
RioOnWatch: Onde você nasceu?Mônica: Eu nasci aqui no Rio, eu nasci em Botafogo. Eu brinco com minhas amigas que eu sou uma menina da Zona Sul, mas eu já completei 51 anos e eu fui morar lá na Baixada, na Zona Norte, enfim, na Zona Sul só nasci e fiquei só até os 15 anos.
RioOnWatch: O que é a Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência?Mônica: Esse espaço ele é constituído por mães e familiares que têm seus entes queridos assassinados pelo Estado. A Rede nasceu a partir de uma chacina há 12 anos, no Morro do Borel. A primeira mobilização recebeu o o nome de “Posso Me Identificar”. Foi uma chacina na qual foram assassinados cinco jovens que não tiveram nem condições de se identificar. [Os policiais] taxaram no peito destes homens que eles eram bandidos, que eles eram traficantes e os mataram. E não eram. Eram só jovens, moradores do Borel que foram assassinados por policiais. Todas essas pessoas, familiares e amigos de vítimas de chacina, se sentiram sensibilizadas e revoltadas por estarem morrendo, a toda hora, pessoas nas suas favelas e resolveram se juntar.
A Rede tem esse espaço, que é um espaço longe de comunidade, longe da favela, longe de lugares que sejam perigosos. É um lugar neutro. Porque a gente aqui não tem separação por facção, não existe isso de que “só vou receber a vítima de tal lugar”. Não! Aqui tem vítima de todo o Estado de Rio de Janeiro. Você sofreu alguma violação pelo Estado morando dentro do Estado de Rio de Janeiro, você pertence a Rede Contra a Violência.
E a ideia da rede também é de ser parceiro de núcleos que estão nascendo dentro das favelas que estão dando apoio dentro da favela aos familiares dos que são assassinados. A partir do momento que eles acolhem, eles entram em contato conosco e a gente entra numa parceria, tratamos de fazer esse encaminhamento juntos. Então isso é muito bacana, sair um pouco aqui da centralização. A Rede não tem que ser uma centralidade. Ela é, mas tem que fazer aquela coisa ampla: tem que ensinar a própria favela como lidar com suas vítimas, e isso a Rede vem fazendo. Então isso também é uma expectativa para 2016 e 2017, porque hoje tem alguns núcleos, já tem em Manguinhos, Cantagalo, Alemão, Pavão-Pavãozinho, Borel, Jacarezinho, mas a gente quer dar continuidade a outros.
RioOnWatch: De quais outras formas a Rede presta socorro às famílias?Monica: As vezes, precisamos acolher alguém de imediato que está sofrendo alguma violação, alguma perseguição, que está sendo ameaçado. Então a gente acolhe aqui por um, dois dias. Para conseguir outro lugar para essa pessoa ir. Então, é uma coisa imediata… a gente pega mais as ameaças por parte da polícia, isso é real, porque as vezes a pessoa que foi vitimizada, quer realmente falar, quer realmente mostrar, quer apontar quem foi e acaba se prejudicando. E muitas vezes nem passou a vitimização na própria pele, mas viu um vizinho, viu uma outra pessoa e está cansada de ver aquilo, então agora tem que falar. E acontece que ela está arriscando a própria vida. Por que o Estado que te mata vai te proteger? Qual segurança você tem? O Estado já teve um programa de proteção. Só que hoje em dia, é um fracasso. A gente não pode confiar mesmo.
RioOnWatch: Por que você está na Rede? Por que está na luta?Mônica: Eu faço parte do nascimento da Rede. Mas não porque na época eu tinha um ente querido assassinado. Eu sou mãe de três filhos homens, com muito orgulho. E fui mãe com muito orgulho do Rafael da Silva Cunha, que aos 15 anos, se tornou um adolescente autor de ato infracional. E assim começa minha militância.
Mas nessa época, eu tinha uma vida diferenciada desses familiares dos adolescentes autores de ato infracional. Eu era considerada classe média, meus filhos estudavam em colégio particular. Eu tinha uma estrutura financeira razoável, então achava que isso não ia acontecer nunca comigo, que não me pertencia.
Só que a gente também sabe que tem uma parte dessa sociedade que tem a vulnerabilidade de se tornar autor de ato infracional com mais facilidade, pela dificuldade da vida. Por mais que eu esteja falando dessa estrutura que eu tinha, eu era uma mãe solteira. Eu que levava o sustento para os meus filhos, então eu tinha que sair todos os dias. Esse país é um pais machista e ainda sofremos preconceito com isso, então comigo não foi diferente. Como eu tive que ser mãe solteira no sentido de sair para trabalhar para sustentar-lhes, eles ficaram sozinhos. E como eles não eram mais crianças, eram adolescentes, tiveram que se moldar sozinhos.
Então eu tive esse dissabor de ter um filho dentro do sistema DEGASE (Departamento Geral de Ações Socioeducativas), que me levou a conhecer uma realidade que eu não conhecia. De fato eu não sabia que existia. Porque é muito fácil quando você só vê na televisão ou lê jornal.
Então comecei a entender tudo que hoje eu entendo mais um pouco: Quais eram as razões que levavam esses adolescentes a serem autores de atos infracionais? São diversas razões. É o desamor, sim. Porque a mulher que trabalha muito que tem tudo nas suas costas. Porque a mulher tem que ter múltiplas funções, então essas múltiplas funções não lhe dá o direito de ficar livre 24 horas lambendo sua cria, olhando sua cria, como deveríamos. Porque não temos essas oportunidades, temos que lutar nesse país capitalista a todo momento. Tudo tem um preço, tudo tem um valor, você vale quanto pesa, então você acaba prejudicando a quem mais ama: nossa família, nossos filhos, que a gente teve por amor. Isso aconteceu comigo.
RioOnWatch: Como foi o seu processo de entrar na militância?Mônica: Eu tive que entender esse processo na minha vida, tive que conhecer o Estatuto da Criança e de Adolescente, tive que saber que o adolescente mesmo ele sendo autor de ato infracional, ele tem direitos. E não era um bandido como as pessoas me falaram. Ele não era um monstro, ele não era um bicho. Eu não pari um bicho, eu não pari um monstro, eu pari um ser humano. Eu pari uma criança, que veio com muito amor, muito carinho. Eu dei muito amor, eu fiz tudo como qualquer outra mulher faz.
Então a partir daí, com esse meu interesse, com esse meu empenho, eu fui entrando na militância. Não era minha intenção. A minha intenção era tirar meu filho da situação de ser um autor de ato infracional. Era livrar meu filho daquele sistema. Essa era minha intenção, mas acabei que eu fui me abrindo. A gente sempre é uma liderança porque quem manda em casa é a mulher. Essa era minha liderança dentro de minhas quatro paredes ali na minha vidinha. Não nasci uma mulher liderança de movimento, não nasci uma mulher que inspira outras no sentido de ir à luta pelos seus direitos. Só depois essa mulher nasceu, o que me deixou orgulhosa.
RioOnWatch: Quais foram as primeiras coisas que você percebeu visitando a unidade DEGASE?Mônica: Eu vi nas filas que existiam três coisas que me chamaram a atenção. A primeira era a cor, todas eram negras igual a mim. Então, logo eu percebi, que mulheres negras são as que mais sofrem e são os filhos dessas mulheres negras que ficavam encarcerados. A segunda é que eram mulheres que tinham baixa escolaridade, tinham até sabedoria de vida porque todas trabalhavam, mas tinham baixa escolaridade, elas não sabiam ler. Eu tinha escolaridade um pouco mais alta, naquela época eu só tinha o ensino fundamental. Hoje, eu completei ensino médio e tenho o técnico.
Então numa pedra eu comecei ler o Estatuto para as outras mães. Porque um agente me deu o Estatuto e disse que ali estariam as respostas para minhas perguntas. Aí eu comecei a ler sozinha e realmente percebi a necessidade delas também saberem. Eu perguntava: ‘Só eu tenho que saber? Meu filho não está ai sozinho!’ As outras também têm que saber. Eu ia para essa pedra, pedia para elas chegarem cedo, todas com nossas coisas que levávamos para nossos filhos: refrigerante, biscoito, almoço e tal. Colocávamos nossas bolsas no chão, e ficávamos em pé. Eu ficava em pé na pedra e lia o Estatuto, só no que diz ao respeito ao autor de ato infracional.
Enfim, e a outra coisa que eu percebi, pai naquele momento não existia. Tinha uma fila de 40 a 50 mães, tias, avós, e tinha dois ou três pais. Então cadê esses homens? A presença deles faz diferença. E eles não estão nessa hora, eles se escondem, eles são covardes. Não só o Estado nos viola, nos humilha, nos oprime, mas também os homens que são pais dos filhos, é raro que eles estejam com a gente, é raro que eles sejam parceiros, que de fato sejam pais, amigos, companheiros. Então veio todo esse processo.
RioOnWatch: E como é que ler o Estatuto para as outras mães se transformou no Movimento Moleque?Mônica:
O Estatuto fala no artigo 227 que todo ser humano, todo adolescente, toda criança, tem direitos, a ter moradia digna, a ter escolaridade, a ter convivência com a família. Por mais que ele tenha cometido algum ato infracional, ele não pode ser tratado igual a um bandido, ele não cumpre pena, e as medidas socioeducativas são para ressocializar esse adolescente para sociedade. Então a partir dali houve um divisor de águas, não só para mim, mas para elas. A gente entendeu o que tinha nos acontecido e a partir desses artigos do Estatuto, a gente começou a se questionar: Por que? Por que quando um morador de favela é esculachado pela polícia, não é uma coisa sem querer. Por que isso não acontece no Leblon? Isso tem um porquê. Então é esse porquê que você tem que buscar.
O Estado tira nossos filhos, o Estado tira nosso dinheiro, o Estado nos oprime, mas ele não tira nosso conhecimento. Ele só tira quando nos mata. E o saber que nós temos quando se une com o saber universitário se torna muito mais forte, mesmo quando as mães e os familiares não têm o saber universitário. O saber das mães é muito forte, porque ela carrega no seu corpo, na sua alma, na sua pele, a dor de ser violentada. Então o que essa mulher tem para falar e tem para mostrar, é muito rico, porque é ela que faz a diferença. Então assim nasceu o Movimento Moleque, que não tem seu próprio espaço e é um dos movimentos que a Rede acolhe.
RioOnWatch:E qual é sua perspectiva sobre DEGASE?Mônica: O DEGASE deveria ser uma unidade ressocializadora. Acho que não é, que pelo contrário, ele prepara aquele adolescente para virar, não é nem um bandido, mas um autor de ato infracional. Não é bandido, não, que bandidos estão em Brasília. Bandido tá lá, de colarinho branco, gravata… aquele é bandido. Não, as unidades DEGASE, elas preparam o adolescente para vir a ser assassinado. E que hoje a coisa está tão ruim, que os meninos nem estão tendo que entrar na unidade DEGASE porque estão morrendo antes.
Não é para tornar-se bandido, não tem como tornar-se bandido, [estes meninos] não são donos do tráfico. Não são eles que pegam as drogas em casa, não são eles que vão pegar as armas de tráfico, não são. Esses meninos, eles mal conhecem a favela em que moram. Eles nem saiem para ir no shopping perto da casa deles. Como é que eles vão lá no Paraguai, na Colômbia pegar armas, pegar drogas. Não são os bandidos que a sociedade acha e pensa.
RioOnWatch: E onde foi criado o Rafael? Como ele era? O que ele gostava de fazer?Monica: Rafael foi criado na Zona Norte, ali no Riachuelo.
Olha, o Rafael era lindo, era um sarará de olho verde, lindíssimo. Adorava viver. Nós tínhamos uma coisa em comum, nos éramos do signo de virgem. E é uma característica de virgem gostar de viver. Isso meu filho tinha, era mulherengo demais, mas na medida possível era respeitador. Realmente. Ele não acreditava que adolescentes poderiam ser ressocializados, porque quando ele passou naquele sistema ele viu o absurdo que era. Ele dizia para mim: “Mãe ninguém sai dali, ninguém consegue sair dali, para trabalhar, para uma vida normal”. Enfim, era carinhoso, dia das mães eu lembro, ele puxava o bonde para de manhã me dizer feliz dia das mães, chegava correndo com uma coisa que tinha feito na escola, correndo com presentinho ali na frente, queria ser o primeiro a entregar o presente. Enfim, era meu parceiro, era meu amigo sabe? Foi a primeira pessoa com quem eu fui a um baile funk. Não que os outros não sejam, mas ele era mais.
RioOnWatch: Como é que ele morreu? Como aconteceu?Mônica:
Meu filho foi assassinado no dia 5 de dezembro de 2006. De joelho, no bairro do Riachuelo, que tem duas favelas, Rato Molhado e Jacaré. Ele foi assassinado ali entre uma favela e a outra. De joelho no meio da rua por policiais civis. Não foi uma troca de tiro, porque eles até tentaram colocar isso no boletim como “auto de resistência”, mas não foi auto de resistência, foi execução sumária mesmo, porque é execução sumária quando uma pessoa está de joelho e tem uma pessoa por cima de outra com a arma. Ele se chamava Rafael da Silva Cunha e ele tinha na época 20 anos. Ele se tornou autor de ato infracional com 15 e foi assassinado com 20. Ele durou cinco anos nessa vida.
RioOnWatch: Quais foram os impactos da morte do Rafael na sua vida?Mônica: Na época, foi um baque muito grande para todos nós. Mas imagine para mim que já estava nesse movimento, e que tinha quase certeza que meu filho serviria de lição para os outros. Então, quando ele foi assassinado, eu fiquei perdida no tempo e não tomei as providências que hoje eu faço questão, que eu aconselho, oriento, para que todas as mães tomem, que é adquirir a justiça. Eu não fiz isso no meu caso, não por fraqueza, não por medo, não por covardia, e sim por ter ficado muito abalada, muito muito muito. Me isolei, por mais que eu já pertencesse a um movimento, mas eu fiz questão de me isolar mesmo, de não deixar ninguém se aproximar de mim. Entrei numa depressão profundíssima. Tinha um caçula, que hoje tem 22 anos, mas na época tinha 12. Então, tentei suprir ele como um meio para esquecer e os anos foram passando.
Além da dor ser profunda–‘ah não é uma dor física’, é uma dor física sim, vou te dizer que é–dor na minha alma, dor nos meus ossos, dor na minha cabeça–eu adquiri doenças reais. Eu digo que o Estado colocou um kit de depressão, síndrome de pânico, câncer, enfim. Foi um kit.
RioOnWatch: Qual foi o impacto na sua família e na sua comunidade?Mônica: Ah, muito grande. Muito grande. O impacto é desesperador. Para todos. Eu namorava com o pai dele, mas na época… enfim, você fica querendo buscar culpados. Não só o Estado, mas aquele primeiro momento você fica querendo buscar culpados também entre os seus e si mesma. Você se sente culpada porque você não estava naquela hora, você não estava ali para pegar a mão da polícia e tirar a arma dele. Você sente culpada porque não morava com o pai, enfim… Ele também podia fazer uma coisa se estivesse do meu lado.
Então é tanta culpabilização que você coloca em si. Por eu na época ter mãe, pai, tio, eu culpei todo mundo que não me ajudou. Porque eu fiquei muito sozinha para tentar tirar ele dos atos infracionais. Então quando ele foi assassinado eu fiquei meio revoltada com o mundo. E foi onde me recusei a buscar apoio naquele momento e foi quando eu adquiri as doenças. Não é que você não adquire doenças quando você tem apoio, porque a dor é muito profunda, mas eu adquiri de um modo mais forte ainda.
RioOnWatch: E como é que você conseguiu continuar na luta apesar dessa dor toda?Mônica: Eu tive que fazer dessa luta uma luta de verdade porque você olha para você mesma e olha para um filho pequeno e vê que ele necessita de você. E também porque o celular já existia, e tinha as mães me ligando, dizendo que precisavam de mim, precisavam da minha força. Então, foi isso que foi me tirando do buraco. Eu fui adquirindo força para estar de novo na luta. E fui, meio capenga porque inteira não vou ser nunca. Mas eu digo que felicidade assim nós não temos. Temos momentos felizes. Mas temos que sobreviver, porque depois que você perde um filho, você sobrevive, todo dia vai ser um dia.
Eu sou mãe de mais dois filhos, tenho seis netos. Meu neto mais velho está com 15 anos, minha caçulinha, Valentina, tem 2 meses. Têm todas essas pessoas que eu amo muito, que eu quero ver crescer, que eu quero ver casar, nas quais eu quero acreditar. E eu preciso acreditar que a minha família pode seguir num fluxo normal. Que eu tenho meus filhos, para casarem, crescerem, ter sua maturidade e sair da casa da mamãe, construirem suas famílias, enfim, o ciclo normal da vida. Não quero acreditar que aquilo que me aconteceu, que ter um filho assassinado, que morreu antes de mim, seja normal. Isso não é normal, o normal não é isso.
Para ir até aqui hoje, eu preciso desse povo. Eu preciso estar aqui, eu preciso estar junta delas. Que hoje já não é mais uma coisa só porque eu admiro, não. É porque eu necessito. Eu não sei fazer outra coisa, e eu não sei viver sem estar junto desse movimento. Esse movimento me acolhe, esse movimento me mantém viva. Com esse movimento, cada vez mais eu aprendo, e cada vez mais eu posso repassar. É o movimento que nos sustenta para nos manter de pé. Porque todos nós temos outros filhos, todos nós temos famílias. Nós somos esposas, somos amantes, somos mulheres, algumas têm formação superior, somos trabalhadeira, somos avós, somos tias. Como é que continua a vida? Só essa união nos faz continuar.
RioOnWatch: O que você acha que é diferente na experiência da mulher no ativismo? Quais são os desafios, os benefícios?Mônica: Nós acreditamos que a mulher, ela pode mudar sua história–ela pode mudar. Como isso tem que acontecer? É trazendo esse conhecimento, é tirando aquela mulher de dentro da sua casa e mostrar que ela tem como se empoderar, mostrar para ela um Estatuto, mostrar a Constituição, mostrar para ela todos esses orgãos que existem, mostrar para ela que ela tem que cobrar, mostrar para ela que o público somos nós. O público não é uma coisa abstrata, o público somos nós! Que esse dinheiro público é tirado de nossos bolsos. Então essa mulher ela faz a diferença, com seu filho, com seu marido. Ela tem que buscar. A meta principal do Moleque e a Rede é essa.
É colocar essa mulher, ela mesmo, na frente da batalha. A mulher empoderada grita pelos seus direitos, pelos seus filhos, pelo seu marido. Quando o marido está preso, quem visita é a mulher. Quando o filho está preso, quem visita é a mulher. Quando seu filho morre, a primeira a chegar no cemitério é a mulher. Então essa mulher briga pelos seus direitos, pelo seu ser.
E a vontade é poder nascer de novo para o conhecimento. Porque quando essa mulher começa a conhecer os seus direitos, a conhecer os seus caminhos, essa mulher muda. E ela não só faz, ela reúne multidões de outras mulheres, sua filha, sua prima. Faz um café, faz um lanche, e já vai repassando o que ela aprendeu. Então é essa experiência de troca que temos. Eu acho fabuloso, eu acho muito rico. A mulher nunca quer ficar com um conhecimento que aprende só para ela, a mulher ela faz questão de repassar pro outro. E sem conhecer, sem ter vínculo! Ela está no ponto do ônibus e vê você chorando, já vai!
RioOnWatch: E os desafios?Monica: Olha, o desafio é ser mulher nesse país de hoje. De sempre, de hoje não, de sempre. Hoje, tá um pouco melhor. Está um pouco melhor porque temos acesso ao conhecimento. Antes, não tínhamos, antes éramos totalmente boicotadas, pelo pai, pelo avô, depois pelo marido, e até mesmo pelo filho quando ele virava homem. E hoje não, hoje nós vamos mesmo. Pode ter boicote, mas a gente vai. A gente se reúne, a mulher faz panelaço, mas assim é difícil ser mãe, muito difícil. E principalmente ser mulher negra, aí é mais difícil. Porque a mulher negra ainda traz, na cor do seu corpo, a discriminação racial, porque ter no seu corpo a cor negra ainda é um desafio muito maior. Você tem que todo dia provar que você é mulher negra, mas é trabalhadeira, têm direitos, e tem direito de viver, de parir. Tem direito de criar seus filhos, tem direito de trabalhar e ganhar também um salário digno, tem direito de entrar para a política. Então o desafio ainda é muito maior sendo mulher negra.
RioOnWatch: O que você passaria como recado mais importante para um jovem frustrado com o estado das coisas ou interessado em se engajar com questões sociais?Mônica:
Então eu acho que esse adolescente, esse jovem, ele tem que entender. Que lugar é esse? Que cidade é essa? Que uns podem, outro não? Porque que o prefeito do Rio, ou o governador do estado do Rio de Janeiro, proibiu que jovens, crianças e adolescentes que moram em favelas ou baixadas ou na Zona Norte do Rio de Janeiro, frequentem as praias da Zona Sul? Por que será? Por que que o prefeito manda fazer poças, não praia, poças, lá em Madureira, lá em Ramos, porque ele é bonzinho, que quer que nos divertirmos? Não, porque eles querem fazer o apartheid.
Então quando esses jovens tiverem consciência que eles são seres humanos, que eles têm direito, que a cidade, o Estado é deles, aí a coisa muda. Então quando os seres humanos, principalmente as mulheres, estiverem mais empoderadas, se colocarem mais, para tentar de uma vez por todas acabar com essa separação, você pode ter certeza, que tomaremos de fato o poder. Mas com consciência, não para tomar o poder por tomar, e sim com consciência.
RioOnWatch: De que forma você gostaria de ver a presença da polícia na comunidade, seu ideal de segurança pública?Monica: Primeiro, tirando a polícia. Essa polícia não é de segurança pública, nem aqui nem na China. Pelo amor de Deus. Para quê polícia na comunidade? Quando nasceu essa UPP, os planos que foram traçados no nascimento da UPP, foram muito bonitos. Mas na prática, isso virou um horror. Que essa UPP nada mais é que uma polícia assassina. Então não pode existir uma UPP dentro de colégio dentro da favela para poder botar medo nos meninos e meninas estudantes.
Claro que vai ficar muito difícil não existir policial dentro do Rio, dentro do Brasil. Eu acho que isso é até uma utopia… mas, que não exista dessa forma, essa forma não funciona. Essa forma só mata, ela só mutila, ela só arrasa, ela só destrói. Dessa forma não pode existir. E só tem um grupo dentro dessa sociedade que é prejudicado—pobre, negro, e favelado. Então isso é só para nós. Então vamos começar experimentar a polícia como ela é para todos. Porque quando começar atingir eles da mesma forma como nos atinge, eu tenho certeza que eles vão querer que seja diferente.
RioOnWatch: Gostaria de acrescentar mais alguma coisa?Mônica: Isso não é normal. O Estado não pode matar na forma que ele está matando. O Estado não pode nos punir da forma que ele nos pune. Porque esse recorte que o Estado faz, quando a gente vê esses assassinatos percebemos que é muito grave e você tem certeza que você vive dentro de um Estado que é racista, que é genocida. Isso não quero para mim, não quero para meus netos, meus bisnetos. Eu quero uma mudança. Não vou dizer para você que eu quero uma utopia, que eu quero tudo rosa, tudo azul, nada disso. Mas eu quero um país justo, um país digno. [Rafael] era um ser humano igual a qualquer pessoa. No fim ele se tornou autor de ato infracional sim, mas nem por isso eu preciso ficar isolada, nem por isso eu tenho que estar perdida, nem por isso eu tenho que conviver com os meus dias como se fosse o fim do mundo, como se eu fosse uma aberração. Não, claro que não. Então nisso eu acredito e nisso eu trabalho.
E que nesse dia 08 de março de 2016, que a mulherada, independente da cor e de onde mora, de fato se une. Que não permitam que as suas crianças e os seus jovens sejam assassinados da forma que está acontecendo. Que de fato todas as mulheres tomassem para si, enquanto pertencimento, cada criança e cada jovem que morresse nesse Estado e sentissem como se fosse um dos seus. Um que você tivesse parido. Que aí sim a gente vai fazer a diferença, não olhando um menino desse na rua como um filho da outra, e sim como se fosse seu próprio filho. Quando a gente pega para si, a gente quer mudar. Quando a gente fala, ‘olha ele é do outro’ a gente não dá importância. É isso.
Aqui É Meu Lugar: Mulheres, Trabalho e Família na Baixada Fluminense [VÍDEO]
O curta-metragem Aqui É Meu Lugar começa com um estribilho muito comum: existem dois Rios de Janeiro. Existe o Rio “das praias, do samba, do carnaval e das mulheres bonitas”, e o Rio “menos deslumbrante” das favelas e dos subúrbios, que muitas vezes são estigmatizados como pobres, criminosos e violentos. No entanto, conforme as mulheres no filme cuidam de suas crianças, preparam seus quitutes para vender e cantam suas alegrias e tristezas, fica claro que a história delas não é a história de uma cidade dividida, mas sim uma de um Rio onde você nunca pode ter certeza que terá água corrente, onde suas crianças vão à escola só quatro horas por dia, onde você tem que chegar cedo na prisão para entrar para a lista de visitas do dia e poder ver seu filho. Para se adaptar a essa cidade, mulheres se unem para trocar idéias e habilidades que ajudam a fazer dinheiro para sustentar suas famílias.
O documentário de 25 minutos da cineasta americana Sarah Garrahan oferece um breve olhar sobre as vidas de cinco mulheres que vivem no Complexo da Mangueirinha, uma favela em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.
Clientelismo, serviços públicos e infraestrutura de baixa qualidade, violência e um atraso percebido como um aspecto mais rural, caracterizam a Baixada aos olhos daqueles oriundos da cidade do Rio. Estas mulheres vivem na periferia da periferia, ou como Vitória explica: “Nós vivemos em uma zona de guerra porque cada dia que uma mãe sai de casa para levar suas crianças à escola, ela parte com uma dor no coração. Ela não sabe se acontecerão tiroteios, se traficantes invadirão sua casa ou se policiais vão abusar do poder que têm”.
Jaidete narra como ela costumava procurar comida para ela e sua família no Aterro do Jardim Gramacho. Adriana conta sobre as discrepâncias do sistema de justiça que trata políticos corruptos como hóspedes de hotel enquanto os pequenos ladrões são punidos com toda a força da lei. Viviane questiona os confins do seu papel de mulher dentro do sexismo brasileiro. Jane Cler lamenta as dificuldades que as mães enfrentam tentando balancear trabalho e família em comunidades com poucos serviços. Vitória explica o racismo que ameaça a vida de jovens negros no Brasil.
“Eu sou uma mulher simples, uma guerreira. Eu só quero mostrar a verdade. Eu não quero esconder nada ou julgar ninguém. Eu só quero mostrar a verdade”, afirma Vitória no início do filme.
Porque elas sabem que são estigmatizadas e marginalizadas por uma cidade onde “muitos estão acima de você e não te deixam avançar”, as mulheres têm orgulho do espírito coletivo presente na favela. Como Adriana conta, “Eu não penso em ficar rica, em ter muito dinheiro. Porque quando você vive em comunidade e você é pobre, você quer partilhar”. No começo do filme, Jaidete concorda: “Se eu tivesse que escolher entre a favela e o Rio, eu preferiria a favela porque você se sente mais bem-vindo”.
O título do filme “Aqui É Meu Lugar” enfatiza esse sentimento de se sentir bem-vindo e vem da música do Roberto Carlos, “O Portão“, que Jane Cler canta enquanto prepara uma refeição com outras mulheres.
Os coletivos de cozinha e de troca de capacidades do qual as mulheres fazem parte é apoiado pelo Programa Raízes Locais, um projeto de base comunitária gerido pela Associação Brasileira Terra dos Homens (ABTH).
A ABTH, uma ONG de defesa à crianças e famílias, opera na Mangueirinha desde 2007 depois que um estudo revelou que um grande número das crianças de rua no Rio vêm da comunidade. O Programa Raízes Locais oferece aulas de teatro e capoeira, assistência às mulheres grávidas e recentemente começou a apoiar a formação da cooperativa de panificação Mangarfo (uma combinação de Mangueirinha e garfo). A cineasta Sarah Garrahan trabalhou no Programa Raízes Locais em 2015 depois de terminar seu mestrado em Artes Experimentais e Documentais e após ser concedida uma bolsa Felsman que foca em crianças em situações de adversidade através da Duke University.
De acordo com Jane Cler, seu negócio de panificação lhe permitiu ter tempo para ganhar uma vida ao mesmo tempo que toma conta da sua família: “Como sabemos, nós vivemos numa comunidade e não é sempre fácil criar crianças. Então quando eu saía para trabalhar, eu estava longe da minha família e da vida de casa. Por isso preferi começar meu próprio negócio, para poder dividir trabalho, casa e família”.
Viviane realça a importância de trabalhar de forma coletiva: “Não sou dessas de não ensinar os outros porque quero fazer mais dinheiro. Se a pessoa precisa, eu ensino. É sempre uma troca. Você ensina e você aprende”.
O filme conta com comentários de Luciano e Beth do Programa Raízes Locais, no entanto Sarah apresenta as mulheres como as especialistas, enquanto elas partilham as suas experiências com racismo, sexismo e a estigmatização da favela.
Adriana articula de forma clara tanto as vantagens que as mulheres enfrentam quanto as suas próprias capacidades de superar dificuldades: “Já somos discriminadas por sermos pobres, por sermos negras. Mas se permitirmos que isso domine nossas vidas, não andaremos para frente”.
O filme é um convite raro para entrar nas vidas das mulheres nas favelas das periferias mais distantes do Rio. Mas se quiser conhecê-las melhor ainda, Jane Cler faz uma proposta: “[As pessoas] pensam que não temos vida, mas eu gostaria de convidar todo mundo para vir e conhecer-nos melhor, nosso mundo, vai ser muito divertido. Todo mundo que vem aqui adora o lugar. Aí eles olham com uma perspectiva diferente… Nós temos pessoas aqui que trabalham muito duro, guerreiros que levantam cedo, que saem a procura de comida para suas famílias. Mulheres guerreiras que trabalham para sustentar suas famílias, que tomam conta do trabalho, da casa, dos filhos, do marido e dos netos”.
Assiste o filme aqui:Celebrando as Mulheres Guerreiras da Vila Autódromo
Hoje, dia 8 de março, em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, celebramos algumas das mulheres guerreiras da Vila Autódromo que vêm batalhando contra a Prefeitura há mais de cinco anos para salvar suas terras, sua comunidade, suas casas e suas famílias da remoção vinculada às obras de construção para os Jogos Olímpicos Rio 2016.
Essas mulheres desprenderam-se do rótulo de dona de casa e entraram na linha de frente de uma batalha como guerreiras que encaram o que muitas vezes parece ser uma guerra interminável.
Com a participação em atividades comunitárias, como a produção e atualização do Plano Popular da Vila Autódromo, o premiado projeto de urbanização que demonstra que a comunidade pode viver junta dos Jogos Olímpicos, um café da manhã comunitário realizado para buscar maior reconhecimento da sua luta e festivais culturais convidando apoiadores para celebrar sua resistência, as mulheres da Vila Autódromo mostram exemplos individuais e únicos de liderança.
Jane Nascimento“Casa não se constrói com dinheiro, se constrói com amor.”
Jane Nascimento tem sido por anos uma importante porta-voz e líder para a comunidade, dialogando além de eventos comunitários, ao lado de movimentos sociais por toda a cidade. Em maio de 2015 ela deu seu depoimento perante a Comissão de Direitos Humanos da ALERJ.
Em agosto de 2015, após uma batalha de dez anos com a Prefeitura, Jane, uma mãe, trabalhadora e líder comunitária, foi forçada a deixar sua casa na Vila Autódromo declarando: “Sairei da minha casa, mas não da luta”.
A relutante partida de Jane deveu-se à uma série de condições dolorosas. Ela sofreu durante o violento processo de remoção e encarou pressões psicológicas, vivendo em escombros e entre as casas derrubadas de seus vizinhos. Finalmente, sua casa, entre outras, foi o alvo do decreto de desapropriação da Prefeitura deixando Jane sem opção.
Entretanto, sua remoção física da comunidade não enfraqueceu sua luta. Desde seu reassentamento, Jane continua sendo uma voz ativa da resistência da Vila Autódromo. Ela participa em reuniões comunitárias, em protestos e tem sido a representante da comunidade em vários painéis de discussão sobre o Rio Olímpico e sobre o direito à moradia, inclusive no Museu da República em outubro de 2015 e na Fundação Getúlio Vargas em novembro de 2015.
O compromisso inabalável de Jane para com a resistência da sua comunidade é expressado toda vez que ela assume o microfone. Ela reafirmou esse compromisso mais uma vez no dia 24 de fevereiro quando a Associação de Moradores foi demolida: “Vou continuar lutando. A minha casa caiu, mas a minha luta não caiu”.
Heloisa Helena Costa Berto – Luizinha de NañaHeloisa Helena, conhecida também pelo seu nome de candomblé Luizinha de Naña, morou na Vila Autódromo por 36 anos. Construída às margens da Lagoa de Jacarepaguá, sua casa também era um centro espírita candomblecista. Na sua emocionante carta aberta publicada pelo RioOnWatch em setembro de 2015 ela conta que “a construção física de um candomblé é difícil, principalmente com várias coisas em jogo, como por exemplo, ter que ao mesmo tempo, ajudar às pessoas necessitadas de trabalhos espirituais e de bens materiais básicos.”
Heloisa lutou pela negociação e reassentamento da sua casa e do centro espírita, sofrendo ao mesmo tempo com a intensificação de sua condições de saúde: “Há dois anos eu não vivo, eu só luto, meu corpo está todo tomado por dores crônicas consequência da cirurgia, dos oito parafusos, das placas, falta de tratamento por falta de tempo e stress emocional”. Mas ela explicou que essa nem é a pior parte. A sua saída da comunidade e do local religioso deixaram ela se sentindo “vazia por dentro, roubada, invadida, violentada”.
Heloisa visitou Brasília no ano passado para participar de uma audiência pública com a Comissão de Direitos Humanos do Senado. Em reconhecimento à sua luta, ela recebeu a medalha Pedro Ernesto, a honra mais importante concedida pela Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, assim como o prêmio Dandara entregue pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro.
Apesar de seus problemas de saúde e das crescentes pressões, Heloisa ainda luta e busca por justiça. Em sua segunda carta publicada pelo RioOnWatch no mês passado ela destacou o terror de receber ameaças de morte. Ela escreveu: “Mas como sempre minha comunidade me deu força para falar, então saio como um grito de liberdade. Falei para a comunidade que estava sendo ameaçada, eles me deram força, e eu voltei a lutar”.
A casa e o centro espírita de Heloisa foram demolidos pela Prefeitura no dia 24 de fevereiro. No dia 3 de março, Heloisa compartilhou em sua página do Facebook um vídeo e um texto que dizia:
“Demoliram a casa de Naña, mas Naña não cai. A parte física da casa de Naña foi demolida. Estamos todos traumatizados com o momento, com o profundo desrespeito que demostraram pela minha classe social e pela minha religião, ouvi com sofrimento. Que minha casa era um lixo. Que o assentamento de Naña iria para o lixo. Mas eu estou aqui e não sairei até ter o pedaço de terra de Naña. Luto por Vila Autódromo, nós somos fortes e nossa luta contínua. Nossa voz diz Urbaniza Já!”
Sandra MariaSandra Maria é a mãe de quatro filhos com idades entre 11 e 20 anos que se tornou uma voz ativa e uma das faces mais visíveis da resistência da Vila Autódromo nos últimos meses.
Em novembro passado, Sandra acolheu a Rede Carioca de Agricultura Urbana e os alunos da PUC na Vila Autódromo. Ela passeou com os grupos pela comunidade e explicou a eles sobre a atual batalha que a comunidade enfrenta. Ela refletiu sobre a comunidade onde seus quatro filhos cresceram, onde “todo mundo conhece todo mundo”, onde eles eram “livres” e “muito seguros”, onde eles têm a sua história de vida.
Sandra destacou: “A maior parte da comunidade são as mulheres. As mulheres pensam em tudo e em todos. O que vai acontecer e quais serão as soluções”.
Nos últimos meses Sandra Maria tem se fortalecido e se tornou mais uma voz para a comunidade, aparecendo em um artigo da revista TIME e no vídeo do Comitê Popular denunciando o ataque de Eduardo Paes contra seus dossiers.
Semana passada a Vila Autódromo compartilhou um vídeo em sua página do Facebook onde Sandra reflete sobre a tensão das recentes semanas na Vila Autódromo. Evidentemente cansada do estresse contínuo, ela recontou as recentes pressões psicológicas que sofreu por parte do governo e agradeceu a todos que apoiam a Vila Autódromo na sua luta.
Juntamente com os demais moradores e apoiadores, Sandra afirma que a Vila Autódromo continuará resistindo. Durante a recente demolição da Associação de Moradores ela disse:
“A história da Vila Autódromo não será tão facilmente removida… Quando estes prédios [de luxo] que o senhor Carlos Carvalho diz que vai fazer, começarem a ser construídos aqui, nós estaremos aqui. Essa imagem de hoje, todas essas imagens, que tem sido registradas aqui, espancamento de morador, tudo isso, ainda existirá”.
Maria de Penha“Eu não vou abandonar 22 anos de história por causa de 15 dias de Jogos Olímpicos.”
Embora sua pequena estrutura e a humilde personalidade possam não mostrar, Maria da Penha, mais conhecida como Penha, é uma das ativistas mais ousadas e corajosas da Vila Autódromo.
Em 8 de junho de 2015, a tropa de choque foi enviada à Vila Autódromo para remover os moradores numa chocante remoção relâmpago. A polícia usou balas de borracha, spray de pimenta e cassetetes durante um ataque físico aos moradores que deixou Penha com o nariz quebrado e seriamente ferida.
Nove meses desde a injúria, Penha luta mais forte do que nunca. Sua casa é uma das poucas casas que ainda permanecem na Vila Autódromo. A extrema ameaça das últimas duas semanas culminou na demolição da sua casa, esta manhã.
No dia 21 de fevereiro ela recebeu em sua casa uns 30 apoiadores que acamparam do lado de fora em preparação para uma demolição de manhã cedo. “Eu vou ficar em pé”, ela disse, prestando mais atenção às necessidades de seus visitantes do que as suas próprias. “Mesmo que a casa caia, vou ficar em pé”.
Penha, que viveu na comunidade por 23 anos, e cuja casa é extensão da igreja católica na comunidade, insiste que nenhuma quantia de dinheiro pode compensar sua casa, sua comunidade, suas memórias: “Sua casa não é apenas uma casa, é a história da sua vida”, ela afirma.
Nathalia SilvaNathalia, a filha de Maria da Penha, juntou-se recentemente a sua mãe na linha de frente da batalha de resistência da Vila Autódromo com sua atitute determinada e forte, seu discurso persuasivo, e representando uma nova geração de resistência dentro da Vila Autódromo e além.
Nathalia mantém uma visão positiva em relação às mudanças e à permanência na comunidade onde nasceu e cresceu: “O que a comunidade precisa… é de urbanização e infraestrutura básica”. Ela e suas companheiras guerreiras acreditam que o prefeito precisa manter sua palavra e urbanizar a comunidade com as 50 casas restantes. Ela imagina um centro cultural, uma clínica e um berçário na futura comunidade. “Isso irá ajudar não só a nossa comunidade, mas também as comunidades vizinhas–será para o benefício coletivo”.
As mulheres da Vila Autódromo não estão lutando apenas por elas mesmas, suas famílias ou sua comunidade. Elas também estão lutando por todas as comunidades ao redor do mundo que encaram opressão e remoção. Nathalia afirma:
“Eu já vi o quão semelhante é a nossa história ao que está acontecendo com outras comunidades… Mesmo em outros estados, em outros países. Há muitas histórias de pessoas que atravessam a mesma dor que estamos passando aqui… Nossa resistência leva-os a continuar a sua própria resistência.”
Anistia Lança Relatório Resumindo o Estado dos Direitos Humanos no Rio e no Mundo
O relatório anual da Anistia Internacional sobre o estado global dos direitos humanos apresentado no dia 24 de fevereiro aponta para o aumento no nível de violência policial contra civis. O relatório Estado dos Direito Humanos no Mundo documentou o estado dos direitos humanos em 160 países e territórios em 2015. A Anistia relatou que “sérias violações de direitos humanos continuaram sendo reportadas” e enfatizou a contínua impunidade no Brasil e os crescentes níveis de violência policial no geral, particularmente no estado do Rio de Janeiro.
O lançamento do relatório aconteceu na quarta-feira, dia 24 de fevereiro, no Casarão Ameno Resedá, no Catete, Zona Sul do Rio de Janeiro. O debate foi presidido pela jornalista Flávia Oliveira e contou com discursos de Atila Roque, Diretor Executivo da Anisita Internacional Brasil, do jornalista e cientista político Leonardo Sakamoto e da cineasta Yasmin Thayná.
Ano passado, mais de 3.000 pessoas em todo o país foram mortas por policiais em serviço, representando um aumento de 37% em relação a 2013, de acordo com a Anistia Internacional. Em particular, a Anistia disse que houve um “aumento significativo” no número de mortes causadas por policiais tanto no Rio de Janeiro como em São Paulo, mantendo-se a tendência que teve início em 2014. A maioria destes assassinatos não foram investigados. Das 220 investigações que foram abertas no Rio entre 2011 e 2015, somente uma resultou no indiciamento de um policial. O relatório descobriu que em abril de 2015 “183 dessas investigações continuavam abertas”.
Jovens negros moradores de favelas e periferias foram considerados o grupo que mais corre sérios riscos, inclusive de “assassinatos por policiais, tortura e outros maus-tratos”. A segurança pública está falhando com os jovens negros brasileiros e o relatório da Anistia anunciou que “o alto número de homicídios de jovens negros continua entre as maiores preocupações”, devido ao fato de que o governo não apresentou um plano nacional concreto que combata a taxa de homicídios do país.
O relatório também registrou que “relatos de que os agentes envolvidos tentavam alterar a cena do crime e criminalizar as vítimas eram frequentes” e que policiais “tentavam justificar as mortes como atos de legítima defesa, alegando que as vítimas teriam resistido à prisão”. Entre os exemplos citados estavam os casos de Cristian Andrade, um menino de 13 anos morto durante uma operação policial em Manguinhos enquanto jogava futebol, e dos cinco jovens metralhados dentro de um carro pela polícia em Costa Barros no final de novembro. O caso de Eduardo de Jesus Ferreira, de 10 anos, morto no Complexo do Alemão pela Polícia Militar que, em seguida, tentou remover seu corpo também foi citado.
O relatório da Anistia também enfatizou as remoções no Rio de Janeiro, que visam abrir espaço para as Olimpíadas, estimando que milhares de pessoas tenham sido removidas de suas casas, incluindo 600 famílias da Vila Autódromo. No final de 2015, a Anistia observou que os “moradores que ainda permaneciam no local estavam vivendo em meio aos escombros das demolições e sem acesso a serviços básicos como água e eletricidade”. O relatório também concluiu que o programa de moradia Minha Casa Minha Vida colocou famílias de baixa renda em risco, com a “maioria dos condomínios […] sob o controle de milícias ou de outras gangues criminosas organizadas“.
O ativismo e trabalho de defensores de direitos humanos também foi considerado sob ataque, com a polícia e as forças armadas usando medidas cada vez mais duras para dissuadir os manifestantes por todo o país. A Anistia reportou o uso de gás lacrimogêneo, balas de borracha e prisões, assim como a possível lei que poderia categorizar manifestantes pacíficos como “terroristas”. Ativistas no Rio de Janeiro enfrentaram medidas semelhantes, como foi o caso do protesto pacífico contra as remoções, que aconteceu em junho na Vila Autódromo e resultou em um nariz quebrado para a moradora Maria da Penha e lesões para outros quatro.
Durante o debate de lançamento no Rio, o diretor da Anistia Brasil, Atila Roque, avisou: “A democracia está sendo manipulada contra a democracia. Na ditadura, os atos institucionais legislavam contra as liberdades, mas, neste momento, vemos a Constituição ser manipulada para restringir direitos e marginalizar setores da sociedade. As políticas de segurança pública pautadas pela guerra às drogas e a indignação seletiva resultam em um alto número de mortes principalmente de jovens negros moradores de favelas e periferias”.
Favelas da Zona Sul se Unem Contra Privatização da CEDAE
Cerca de 100 pessoas se reuniram na base do Vidigal na quarta-feira, 17 de fevereiro, para expressar o seu descontentamento com a decisão iminente do estado de privatizar o gerenciamento da CEDAE na favela. Convocada pela Associação de Moradores da Vila Vidigal a reunião não só reuniu líderes do Vidigal, mas também líderes de um número de favelas da Zona Sul, como Santa Marta, Rocinha, e Tabajaras. Estes foram ao Vidigal através da União Comunitária, uma associação intercomunitária de líderes de mais de trinta favelas, formada em 2014 para defender melhores políticas públicas em suas comunidades. A reunião no Vidigal foi parte de uma série de reuniões da União Comunitária que está sendo realizada em favelas em toda a Zona Sul sobre a possível privatização da água, que veio na sequência de reuniões no Santa Marta e no Morro dos Prazeres.
As lideranças comunitárias afirmam que a privatização da CEDAE está acontecendo primeiro em favelas onde as UPPs foram instaladas, e que atua como uma forma de facilitador da gentrificação, aumentando os gastos e assim empurrando os moradores para fora de suas propriedades sem remoções oficiais. Isto é particularmente preocupante uma vez que a política de UPP em si já está vinculada a aumentos de preços e a gentrificação. André Santana do Morro do Andaraí disse que “a luta do meu pai era contra a remoção. Eles evitaram que muitos fossem removidos. A luta não foi em vão”.
Enquanto a alegação de que a privatização da CEDAE só está acontecendo nessas favelas da Zona Sul ainda não está confirmada, líderes comunitários destacaram que o efeito do aumento das contas de serviços públicos tem o potencial de ter um grande impacto sobre os moradores de baixa renda das favelas. Em particular, eles enfatizaram quão prejudicial a privatização da Light já foi para a comunidade.
Líderes comunitários do Vidigal descreveram casos em que moradores recebem mensalmente contas da Light no valor de R$800, quando muitos recebem esse salário por mês. Zé Mario, Presidente da Associação de Moradores do Santa Marta, relatou uma história de um homem que tinha uma conta de R$1198 e que chegou à Associação angustiado, explicando: “Vou embora do morro“. Os ativistas locais produziram um filme sobre o seu caso.
Tais histórias de faturação abusiva pela Light pioraram desde que a Light foi privatizada em 1996. Um estudo de contas de luz no Chapéu-Mangueira realizado por Alexandre Mendes, professor de Direito da PUC-RJ, constatou que a “Light usou uma estratégia depois da entrada das UPPs para estabelecer limites de consumo e, gradualmente, ir aumentando-os”, cobrando dos moradores taxas que não correspondem com o consumo realizado.
No caso dos serviços de água e de tratamento de esgoto, como no caso de eletricidade, já houveram algumas desconexões entre o consumo e o custo. Antes das UPPs serem instaladas, muitos moradores individualmente buscavam sua fonte de água de maneira informal, artesanalmente. Moradores que consumiam água desta forma estavam acostumados a irregularidades no fornecimento de água, mas agora, em parte devida à crise de água no Rio, até os serviços formais de água da CEDAE estão irregulares e agora ameaçam a aumentar as contas com a privatização.
Serviços de tratamento de esgoto também sofrem com irregularidades da CEDAE. André Santana explicou na reunião do dia 17 de fevereiro que o Morro do Andaraí estava sem tratamento de esgoto por cerca de duas semanas e que o coordenador de esgoto da CEDAE, responsável por essa comunidade, tinha postado um pedido de desculpas pela falta de serviços no Facebook.
Houveram algumas notícias positivas desde a reunião: foi decidido que a CEDAE só poderá cobrar a taxa de tratamento de esgoto nos casos em que, de fato se recolhe, trata e envia esgoto para o seu destino designado. Se a decisão é devidamente aplicada, isso deve ajudar as comunidades a evitar contas de taxa fixa que não estão vinculadas aos serviços prestados, apesar de não limitar o custo quando os serviços são adequadamente providenciados.
Ao protestar as contas excessivamente elevadas de serviço público que não correspondem ao uso, os oradores da reunião também sublinharam a necessidade de acabar com o mito de que moradores de favela não querem pagar por água e outros serviços, explicando que eles só querem pagar um preço justo.
André Santana associou a possibilidade de uma cobrança subsidiada para as favelas com a necessidade de investimento público em favelas: “Quem necessita de políticas públicas–escolas e hospitais–são as favelas”.
Com a pacificação, a formalização de serviços públicos tem sido apontada como uma forma de inclusão social pelas autoridades. Porém, os serviços gerenciados pelo mercado muitas vezes são priorizados ao invés dos investimentos em educação e saúde. Aludindo à proximidade das Olimpíadas no Rio, o vice-presidente da Associação de Moradores da Vila Vidigal, Sebastião Aleluia, disse: “A melhor Olimpíada seria dos hospitais, escolas”.
Os líderes da comunidade pediram um engajamento cívico mais amplo. O presidente da Vila Vidigal, Marcelo da Silva, afirmou à multidão: “A conta vai chegar individualmente para cada um de nós. Não dá para ficar reclamando nos botecos da vida, não adianta ficar reclamando, na fila do ônibus, do moto-táxi e no Facebook”. Os líderes incentivaram os moradores a se unirem perante as autoridades antes delas agirem. Santana disse: “É bom lembrar que tudo é política, desde o preço da sua cerveja até a conta da Light quando você está assistindo a sua novela”.
Os próximos passos são continuar com as reuniões em outras favelas que participam da União Comunitária e articular, potencialmente, uma ação coletiva direta nestas comunidades.
Vila Autódromo Lança Plano Popular 2016 e Campanha “Urbaniza Já!”
Cerca de 250 pessoas se reuniram na Vila Autódromo este sábado, 27 de fevereiro, para o lançamento oficial do atualizado e premiado Plano Popular da Vila Autódromo, projetado pelos moradores da Vila Autódromo com a assistência técnica de pesquisadores da UFRJ e da UFF. O evento aconteceu após uma semana tensa na comunidade, com a demolição da Associação de Moradores e da casa de Heloísa Helena Costa Berto, e a ameaça de demolição da casa de Maria da Penha.
“Urbaniza Já, a Vila Vai Ficar!”A manhã começou com moradores, apoiados por estudantes, marcando os lotes atuais da comunidade, de acordo com o Plano Popular. Aqueles que vieram para apoiar a comunidade foram entretidos por uma companhia de palhaços da Escola Livre de Palhaços, enquanto as crianças desenhavam o seu próprio “Planinho Popular”, mostrando como eles querem que a Vila Autódromo seja urbanizada.
Depois do almoço, os moradores se prepararam para sediar o evento de lançamento na casa de Penha, mas tiveram que se mudar para o parquinho da comunidade para acomodar a multidão que lá estava. No lançamento lideranças comunitárias, como Maria da Penha, Sandra Maria e Jane Nascimento, assim como dois dos planejadores urbanos que compuseram a equipe técnica do Plano Popular–Carlos Vainer e Regina Bienenstein–falaram com as pessoas reunidas. Eles descreveram a luta para permanecer na terra até este momento, e suas esperanças para o futuro, que estão detalhadas no Plano.
Maria da Penha iniciou as falas, declarando que embora “a Associação caiu, nós não caímos”. Ela continuou com uma nota pessoal: “Não abro mão de meu direito, nem de minha casa”.
Ela passou a explicar que a prefeitura as vezes argumenta que a Vila Autódromo não pode ficar, porque “não tem como urbanizar a Vila“, mas o Plano Popular mostra que esse argumento é sem fundo.
Sandra Maria foi a próxima a pegar o microfone, e usou seu discurso para desafiar o Prefeito Eduardo Paes para manter sua palavra para que a comunidade permaneça. Ela e outros moradores presentes no evento de sábado lançaram um desafio a todos os apoiadores da comunidade para postarem vídeos de si mesmos nas mídias sociais convocando o prefeito para manter sua palavra usando a hashtag #UrbanizaJá para rastrear os vídeos.
O chefe do Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria Pública do Rio também falou, garantindo o apoio do seu escritório para a luta da comunidade.
Carlos Vainer da UFRJ falou sobre a necessidade de urbanização, dizendo: “A habitação não é apenas uma casa, é a integração com a cidade”. Ele olhou para cima para o novo hotel construído para os Jogos Olímpicos e disse: “Eles [do hotel] não querem a vizinhança dos moradores da Vila Autódromo, mas [os moradores] querem se integrar”. Penha entrou na conversa: “E lembre-se que chegamos primeiro!”.
Vainer elogiou os moradores por sua luta, adaptando o lema dos moradores “Vila Autódromo existe e resiste”, dizendo que “Vila Autódromo existe porque resiste”.
Em vários pontos dos discursos, a multidão clamava “Urbaniza Já, a Vila Autódromo vai ficar!”.
Muitos moradores usaram seus discursos para agradecer a massa de apoiadores que se reuniram na comunidade para o evento, e também durante a semana quando eles fizeram resistência à demolição da Associação de Moradores, o centro espírita de Heloisa Helena Costa Berto, e a casa de Maria da Penha, centros simbólicos da resistência.
Com o lançamento oficial do plano atualizado, os moradores afirmaram seu desejo de permanecerem na comunidade, com a urbanização. Os planos originais para o Parque Olímpico da empresa de infraestrutura global, AECOM, mostravam uma grande parte da Vila Autódromo coexistindo com o Parque Olímpico. Além disso, o Prefeito Eduardo Paes tem afirmado repetidamente que os moradores que querem ficar podem ficar. Mas as ações da prefeitura na realidade não correspondem as suas palavras.
Intimidação psicológica e remoções relâmpago foram usadas para dizimar a comunidade, em uma campanha que custou a cidade bem mais de R$200 milhões, 16 vezes mais do que o custo estimado da implementação do Plano Popular. O Plano Popular representa uma visão para a Vila Autódromo não apenas para ficar, mas para florescer, e esta visão foi reconhecida, na sua versão anterior ao ganhar o prestigiado prêmio Deutsche Bank / London School of Economics UrbanAge.
O Plano PopularO Plano Popular foi atualizado para refletir as demolições que têm sido levadas a cabo e projetando lotes para todos os moradores que escolheram ficar e que não têm interesse em negociar uma indenização com a prefeitura. Além da construção de uma nova Associação de Moradores, o Plano propõe a restauração do jardim da comunidade, uma creche comunitária, um espaço multi-uso para realização de eventos na comunidade, um pequeno parque, e a expansão de um sistema de esgoto e drenagem.
O plano foi bem recebido por seus méritos técnicos, e está alinhado com os ideais da ONU-Habitat para um bom design. Além disso, o Plano foi um esforço participativo entre a comunidade e parceiros acadêmicos. Vainer disse: “O Plano não é um desenho. Um Plano é feito de coragem, de paixão e de luta”.
Solidariedade com a Vila AutódromoApesar da intensidade da luta e do aumento da tensão da semana passada, o evento foi uma celebração inspiradora de resistência em curso repleta de solidariedade de apoiadores e renovação de otimismo para a implementação do Plano Popular.
Dentre as pessoas reunidas estavam moradores, líderes comunitários, políticos, defensores públicos que trabalharam no caso da Vila Autódromo, e apoiadores que têm mantido a vigília na Vila Autódromo durante a semana passada em face de demolições. Apoiadores de outras comunidades, como a Cidade de Deus, foram reconhecidos. Penha disse à multidão que a situação traz “tristeza, mas muita alegria por todos que estão presente”. Mesmo trabalhadores da obra do Parque Olímpico ao lado pararam para ouvir os discursos entusiasmados.
No final do evento, os ativistas fizeram chamadas para que os apoiadores mantivessem a presença na Vila Autódromo. Eles enfatizaram primeiro a importância de manter a vigília na comunidade na próxima semana, e, em seguida, falaram sobre a presença de apoiadores ao longo prazo. Um convite permanente para realização de eventos, tais como grupos de capoeira e teatro na Vila Autódromo foi estendido para a multidão. No próximo sábado, 5 de março, haverá a comemoração do lançamento do livro de Raquel Rolnik, Guerra dos Lugares: A colonização da terra e da moradia na era das finanças. Raquel Rolnik, recente Relatora Especial da ONU sobre Direito à Moradia Adequada, é professora da USP e uma defensora de longa data da Vila Autódromo.
Os próximos dias são novamente cruciais, os moradores e apoiadores tentam deter a remoção da casa de Maria da Penha, um local-chave de resistência. Colocada sob uma ordem de demolição na última segunda-feira, os moradores esperam que a prefeitura tente demolir a casa a qualquer momento, e por isso estão constantemente vigilantes. Eles continuam esperançosos no entanto, e a exibição de apoio no evento do lançamento, visivelmente renovou a moral dos moradores. Como Penha disse: “A luta vai continuar”.
Greens commit to Rights of Nature law
TheEcologist, 29th February 2016
“At its Spring Conference in Harrogate yesterday the Green Party of England & Wales gave formal recognition to the Rights of Nature in an overwhelming vote, committing it to passing a new law to that effect at the earliest opportunity.
The Green Party of England & Wales yesterday became the first UK-wide political party to vote Rights of Nature into their policies.
The motion was passed overwhelmingly by the conference floor. The full text that was passed was worked on in coordination with Mari Margil from CELDF (Community Environmental League Defence Fund), and Mumta Ito from the Global Alliance for Rights of Nature.
Rights of Nature is a growing environmental movement calling for new legal tools to be developed to defend nature’s ecosystems. Central to this is the rejection of market valuations of nature and the recognition that nature will only be protected if we respect its innate value in law.”
Read the full article at: Greens commit to Rights of Nature law, The Ecologist
The Rights of Nature must be recognized in law, TheEcologist, 25th February 2016In an earlier article dated 25 February, Atus Mariqueo-Russell & Rupert Read reported The Rights of Nature must be recognised in law
“Existing models of protecting nature are failing, write Atus Mariqueo-Russell & Rupert Read. They serve to regulate, rather than prevent the destruction of nature, and are now adopting the very ‘market’ approaches that are largely responsible for the problem. The answer is to give formal effect to the Rights of Nature.
Capitalism’s favoured economistic approach will not protect the environment, because it involves a further commodification of nature’s ecosystems – embracing precisely the same framework that has failed us so miserably.
At this week’s Green Party conference we will be putting forward a proposal to adopt Rights of Nature into the Green Party’s policies.
Central to this motion are the rights of nature to ‘exist, persist, maintain and regenerate its vital cycles, as well as the right to restoration’.
Currently Britain’s piecemeal environmental regulations consider nature as an object of commerce within the law, and thus they prevent us from protecting ecosystems in any meaningful sense.
The best our law can provide is the regulation of nature’s destruction; a mitigation of the worst excesses of rampant extractivist neoliberalism.”
Read the full article at: TheEcologist The Rights of Nature must be recognised in law.
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