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seg, 07/06/2010 - 06:42

O toque do tambor?

O Dalton lançou há alguns dias um email bem interessante na lista da metareciclagem, levantando questões sobre o que nos une, nossos interesses e posições. A conversa rendeu bastante. Eu respondi assim:

<dalton>
Mas, e aí, era isso que a gente queria? É isso que eu ainda quero?
Faltou alguma coisa? Para onde foi a utopia?
Dá para ir além? Dá para pensar em mais algumas camadas que
aproveitem tudo isso ou tá bom assim?
Como esses espaços públicos/privados/sintetizados/ todos podem
aproveitar de tudo isso que foi produzido? Tem alguma forma de
circular isso de outra maneira?
Tem alguma outra forma de conversar sobre isso? Tags são apenas
espaços de agregação ou ainda podem ser invadidas?
</dalton>

Se era isso que a gente queria, espero que não. Ficaria muito frustrado de, quase oito anos depois (28 de junho tá chegando, BTW - vai ter festa na antevéspera?), ter chegado a um ponto que imaginava chegar. Pessoalmente, te digo que meus horizontes expandiram um monte. Conheci um monte de gente que me fez ter dúvidas sobre praticamente tudo em que eu acreditava - um pouco de cada vez - e aprendi pra caraca com isso. Gosto de acreditar que mantive minha espada em forma de ponto de interrogação apontada para a frente, mas isso é só uma metáfora aleatória.

Há um par de anos, eu fiz de novo uma pergunta que costumo fazer sempre - pra quê? Na sequência, rolou uma conversa bem interessante que terminou com "tacando pedra nos moinhos".

http://rede.metareciclagem.org/wiki/PraQue

Mas ultimamente eu também tenho me perguntado de novo um "pra quê", mas com outra ênfase: não o pra quê desse nosso boteco/sofá/ágora/fogueira aqui, mas o pra quê mais amplo, envolvendo outras redes de afinidade aqui em volta - além da metarec também o estudiolivre, a submidialogia e todas as mais de vinte redes e milhares de pessoas a que essas nos ligam. Qual é o nosso papel no esquemão do mundo de hoje? Além de molas que impulsionam processos locais, além de pesquisadores eternos de novas fronteiras técnicas e sociais, além de formuladores subvalorizados - o que pode ser bom, porque garante nossa camuflagem - de políticas públicas, além de pessoas tão dedicadas aos processos que muitas vezes temos problemas com objetos - pra não falar nos relatórios! -... qual é o papel que a gente pode ter na sociedade hoje em dia?

Acho que nos últimos anos se construiu um cenário muito interessante, principalmente no Brasil, que juntou pessoas com interesses diversos - comunicação, educação, arte, fortalecimento de comunidades, produção colaborativa, exploração de linguagens. Essas pessoas estão trabalhando juntas de uma forma totalmente ímpar - em grupos auto-organizados, em ONGS, pequenas empresas de consultoria ou projetos de governo, mas frequentemente em uma mistura de todos esses elementos. O que a gente poucas vezes pára pra pensar é em como isso se articula com as macroestruturas da sociedade - onde a gente se posiciona em relação às pessoas que ainda assistem à novela ou ao sílvio santos, que vão ao culto e pagam o dízimo em prestações, que votam no candidato mais bonito ou naquele candidato que é primo da minha cunhada e disse que pode ajudar quando eu precisar.

A gente tem conseguido agregar um monte de gente fodidamente criativa, engajada e batalhadora, mas onde vai parar toda essa potência de luta? Defender inclusão digital hoje é óbvio, a gente pode mais. Propor a dinamização de oportunidades de transformação social através da rede com iniciativas auto-geridas e com aprendizado distribuído, idem. Falar que o software livre é um dos cases mais claros das possibilidades da produção colaborativa baseada em licenças livres... a gente faz isso há tempos. Falar que as pessoas têm que abrir a caixa-preta, que precisam entender as máquinas por dentro, que devem usar livremente e customizar livremente e redistribuir livremente o software dessas máquinas... que usar hardware livre como o arduino (só um exemplo) e software livre e lúdico como o PD (só um exemplo) trabalham um tipo de criatividade que até há pouco era restrita a meiadúzia de gentes... que despertar esse tipo de criatividade traz benefícios para diversos aspectos da vida das pessoas. Ok, argumento adotado, voto dado, discurso apropriado. Quando a maioria do cenário político concorda com o que a gente fala, é hora de comemorar, mas também é hora de pensar nos próximos capítulos.

Eu quero saber como é que a gente usa (palavra feia, desculpem) essa potência toda que a gente arregimentou aqui na MetaReciclagem e nas redes que são nossas parentes pra resolver coisas que são realmente complexas. Exemplos? A violência urbana, que continua piorando - e que cada vez mais se prova que não está diretamente ligada à pobreza ou à exclusão. A expansão do moralismo religioso - que continua mandando queimar terreiros nos buracos do Brasil. A falta total de conscientização ambiental - não só no saquinho plástico do supermercado, mas também na regularização de ocupação do solo, de legislação fundiária, construção sustentável e afins, que levam a esse festival de enchentes, deslizamentos e outras m3rd4s. O crescimento do consumismo de carona no PIB, na nova classe média e outros assuntos macroeconômicos.

E isso só pra começar. Onde e como é que essas mentes privilegiadas que tão por aqui e na vizinhança vão usar todo o conhecimento (livre!) que podem gerar? Eu vejo muita gente ainda se preocupando em combater a globo - enquanto a record vai comendo pelas beiradas, sob a direção de umas figuras que eu não considero nem um pouco melhores que a família marinho.

Enfim, perguntas.

<dalton>
Para onde foi o toque do tambor?
A mão seca na pele esticada.
As cores de cordel,
Os 100 olhos estampados na tela,
As hashtagstalkings pontas de bits.
Para onde foi o toque do tambor?
</dalton>

O toque do tambor continua ribombando aqui na minha cabeça, sempre que eu consigo deixar a mente quieta (o que acontece um par de vezes por ano, no máximo). As frases são as mesmas, mas eu as interpreto de outra forma a cada vez que ouço.

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