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sab, 04/04/2009 - 08:32

Mulheres - Congo: Chamado ao boicote de “minerais sangrentos”

O consumo maciço mundial de telefone celular, computador e outros produtos eletrônicos exacerba a violência sexual na República Democrática do Congo (RDC), segundo a organização humanitária norte-americana Enough Project. O informe “Pode escutar o Congo? Telefones celulares, minerais conflitivos e a pior violência sexual do mundo”, divulgado quarta-feira, descreve como rebeldes da RDC compram armas com dinheiro da venda de valiosos recursos minerais, causa direta da generalizada violência sexual nesse atribulado país africano.

“O conflito no leste da RDC, o que causou a maior quantidade de mortes desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1949), está exacerbada em grande parte pelo multimilionário comércio de recursos minerais”, diz o informe. “Os grupos armados recebem cerca de US$ 144 milhões ao ano com a venda de quatro metais: estanho, tântalo, tungstênio e ouro”, acrescenta. Com a ajuda de outras organizações não-governamentais, a Enough Project investigou todo o ano passado a cadeia de fornecimentos que vincula os minerais conflitivos à maioria dos produtos eletrônicos, incluídos telefones celulares, reprodutores portáteis de musica e computadores.

A violência na RDC, derivada da “maldição dos recursos”, tem mais de um século. Nos últimos 10 anos, os diferentes grupos rebeldes e unidades militares que dominam a zona conflitiva do país disputam o controle das áreas ricas em recursos minerais e seus habitantes, em parte, mediante a violência sexual. Segundo a pesquisa, há 1.100 denúncias de violações por mês, a maior parte sobre casos de violência sexual contra mulheres, adolescentes e meninas no mundo.

“As mulheres de algumas comunidades que foram forçadas a abandonar suas casas ficam tão traumatizadas que não querem voltar nunca mais ao seu lugar de origem”, escreveu um dos fundadores do Enough Project, John Prendergast, no jornal San Francisco Chronicle. A violência “destrói famílias, dizima comunidades e propaga o HIV/Aids e outras doenças sexualmente transmissíveis”. A região sofre conflitos há anos.

Após o genocídio de Ruanda em 1994, no qual cerca de 800 mil tutsis e hutus moderados foram mortos por forças governamentais e rebeldes, centenas de milhares de hutus vinculados ao regime fugiram para a RDC enquanto a Frente Patriótica Ruandesa, apoiada pelos tutsis, conquistava o país. Muitos deles voltaram para Ruanda, mas a presença de “genocidas” no leste da RDC serve para Kigali justificar as repetidas incursões na região nos últimos 12 anos.

A divulgação do estudo coincidiu com um outro preparado pela Oxfam, segundo o qual cerca de 250 pessoas abandonaram suas casas na RDC após uma operação conjunta sem precedentes entre Ruanda e os próprios soldados angolanos contra os restantes rebeldes hutus. A operação foi considerada um sucesso pelos dois países, mas após a retirada das forças ruandesas, há algumas semanas, rebeldes hutus regressaram à região e estão praticando saques e aterrorizando a população local.

A Oxfam afirma que soldados do Congo também participam de ações violentas. “Há saques generalizados, aldeias incendiadas e um máximo inaceitável de violência sexual”, disse o diretor da Oxfam na RDC, Marcel Stoessel, à rede de rádio e televisão britânica BBD. Os três grupos armados responsáveis pela violência, que controlam a maior parte do comércio de minerais, são o Congresso Nacional para a Defesa do Povo, as Forças de Libertação Democráticas de Ruanda e unidades renegadas do exército da RDC.

Essas organizações armadas ficam com o lucro do comércio de minerais por controlarem pela força as minas e exigirem pagamento por parte de transportadores, compradores locais e internacionais e guardas de fronteira. Os minerais do conflito vão da RDC aos países da Ásia-Pacífico, onde são processados e transformados em metais valiosos necessários para produzir uma gama ampla de produtos eletrônicos.

O estanho é usado principalmente para soldagem de placas-base de computadores. As organizações armadas obtêm cerca de US$ 85 milhões por ano com a venda deste metal, diz o estudo. O tântalo, empregado para armazenar eletricidade em condensadores de Ipods, reprodutores portáteis digitais de áudio e vídeo, câmeras digitais e celulares, rendem aos rebeldes cerca de US$ oito milhões por ano. O tungstênio, usado para fazer o celular vibrar, gera aproximadamente US$ 2 milhões. Por fim, o ouro, empregado em jóias, é outro dos componentes dos produtos eletrônicos e deixa aos grupos armados entre US$ 44 milhões e US$ 88 milhões ao ano.

Enough exortou as empresas de produtos eletrônicos a se comprometerem, com fizeram os joalheiros e a indústria de diamantes há sete anos com os chamados “diamantes de sangue”, em não fabricar seus produtos com minerais conflitivos e submeter sua cadeia de fornecimento a uma auditoria transparente. Companhias como as norte-americanas Apple e Hewlett Packard, a finlandesa Nokia e a japonesa Nintendo tenderiam a “mudar suas praticas de abastecimento e exigir dos fornecedores provas da origem dos minerais”, afirmou a organização.

A Enough também exortou os consumidores de todo o mundo a usarem seu poder de compra para reclamar das companhias a revisão de seus protocolos empresariais e se responsabilizem pela origem dos minerais que usam em seus produtos. “Pedimos aos consumidores que entrem em contato com as 21 companhias de produtos eletrônicos através de nosso site na Internet Criar Consciência sobre o Congo para pressioná-las a fabricarem seus produtos sem metais conflitivos”, disse Prendergast.

O estudo da Enough também cobra do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama,e do congresso desse país medidas concretas para garantir o fim da violência na RDC ao combater suas causas. “O presidente Obama deve romper com a política anterior para a RDC, criada mais para cuidar, sem muita vontade, dos sintomas do problema atraves de ajuda humanitária, ações diplomáticas irregulares e forças de paz”,segundo Prendergast. Também exortou Obama a nomear um enviado de alto nível com uma equipe para trabalharem em coordenação com atores locais e regionais sobre as causas da instabilidade.

Além disso, poderia apoiar o trabalho do Tribunal Penal Internacional, que investiga os crimes de guerra cometidos na RDC, e pressionar para que as violações, enquanto arma de guerra, sejam objeto de investigações penais no leste deste atribulado país africano. A Enough também cobrou do Congresso a aprovação de leis que “obriguem as companhias a revelar a origem dos minerais que utilizam e estabeleça sanções para as que continuarem comprando metais conflitivos”. IPS/Envolverde Por Marina Litivinsky

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