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sex, 28/08/2009 - 21:05

Começando pelo começo

Já andei dizendo por aí que eu gosto de reparar nas coisas óbvias. Comecemos por isso, então.

Antes de mais nada não fui eu que inventei esse nome “MetaRecursos” e nem tampouco tive a ideia de criar esta ConecTAZ. Aliás, até pouco tempo atrás, nem sabia que esse nome “conecTAZ” existia. O fato é que eu gostei da alcunha “MetaRecursos”, me pareceu apropriado também por ser óbvio. E, além disso, eu atendo a pedidos... só a alguns...

 

Outro dia alguém disse lá na lista de discussão que chegou aqui porque achou estranho o nome “MetaReciclagem”. Com o volume das mensagens diárias, não deu tempo de comentar esta. Para mim, era óbvio, meta quer dizer “além de” e a MetaReciclagem é isso: vai além da Reciclagem. Depois descobri – ao pensar num projeto para viabilizar publicações experimentais sobre a Metamitogênese e ouvir o áudio de uma conversa sobre Mitoreciclagem – que o nome “MetaReciclagem” surgiu por acaso (ou talvez ninguém se lembre mais como foi que a coisa aconteceu), derivado do metá:fora.

 

Antes que ocorra o mesmo, que essa conecTAZ adquira vida própria e ninguém mais saiba o motivo de sua existência, vamos tornar este post um “ritual de iniciação”.

 

Seguindo a lógica etimológica e o comodismo do óbvio: MetaRecursos pretende ser algo que discute e propõe ações pra ir além dos recursos.

 

Ir além não é uma novidade para a Rede MetaReciclagem, pois já completou sete anos. Se ela fosse uma microempresa, já teria superado as estatísticas do Sebrae, que indicam o alto índice de “fracasso” no primeiro ano e de “sucesso” ao ultrapassar quatro anos de vida. Se ela fosse um projeto social, estaria talvez naquela hora de começar a estruturar sua “metodologia” (leia-se: colocar no papel a sua prática), alguma consultoria externa teria alertado que seria hora de pensar em avaliação de impacto e monitoramento de resultados ou coisa parecida. Se ela viesse da vontade de um grupo de pessoas que simplesmente seguem o fluxo social, teria se transformado numa personalidade jurídica. Se o grupo não tivesse muito dinheiro, formaria uma associação de bairro; se tivesse, almoços e jantares como os do Rotary resolveriam os problemas do mundo (sem perguntar pro mundo o que ele acha e esquecendo que ele é bem maior que a mesa onde se come). Se ela tivesse surgido da uma ideia brilhante e genial de uma pessoa, talvez tivesse se tornado uma ong e fosse condenada ao personalismo de uma direção. Se ela seguisse tendências, em vez de ong, hoje seria oscip e estaria criando indicadores, discutindo os mecanismos de gestão. Sim, “gestão” me parece ser uma palavra que está bem na moda.

 

Se eu brincasse de ser alguém como a Constanza Pascolato ou Glorinha Kalil e agora estivesse participando de uma entrevista do tipo bate-bola num suplemento dominical de um jornal, já poderia elencar as palavras do momento: é in ser oscip, se preocupar em estruturar metodologias, fazer cursos de gestão, falar de sustentabilidade e é out resgatar a cidadania, fortalecer a auto-estima dos pobres e oprimidos, “oferecer” cultura pra quem está em risco social (como se todos nós não estivéssemos!) e defender o assistencialismo. E viva a esquizofrenia reinando no universo! Segue majestosa e absoluta: discursos in, com ações out.

 

Se eu continuasse nessa brincadeira de ser diferentes personagens e fosse o entrevistado, quando me perguntassem qual é o meu sonho, teria que dizer: “que as minhas ideias virem uma política pública”. Caramba! Não há um projeto de maior porte que eu visite atualmente, que não diz: “queremos transformar isso numa política pública”. Sorte a minha não estar trabalhando no governo. Não sei o que eu faria com tantos interesses particulares querendo se tornar ou parecer públicos. E ainda acham que isso só acontece no congresso, no senado, nesses lugares oficiais da política... Brecht teria bastante trabalho se fosse consultor do IBGE e coordenasse um recenseamento sobre o analfabetismo político. Odeio política!... A propósito, consultoria é uma tendência que está in há algumas estações; pode se transformar no pretinho básico.

 

O fato é que a MetaReciclagem não é microempresa, projeto social, ong, oscip... É uma rede. Esta palavra também está bem na moda, principalmente as tais “redes sociais”. Depois do boom da internet, então... Pobre dos eremitas! Pobre daqueles que não têm um blog ou estão no twitter... Um problema metafísico do momento poderia ser: o que fazer com os altos índices de “exclusão” digital? Mas rede é uma palavra que ficou fora da entrevista sobre as tendências desta estação. Talvez as redes sejam como as vidas das pessoas: elas surgem e ninguém sabe quanto podem durar ou como se desenvolvem... É um assunto muito complexo prum bate-bola e jornal não é lugar para coisas difíceis. Talvez fosse bom abordá-lo nas provocações do Abujamra. Se bem que TV também não é o lugar de gente que pensa... ou será que dá pra abrir uma exceção quando a emissora se chamar “cultura”? Sei lá... não quero pensar nisso hoje. E se até o Lévy se deixou levar, perdeu o bonde, por que eu me atreveria a falar sobre o fenômeno das redes?

 

Abrindo parênteses: é bem da moda essa palavra “fenômeno”, a la Lipovetsky e suas elucubrações sobre a sociedade do espetáculo. Também é típico da moda esta coisa de citar nomes difíceis no meio do texto pra fazer com que ele pareça denso, inteligente. É a covardia da arrogância, querer se mostrar sutil e humilde. Mas na indústria cultural e do esporte essa palavra “fenômeno” também rende: notícia, patrocínio, etc. Rende tanto que cansa. Mas tudo bem, o mundo contemporâneo é assim: in e out, erudito e popular simultaneamente. Tá na moda ser contemporâneo e não faz mais sentido operar na lógica maniqueísta e dual. Gente contemporânea precisa ser capaz de abstrair as fronteiras e defender a diversidade... Gente contemporânea gosta de ser plural e circular; de passar e transitar em vez de permanecer e ficar (ainda que em alguns contextos “ficar” signifique “não ficar”). Será que a moda me influencia também e ainda não percebi? Sei lá... já disse que não vou pensar em coisas difíceis... Deixa pra outra hora porque eu estou ocupada agora... Gente contemporânea faz muitas coisas ao mesmo tempo...

 

Além da MetaReciclagem ser uma rede, já criou metodologia(s), já influenciou políticas públicas, já sabe se virar, já até ganhou prêmio...já cresceu (agora tem até que lidar com dinheiro. Dizem as más línguas que quando as pessoas têm contas a pagar é porque viraram gente grande.), já botou filho(s) no mundo, que agora pergunta(m) como se virar por aí... E agora? A MetaReciclagem vai pra onde? Vai fazer o quê?

 

Sei lá... vai pra terapia (isto está bem na moda, aliás. Favor prestar atenção: gente contemporânea tem terapeuta e não analista. Freud é out. Jung é quase. Ainda é in porque combina com young.). Eu, particularmente, não sou muito fã de terapia, talvez por preconceito. Não sei bem pra que ela serve e por isso não acredito. Qual a vantagem de pagar por um negócio que te ajuda a ver defeitos que você já sabia que tinha, mas não tinha coragem de assumir? Quando ela dá certo, consegue, no máximo, fazer com que você conviva com os próprios defeitos e dificuldades, que vão continuar lá até você passar dessa pra “melhor”. Outro dia, um marido desesperado invadiu o consultório da minha mãe e interrompeu a sessão de sua mulher. Aos berros, avançou em direção à minha progenitora, com o dedo em riste: “O que você está fazendo com a minha mulher? Hein? Quem você pensa que é? O que você está fazendo com ela?”. E eu perguntei pra minha mãe: “o que você fez?”. Ela disse que não discutiria com quem grita, só conversa com pessoas que sabem falar baixo. Por isso que eu jamais poderia ser terapeuta. No seu lugar, na mesma situação, olharia para a mulher e diria, num impulso corporativista: “Sai desse casamento, porque esse corpo não te pertence!”. Eu ignoraria solenemente o marido e provavelmente gritaria, pra que ela me ouvisse mesmo, já que deveria estar estar acostumada com este tipo de tratamento (como diz meu pai, homem é um bicho que se condiciona fácil). Seria como uma sessão de exorcismo. Aliás, acho que esse pode ser um caminho pra MetaReciclagem... Experiências catárticas? Magia negra? Terapia já se faz (esse negócio de ficar toda hora se perguntando “o que é MetaReciclagem” vem de onde? Sei não, me parece um recurso tipicamente terapêutico). Me atrevo a prever que o futuro da MetaReciclagem está num retiro meio místico-esotérico... para ampliar as oportunidades de auto-conhecimento...

 

Digressões à parte, vamos obedecer o título deste post: o início é o tema e tratar do óbvio é a intenção. Se já falei demais sobre “meta”, faltam os recursos. Esse é o perigo de desprezar o óbvio: deixar passar despercebido o que é importante.

 

Recursos é uma palavra confundida frequentemente com “dinheiro”. Não, recursos são recursos; dinheiro é dinheiro. Uma coisa é uma coisa; outra coisa é outra coisa. E um risco perigoso, como bem disseram no grupo da infralógica outro dia, é confundir grana com poder. Como eu desconheço o mapa astral de quem tá lendo isso, não sei onde está o aquário de cada um, é melhor deixar claro e explícito: recursos não é metonímia de dinheiro ou abreviação de recursos financeiros. Recursos podem ser materiais (infra-estrutura física, grana, etc.) e imateriais (pessoas e seus modos de pensar, construir, se relacionar, conviver...). E neste exato momento eu acabo de descobrir que MetaRecursos é uma conecTAZ pra lá de pretensiosa, ir além disso tudo vai dar bastante trabalho...

 

Por outro lado, como está na sinopse e é bom ressaltar neste “ritual de iniciação”: ela surge durante as discussões sobre o que fazer com o prêmio Mídia Livre, como utilizar o dinheiro que a gente ganhou (por enquanto ele é apenas uma notícia do diário oficial, não é de verdade). E como eu ajudei a construir as respostas do formulário, ganhei esta conecTAZ de presente. Presente de grego, será? Pode ser, “meta” vem do grego. E na Rede MetaReciclagem muitas vezes se fala grego...

 

MetaRecursos não será muito diferente. Vai falar grego em alguns momentos, mas com a o xemelê como essência. Da minha parte neste pacto ritualístico, continuo com as mesas preocupações que tive durante a inscrição no Mídia Livre: pensar sobre o que a rede já faz e prestar atenção em como a gente conta isso pros outros, pra quem não a conhece e até pra ela mesma. Pode ter sido essa a minha contribuição para o prêmio e participar deste processo foi interessante para que eu conhecesse melhor a Rede, pois eu tinha acabado de chegar. Isso vai ser cada vez mais difícil porque quanto mais a gente se envolve numa coisa, o privilégio do encantamento e da descoberta se torna mais raro, já que tudo vai ficando meio comum e rotineiro. Por isso a minha atenção ao que é óbvio: olhar bem pra o que a gente já conhece e está no nosso cotidiano traz de volta o encantamento, proporciona a ReDescoberta.

 

Está aberto este espaço, então. Outros prêmios devem vir, mas antes disso é bom lembrar que prêmios são reconhecimentos pelo que é feito e já existe (mesmo que ainda seja em forma de ideia). A MetaReciclagem já existia muito antes d'eu chegar. E não fui eu que inventei essa birosca! (antes que alguém me acuse).

 

Portanto, quero descobrir o que as pessoas já fizeram e estão fazendo por aí. Percebi muitas coisas sobre a Rede durante a inscrição no Mídia Livre, mas sou bem curiosa e quero saber mais.

 

Concluo o ritual, convidando as pessoas para dialogarem aqui. Não por generosidade ou qualquer preocupação politicamente correta. Isto é entediante, apesar de também estar na moda. É por egoísmo mesmo. Por avareza, pra não pagar pela terapia. Só quero que as pessoas me ajudem a lidar com as minhas próprias características pra evitar que elas virem uma limitação... que a reflexão não seja impedimento à realização, que a crítica não seja motivo pra dureza e arrogância, que a organização não seja motivo pra chatice.

 

Vamos conversando... De quebra, a gente pode estruturar projetos, aprofundar as relações, conhecer novas pessoas, ajudar as que a gente já viu e encontra todo dia via tela. Podemos até fazer amigos e ser felizes, enquanto isso. Enfim, a gente precisa ocupar o tempo enquanto espera e vive... Independente do que as pessoas fazem e o que sabem ou das oportunidades que elas têm e criam, todo mundo é igual: quer viver bem. É por essas e outras que não desdenho o que é óbvio... Voltamos pro começo... Tá encerrado o ritual.

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Comentários

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O termo mitoreciclagem foi retomado esses dias pelo Daniel Duende e,  como é uma das palavras usadas neste texto,  acabei voltando aqui. Interessante voltar depois de quase dois anos e reler isso e ver meus comentários ingênuos da época (não que os de atualmente não sejam). Mas mais interessante ainda é ver/ perceber / interpretar que dois anos parece muito pouco numa conversa como esta. Aquela velha sensação: parece que foi ontem.

Uma estória do nome metareciclagem está contada lá no história da /de. A publicação que recebi em versão impressa das tuas mãos, com o acompanhamento de um sorriso,  em janeiro de 2009. Mas pode haver outras estórias que não conhecemos, claro. E aí a gente pode começar a pensar na estória que se estabelece e.... muita coisa.

Quanto a meta ser "além de", fico me perguntando agora porque você se restringiu a este significado. Não dá pra saber de jeito nenhum os sentidos, significados que este texto aqui tem pra você Tati. Não dava em 2009, não dá hoje, não será possível qualquer dia que seja. Ainda tenho muita dificuldade no assunto significados compartilhados. Acho que vai levar mais alguns anos pra que eu chegue a uma compreensão auto aceitável disto.

Quanto aos nomes, metareciclagem, metarecursos, metá:fora, acho muito legal a gente brincar de contar estórias que justifiquem o que pensamos e fazemos. Tipo o que você fez aqui neste texto. A conversa sobre mitoreciclagem meio que estimulou e você foi em frente. Sei lá, pareceu que foi assim. Em frente muito no seu jeito de contar estórias, que as pessoas podem conferir nas outras estórias que você conta daqui pra frente, aqui no metarecursos e em outras pontos de manifestação metarecicleirxs e possivelmente em outros lugares, imagino.

Mais legal ainda seria ter outras pessoas contando estórias sobre o mesmo nome. Porque, ainda que eu entenda ( a partir da sua estória) que este pode ser um dos sentidos mais interessantes, metarecursos não se restringe a "para além dos recursos". Não é? Aliás, as pessoas estão contando as estórias, não aqui e nem desta forma, mas, estão. Quando surgem conversas como esta puxada pela Andréa, a Regi e a Meiry a gente vê isto claramente. E isto já entra numa conversa que rolou/rola uma certa dimensão lá no mutgamb: "outras vozes", que esta tredi menciona, mas que se formos pensar direitinho é muito mais antiga que o próprio mutgamb ou a própria metareciclagem.

E se é para resgatar etimologia,  por que a decisão de ir direto do grego para o português? Será que (grosseiramente entendendo e sem querer dar uma de saber qualquer coisa de linguística) a brincadeira poderia ir  para a mediação feita pelo latim nos sentidos gregos do prefixo meta? Daria pra elaborar algumas coisas acho e ter outras "metáforas" para recursos. Porque a sua ampla definição de recursos nos deixa com tudo e sem nada ao mesmo tempo. Aliás como muitas das coisas que circulam pela metareciclagem: rizoma, coneTAZ, autoorganização. Cada vez que essas coisas são evocadas podem significar qualquer coisa que se queira. Assim como a própria metareciclagem. E eu não estou julgando se isto é bom ou ruim. Até porque em bem e mal absolutos já não acredito. 

Mas o tempo está curto e preciso voltar a estudar a questão da autoridade em Weber, porque um maluco propôs por aí que temos ciberchefes, pode? E agora me senti obrigado a tentar entender isso. Mas, sempre é bacana ouvir e contar mais estórias da/de metareciclagem. Aliás, uma que eu gostaria muito de saber, e que para mim não é óbvia, é porque separaram a metáfora e passou a grafar assim metá:fora? Quais os sentidos, significados pensados por quem operou a ação e por quem assimilou? Coisas assim.

#tamojunto #metarecicleirx #mitoreciclagem #danielduende

 

 

Li tudo

Li tudo Tati.Só posso (e sinto que preciso) dizer isso agora. Mais, depois, talvez, nos reacessos.

 

 

O que é o público?

Ó Tati, não li tudo novamente. Hoje, enquanto tava me deslocando para uma aula, alguém me falou de público como se etivesse sendo facinho separar essas coisas atualmente.

Tenho observado em várias coisas, mas principalmente saúde e educação. A fronteira público-privado não está perceptível. E acho que tem muita gente fortalecendo essa coisa, porque acha que é interessante. Eu não sei. Acho que entendo a crítica que você fez de "tudo políticas públicas", mas, ao mesmo tempo, acho que essa questão da fronteira tem alguma coisa a ver. Confuso. Para pensar mais profundamente.

Beijin.