A técnica são modos de fazer e de saber-fazer, muitos modos de
saber-fazer mais as relaçoes de afeto(ou parentesco, no sentido
indígena) compoem uma cultura... ou uma tecnologia, como queiram.
a questão maior é como estas culturas, ou tecnologias, se inserem num
sistema maior de predação. Se para o índio, há uma relação entre
aquilo que o devora(a onça, o jaguar, a jibóia...) e a possibilidade
de que ele tambem a devore, num sistema de produção mutualizada de
sentido (de saber-fazer, de como matar a onça); num sistema de
produção como o capitalista, por ex., a mesma lógica pode ser
aplicada.
Se o índio ao matar a onça, de certa forma, absorve parte de seu
espírito e de seu modo existencia; ao lutarmos contra o capitalismo em
determinados momentos nos transformamos nele, pois somos a sua
contraparte, o seu complemento como presa a ser devorada.
Ao falarmos da natureza da tecnologia, e não da cultura digital(pois a
cultura digital está inserida numa cultura maior) tambem podemos usar
os mesmos principios filosoficos. Se a maquina computadora, as redes,
o google, por ex., funcionam como uma especie de Oráculo de Delfos
que, se por um lado me responde questoes, por outro se alimenta dos
meus dados (do meu perfil, de onde estou fisicamente e o que ando
fazendo). Portanto um sistema de presa e predador indígena, onde um
tenta devorar o outro.
Porem ha' um desvio nesse sistema de predação... ocorre quando o
tecnoxamã subverte o uso previsto da maquina computadora - esta que é
pobre em cultura e natureza pois pensa com somente a parte
racional-lógica-simbólica do homem, feita por esse como criatura. Tal
desvio ocorre quando se pega peças soltas, moldando-as num toscolão ou
um toscolinho, via Glerm. Quando a subversão do uso rompe a
pré-determinação da máquina fria e adentra por um outro dominio, o da
sonoridade. Os sons são tanto do domínio da humanidade quanto da
Natureza. Nesse momento a máquina torna-se maracá, pois transcende
mundos espirituais. Parte daquilo que é morto(feito de minerais,
silício, artificial, que não se reproduz) para adentrar no domínio da
vida, a composição maior e misteriosa, feita de sonoridades,
sensações, percepções e afetos.
Voltando a Viveiros de Castro, que na real é somente um tradutor, ou
transdutor, da natureza indígena, podemos nos perguntar: -Onde então
realmente estamos na cosmogonia da predação capitalista? Entre os que
comem comigo, entre aqueles que me comem ou naqueles que eu como?
E-mail do Mbraz em 26 de abril de 2011. Parte de uma conversa na thread "chat ruiz e fabi" que veio / vem rolando esse dias na lista metarec. (Deu vontade de botar no site e relacionar ao EdorR, depois tento explicar.)