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ter, 25/10/2011 - 11:18

Uma chamada ao exército do amor e ao exército do software

12 de Outubro de 2011

Por Franco Berardi e Geert Lovink

Tradução colaborativa por Felipe Cabral, Renato Fabbri, Iuri Guilherme dos Santos Martins, Felipe Fonseca e Naldinho Motoboy.

Original aqui.

A luta contra a Ditadura Econômica [1] está em erupção.

Os chamados “mercados financeiros” e seus serviços cínicos estão destruindo os fundamentos da civilização social. O legado do compromisso do pós-guerra entre a classe operária e a burguesia progressista está longe de desaparecer. Políticas neoliberais estão cortando custos da educação e do sistema de saúde pública e derrubando o direito a um salário e uma pensão. O resultado será o empobrecimento de grande parte da população, a precariedade das condições de trabalho (freelances em alta, contratos de curto prazo, períodos de desemprego) e a humilhação diária dos trabalhadores. O efeito da crise financeira ainda poderá ser visto através da violência, com pessoas evocando bodes expiatórios [2] e expalhando raiva aos quatro ventos. Limpeza étnica, guerra civil, a obliteração da democracia. Este é um sistema que chamamos o Nazismo Financeiro: FINAZISMO.

Agora mesmo, as pessoas estão lutando em muitos locais e de muitas maneiras. O Occupy Wall Street inspirou uma mobilização em massa em Nova Iorque, que está se expandindo pelos Estados Unidos a cada dia. Na Grécia, trabalhadores e estudantes estão okupando a Praça Syntagma e protestando contra a extorsão do Banco Central Europeu, que está devastando o país. Cairo, Madrid e Tel Aviv: a lista dos movimentos de praças está proliferando. Em 15 de outubro, cidades ao redor do mundo irão [2] lotar com pessoas protestando contra o roubo sistêmico.

Será que nossas demonstrações e ocupações vão parar a máquina Finazista? Não. A resistência não vai resistir, e nossa luta não vai parar os crimes legais. Vamos ser francos, nós não vamos persuadir nossos inimigos a parar seus ataques predatórios (‘vamos lucrar ainda mais com a pŕoxima queda’) pela simples razão de que nossos inimigos não são seres humanos. Eles são máquinas. Sim, seres humanos – gerentes, acionistas, negociadores – estão guardando o dinheiro que nós estamos perdendo, e predam os recursos que os trabalhadores produzem. Políticos assinam leis que entregam as vidas de milhões de pessoas para o Deus Todo-Poderoso do Mercado.

Banqueiros e investidores não são os verdadeiros tomadores de decisões, eles são participantes em uma economia de confusão gestual. O real processo do poder predatório se tornou automatizado. A transferência de recursos e riqueza daqueles que produzem para aqueles que não fazem nada a não ser observar os padrões abstratos de transações financeiras está embutida na máquina, no software que controla a máquina. Esqueça os governos e os partidos políticos. Estes fantoches que fingem ser líderes estão de conversa fiada. A opção paternalista que eles oferecem através de ‘medidas austeras’ enfatiza um cinismo galopante inerente aos partidos políticos: todos eles sabem que perderam o poder para o modelo de capitalismo econômico há anos. Desnecessário dizer que a classe política está ansiosa para controlar e sacrificar os recursos sociais do futuro através de cortes de orçamento para ‘satisfazer os mercados’. Pare de dar ouvidos a eles, pare de votar neles, pare de pular de raiva e amaldiçoá-los. Eles são apenas cafetões, e a política está morta.

O que deveríamos fazer? Viver com a violência Finazista, curvar-nos à arrogância dos algoritmos, aceitar a exploração crescente e o declínio dos salários? Não. Vamos lutar contra o Finazismo, pois nunca é tarde demais. Neste momento, ele está vencendo por duas razões. Primeiro, porque perdemos o prazer de estarmos juntos. Trinta anos de precariedade e competição destruiram nossa solidariedade social. A virtualização das mídias destruiu a empatia entre os corpos, o prazer de tocar o outro e o prazer de viver no espaço urbano. Perdemos o prazer no amar, por muito tempo devotado ao trabalho e às exigências virtuais. [ 3 ]  O grande exército do amor tem que acordar. Segundo, porque nossa inteligência tem sido submetida ao poder dos algoritmos em troca de um punhado de dinheiro de merda e de uma vida virtual. Por um salário miserável quando comparado aos lucros dos chefes de corporações, um pequeno exército de softwaristas estão aceitando a tarefa de destruir a dignidade humana e a justiça. O pequeno exército de programadores tem que acordar.

Há apenas uma maneira de acordar o amante que está escondido em nossos paralisados, assustados e frágeis corpos virtualizados. Há apenas uma maneira de acordar o ser humano que está escondido na vida diária miserável do softwarista: tomar as ruas e lutar. Queimar bancos é inútil, pois o poder real não está nas construções físicas, mas na conexão abstrata entre números, algoritmos e informação. Porém, ocupar bancos é bom como um ponto de partida para um processo de longo prazo de desmantelamento e re-escrita dos autômatos tecno-linguísticos que estão escravizando todos nós. Esta é a única política que conta. Alguns dizem que o movimento Occupy Wall Street não tem demandas claras e uma agenda. Esta observação é ridícula. Como no caso de todos os movimentos sociais, os contextos políticos e motivações são diversos, mesmo difusos ou muito frequentemente contraditórios. O movimento de ocupação não seria melhor com demandas mais realistas.

O que é emocionante agora é a multiplicidade de novas conexões e compromissos. Mas ainda mais emocionante é encontrar maneiras que podem pôr em marcha o “êxodo” coletivo da agonia capitalista. Não vamos falar sobre a “sustentabilidade” do movimento. Isto é chato. Tudo é transitório. Estes eventos de combustão rápida não nos ajudam a superar a depressão diária. Ocupar as praças e outros espaços públicos é uma forma de responder à curta duração das manifestações e passeatas. Estamos aqui para ficar.

Não estamos demandando uma reforma do sistema financeiro global ou do Banco Central Europeu. O retorno às moedas nacionais do passado, tal como requisitado pelos direitistas populistas, não irá tornar os cidadãos comuns menos vulneráveis às especulações monetárias. Um retorno à soberania do Estado também não é uma solução, e muitas pessoas já percebem isto. A demanda por mais intervenção, controle e supervisão dos mercados é um gesto desesperado. A verdadeira questão é que os humanos não estão mais no comando. Precisamos desmantelar as próprias máquinas. Isto pode ser feito de uma maneira muito pacífica. Hackear seus sistemas, publicar seus crimes através de iniciativas como o Wikileaks [ 4 ] e então deletar suas redes assassinas de negócios em tempo real, para sempre.

Mercados financeiros são feitos da política de velocidade e desterritorialização. Mas nós conhecemos  suas arquiteturas e vulnerabilidades. O mundo financeiro perdeu sua legitimidade. Não há mais consenso global de que o ‘mercado’ está sempre certo. E esta é nossa chance de agir. O movimento deve responder à altura. Desativar e reprogramar o software financeiro não é um sonho de uma sabotagem ludita da máquina. Regulação do mercado não irá fazer o serviço, apenas autonomia e auto-organização dos programadores pode desmantelar os algoritmos predatórios e criar programas de auto-empoderamento para a sociedade.

O intelecto geral e o corpo social erótico devem se encontrar nas ruas e nas praças, e unidos irão quebrar as cadeias do Finazismo.

Notas de tradução:

[ 1 ] No texto original o termo usado é “Ditadura Financeira”. No entanto, José Saramago, durante o documentário “Janela da Alma” já havia conceituado esse fenomeno como Ditadura Econômica, portanto acho mais prudente utilizá-lo aqui.

[ 2 ] É sempre importante lembrar a explicação e as implicações do significado do termo Bode Expiatório (com x). O bode expiatório era um animal que era apartado do rebanho e deixado só na natureza selvagem como parte das cerimônias hebraicas do Yom Kippur, o Dia da Expiação, a época do Templo de Jerusalém. Este rito é descrito na Bíblia em Levítico, capítulo 16.  Em sentido figurado, um “bode expiatório” é alguém que é escolhido  arbitrariamente para levar (sozinho) a culpa de uma calamidade, crime ou  qualquer evento negativo (que geralmente não tenha cometido). A busca  do bode expiatório é um ato irracional de determinar que uma pessoa ou  um grupo de pessoas, ou até mesmo algo, seja responsável de um ou mais  problemas sem a constatação real dos fatos. A busca do bode expiatório é um importante instrumento de propaganda. Um clássico exemplo são os judeus durante o período nazista, que eram apontados como culpados pelo colapso político e pelos problemas econômicos da Alemanha.  Atualmente, o uso de bodes expiatórios é cada vez mais combatido e,  quanto esta tendência é levada ao seu extremo, podem ser criadas regras  sociais de controle da linguagem, como no caso do politicamente correto.

[ 3 ] No caso do Brasil, vale destacar a iniciativa do Olimpicleaks ( http://olimpicleaks.midiatatica.info ), plataforma colaborativa para a publicação de documentos oficiais escondidos e materiais que detalham as reconfigurações do Rio de Janeiro para os mega-eventos globais, focando nos autoritários casos de remoções forçadas e ilegais. Antes escondidos, estes documentos agora estão digitalizados e disponíveis ao público

[ 4 ] Apesar de reconhecer a importância da tecnologia digital para a mobilização social, percebe-se que os autores não se desfazem do mito de que a Internet e comunicação eletrônica por si só afastam as pessoas.

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sex, 02/09/2011 - 11:41

Prêmio Frida

A MetaReciclagem ficou em segundo lugar na categoria Inovação do Prêmio Frida de 2011. Muita gente apoiou a nossa candidatura (149 votos recebidos pelo site). Recebemos um email simpático contando do resultado:

Estimado Felipe Fonseca,

A pesar de que su proyecto "Meta reciclagem" no ha salido ganador de esta edición del Premio FRIDA/IGF 2011, quiero anunciarle que salió segundo en la categoría Innovación. El jurado le dio un muy buen puntaje a su iniciativa, y durante la entrega de premios en el marco de LACNIC XVI (Buenos-Aires, Argentina, 3-7 de octubre 2011), será un honor anunciarlo al público presente.

Reciba mis saludos cordiales,

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M.Sc. Alexandra Dans
Responsable de Cooperación Institucional
Institutional Cooperation Officer

Vale a pena também dar uma conferida nos projetos ganhadores. O #meganao ganhou o tema Liberdades. Parabéns!

2541 leituras blog de felipefonseca
sab, 06/08/2011 - 03:23

Android, um novo Windows?

Na opinião do Liquuid o bicho tá mais pra um novo windows, veja: 

Não lembro do android ter sido vendido como projeto open-source de comunidade e talz, como o Eclipse. Ele é parte de um negócio multi-bilionário que não trouxe nada de novo pro mercado  mobile a náo ser o fato de usar a mesma estratégia que microsoft usou pra detonar a apple nos anos 90, licenciar o SO pra ganhar mercado e criar um eco-sistema em volta dele.

Pra fins de inação o android é nulo, é inegavel que sua comunidade e o número de usuários tá bombando, mas o fato do google tomar as decisões e deixar a comunidade de fora não afeta ninguém. O Android não foi um SO feito para as massas ele foi desenvolvido para os fabricantes o customizar em seus aparelhos, android é uma meta distribuição linux :P

Tanto o Android não é feito para pessoas comuns que ele não vem com drivers, é o fabricante que o desenvolve, e no geral os fontes dos drivers não são liberados, até pq no geral, diferente dos pcs onde existe um padrão e consorcios pra garantir interoperabilidade dos componentes, os celulares e tablets tem arquitetura própria.

Sei lá se garantir que o Android receba pitacos da comunidade seja algo realmente importante, sistemas como o falecido maemo foram muito mais relevantes do que o android no sentido de ter uma comunidade atuante no projeto.

Sendo direto, Android não é uma distro linux, é um modelo de negócio baseado em um sistema que usa, apesar não precisar disso, o kernel linux. É um meta-produto que deve ser finalizado pelos fabricantes dos aparelhos, e para tornar isso possivel, tem seu código aberto, e só ... desencana, android não vai ser um novo debian, tá mais pra ser um novo windows.

Liquuid 

http://thread.gmane.org/gmane.politics.organizations.metareciclagem/4568...

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qui, 07/07/2011 - 17:47

Porto Alegre

Fui semana passada a Porto Alegre, minha terra natal, a convite do GT de Cultura do FISL, o Fórum Internacional de Software Livre. Fazia muito tempo que eu não participava do fórum. A última foi em 2004, quando fui de carro com Dalton e Fejuada. Naquela vez conhecemos o Ian, junto com um monte de hackers do mundo todo que se reuniam na Debconf, visitamos o embrionário projeto dos Maristas que se tornaria o CRC de Porto Alegre e encontramos um monte de gente e projetos interessantes. Era o auge da época em que as redes ativistas de mídia, os produtores culturais, o software livre e pessoas envolvidas com políticas públicas se aproximavam, em uma efervescência de ideias e ideais que posteriormente se mostrou muito produtiva (e problemática, por certo).

Hoje os tempos são outros. O impacto inicial passou, a inovação foi assimilada e em alguns sentidos acomodada nas possibilidades da realpolitik. Um movimento forte de reação àquele potencial libertário está avançando a passos largos em quase todas as conquistas da última década. Pairam sobre nós as ameaças à privacidade, à neutralidade da rede, ao livre compartilhamento de conhecimento. O Ministério da Cultura, mais do que desacelerar, engatou marcha à ré, relegando à precariedade dezenas de projetos importantes de todo o país.

Perdi o primeiro dia de programação. Estava em trânsito desde Ubatuba: carona até Caraguatatuba, ônibus com escala em São José rumo ao aeroporto de Guarulhos, voo tranquilo até Porto Alegre. Nos dias seguintes fiquei flanando pela programação, feliz de reencontrar e conversar de novo com um monte de gente boa. MetaReciclagem está sempre nesses eventos, mesmo que implícita (talvez naturalmente implícita). Antes de tudo as redes de afetos, como profetizam Ruiz & Bailux.

Participei meio na diagonal do debate sobre Recursos Educacionais Abertos, organizado pela Bianca Santana. Estava ali feliz assistindo às apresentações de Sergio Amadeu, Nelson Pretto e Rejon quando fui convidado a falar. Não tinha preparado nada, mas tentei comentar que mais importante do que disponibilizar material com licenças livres é incentivar a sensibilidade de compartilhar, estimular que as pessoas percam o medo de "mexer" nas "criações" alheias, percam o medo de apropriar-se efetivamente não só dos objetos educacionais mas também dos processos que eles supõem e engendram.

A Transparência Hacker estava trabalhando em uma sala da PUC, e abriu espaço para metarecicleirxs que quisessem mesas, cadeiras e um wifi não tão ruim quanto nos auditórios. Aproveitamos para começar a debater por lá alguns planos que a Lelex está começando a desenvolver junto ao Memorial do Fórum Social Mundial que vai ser criado no centro de Porto Alegre.

MCT Livre?

A sexta-feira começou com boas perspectivas: Sergio Amadeu organizou uma conversa de integrantes de diversos grupos, redes e coletivos presentes no FISL com o ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante. Alguns dias antes, o ministro já tinha dado uma declaração importante em relação à reação da imprensa depois dos supostos ataques a sites do governo: diferenciando hackers de crackers, defendendo a transparência e indicando que o MCT ia adotar medidas de transparência total nesse sentido. A conversa no FISL vinha embalada nessa perspectiva. Foi também na sala da Transparência Hacker - que ficou lotada de gente - que encontramos o ministro para sugerir caminhos e possibilidades de apoio ao campo mais amplo do conhecimento livre no Brasil.
Eu fui um dos primeiros a falar, e tentei trazer a perspectiva na qual tenho insistido, da inovação baseada em tecnologias livres. Comentei rapidamente sobre as pesquisas do projeto redelabs, buscando estruturas e modelos para operar na fronteira entre arte, ciência, tecnologia e educação. Chamei a atenção para um aspecto específico: o modelo de inovação. Enquanto ficarmos presos à inovação industrial, que é orientada somente por critérios de geração de patentes para exploração comercial, estamos desperdiçando um potencial criativo enorme. É importante estimular também inovação que tenha relevância social e educacional. Que trabalhe conhecimento de fronteira (o que eu comentei outro dia como "fazer o amanhã, pensando o depois de amanhã"). Comentei que existem iniciativas pequenas, granulares, que têm um papel fundamental nos tempos atuais. E que na política de inovação falta geralmente o aspecto de experimentação: de agentes criativos travarem contato com tecnologias, mas também de incorporarem as possibilidades de deriva, descoberta, do erro como matéria prima. Questionei a necessidade de ter objetivos fechados antes mesmo de começar a pesquisar. Sugeri que alguns caminhos estão sendo sugeridos no mundo todo com os hackerspaces, hacklabs, fablabs - que não desenvolvem somente hardware e software mas também maneiras de entender as tecnologias e seu papel na sociedade. Também propus políticas que tratem de tecnologia livre, em sentido amplo: não somente computadores e software como também linguagem, metodologias de aplicação de conhecimento. Que incentivem a deriva, a descoberta, o erro. Que estabeleçam meios de financiar projetos de fronteira, de maneira descentralizada e integrada.

Bastante gente falou naquela manhã - eu destaco a contribuição da Dani da Thacker, provocando uma reflexão sobre o projeto Cultura Viva que culminou com a ideia de "Pontos de C & T". Vi Mercadante fazendo anotações em seu caderno nesse momento, e me pareceu uma semente bem plantada. Houve também contribuições sobre dezenas de assuntos: hardware livre, fabricação, formalização de atividades, o engessamento dos fundos de inovação, e por aí vai.

Ao fim, o ministro tomou de volta a palavra e comentou alguns pontos que tinham chamado a atenção dele no discurso do pessoal. Em seguida, deu algumas sugestões de encaminhamento: apoio do CTI, medidas para desonerar a produção de hardware e software, para desburocratizar pequenos empreendimentos, para adequar os sistemas do ministério aos princípios de abertura e transparência. Comentou sobre a realização de uma olimpíada de tecnologia, análoga às olimpíadas de matemática. Por fim, pediu que todas as nossas contribuições fossem compiladas em uma proposta e apresentadas formalmente ao Ministério.

Eu confesso que me surpreendi com o nível de compreensão e abertura que Mercadante demonstrou ter sobre os temas. Até então eu tinha a impressão, principalmente por conta do episódio da Foxconn, de que ele estava totalmente alinhado com a posição que no limite submete o Brasil aos fundamentos da geopolítica atual - em que Europa e Estados Unidos projetam tecnologias e os BRICs fabricam coisas. Pela conversa, percebi que existe a possibilidade de criar estratégias mais inteligentes e dinâmicas. Resta saber se a burocracia vai potencializar essa visão ou tornar-se obstáculo.

A íntegra da conversa com Mercadante está disponível aqui (audio/ogg).

Centro, FSM, fim de FISL

À tarde, parti para o centro de Porto Alegre. Encontrei Lelex, Ruiz, Fernanda Scur e Adriano Belisário no subsolo do Memorial do Rio Grande do Sul. Conhecemos o espaço que vai sediar o Memorial do FSM, e ficamos algum tempo devaneando sobre possibilidades de ocupações metarecicleiras. O prédio era a antiga sede dos Correios, e isso pode ser um elemento forte - comunicação, circulação de conhecimento, aproximação de distâncias. Em momento oportuno a gente publiciza as ideias que surgiram, mas já adianto que são joinha ;).

Na saída, Capi Etheriel se juntou a nós. Ainda andamos um pouco pelo centro de Porto Alegre, em meio às minhas lembranças de infância e adolescência. Acabamos caindo na CCMQ para bebidas quentes. Saí de lá para visitas de família.

À noite, encontrinho espontâneo no Café Bonobo, no Bom Fim. Ambiente agradável, cervejas artesanais, comida vegetariana criativa. Micronação metarecicleira se aproximando. Ficamos um bom tempo por lá. Fê Scur levou o pequeno Léo, com seus onze meses recém completos. Eu e Capi aproveitamos a chance para matar a saudade de bebês de colo... conversas boas pela noite toda e a tradicional saideira na Lancheria do Parque.

Sábado voltei ao FISL para circular um pouco e encontrar mais algumas pessoas. Assisti à apresentação do Jon Philips sobre o Milkymist: um dispositivo para fazer efeitos de vídeo em tempo real, baseado totalmente em software livre e cujos esquemas de fabricação são também livres. O Milkymist é um projeto interessante em si, mas ainda mais importante é o que ele representa: uma solução de hardware desenhada por uma equipe pequena e coesa, que pode ser fabricado em qualquer lugar do mundo. E baseado em conhecimento livre.

Saí do FISL com a impressão de que o fórum está mais sério e objetivo. Em termos práticos isso pode ser positivo, mas sinto que aquele clima de fantasia, de invenção de novos tempos, de áreas nebulosas entre realidade e desejo, definitivamente se foi. Ressalvo somente a exceção do improvável canto cyberpunk dos maristas, que mantém viva a chama da gambiarra. No geral, entretanto, resta a fria eficácia da tecnologia como ferramenta. Espero que as próximas edições reativem a dimensão tecnomágica que tanto nos seduz & inspira.

A caminho da porta, ainda vi uma multidão de adolescentes com máscaras de V e assinaturas improvisadas de grupos de "segurança". Saí sorrindo.

A(á)gora

Para encerrar a tarde de sábado, voltei ao centro de Porto Alegre. Há alguns meses, circulou nas redes uma chamada por projetos de "tecnologias sociais" para a exposição do projeto Agora/Ágora, curado por Juan Freire com o apoio da Karla Brunet. Mandei um textinho sobre a MetaReciclagem, que acabou entrando. Não tivemos mais muito feedback sobre o evento. De qualquer forma, naquele sábado à tarde, último dia do FISL, ia rolar um debate sobre "Estratégias para Autonomia: Tecnologia e Inovação Social” com Juan e Karla, mais algumas pessoas de lá. Uns dias antes, avisei que estava na cidade e me convidaram a participar.

Fiquei sabendo que eles chamaram um pessoal de Porto Alegre para criar uma instalação sobre "MetaReciclagem". Cheguei lá e tinha uns três computadores velhos rodando linux. Não foi tão ruim assim, mas pra chamar de MetaReciclagem faltou informar na rede. De todo modo, topei o debate. Eu não conhecia o Santander Cultural, uma dessas megainstituições culturais ligadas a bancos que estão ficando comuns nos anos recentes. Dei uma volta pelo lugar, saquei a exposição do Agora/Ágora, desci ao café no subsolo para um chocolate quente (inverno gaúcho é frio).

Encontrei Karla no corredor e logo subi. Conheci finalmente Juan Freire, cujos textos eu leio e admiro desde que morei em Barcelona. O debate começou com Juan conceituando um pouco as "tecnologias sociais", falando sobre a primavera árabe e os 15M espanhol. Karla contou um pouco sobre os projetos que foram selecionados para a mostra online. Tinha também uma menina designer ou arquiteta, acho que da Unisinos, que mostrou um vídeo sobre "tecnologias sociais" com musiquinha de elevador que quase me derrubou de sono. Não consegui prestar atenção à apresentação dela, de tão entediante.

Em seguida, tomou a palavra um professor da ESPM, Felipe Scherer. Falou tanta baboseira corporativa que eu fiquei me coçando pra comentar. Usou como exemplo de inovação a campanha para criar um sabor novo de Ruffles. E ele parecia falar sério, como convém a esse tipo de gente. Incorreu um monte de vezes em metáforas militares ou da época da revolução industrial (impacto, atingir, concorrer). Falou que para obter impacto na sociedade são necessárias um monte de coisas (um daqueles slides de professor da ESPM). Entre elas, propriedade intelectual.

Aí chegou minha vez. Era tanta merda que meu xará tinha falado que decidi nem tentar rebater. Mais complicado do que o texto dele era todo o subtexto que ele implica, de legitimação de um estilo de vida consumista, alienado, distanciado, desumano, materialista, individualista e mesquinho. Mas deixei pra lá.

Acabei dando aquela geral sobre a história da MetaReciclagem. Uma história que eu repeti vezes sem conta, então não preciso contar outra vez aqui. Mas fazia tempo que eu não exercitava essa narrativa, e isso acabou trazendo alguns insights que vou explorar em outros posts no site da MetaReciclagem assim que der tempo.

O debate depois foi meio surreal, com um careca afirmando que Steve Jobs é o rei da inovação e besteiras parecidas. No fim, um garoto comentou que minha fala tinha deixado ele inquieto. Ele falou que não tinha entendido se a MetaReciclagem era "uma ONG, um coletivo, uma empresa, uma ação entre amigos...". Comentei que se ele fez essa pergunta é porque não tinha entendido mesmo. Que a MetaReciclagem não é nada disso. E não quer ser.

Gostei também dos projetos que os dois organizadores do Agora/Ágora, Aron e Daniel, estão começando a desenvolver, que têm a ver com a valorização do espaço público, fazer as pessoas repensarem a relação que têm com os espaços e a cidade. Eles chamam isso de Transvenção.

Semana corrida, muita coisa pra digerir. No fim das contas, apesar das críticas pontuais que eu faço aos dois eventos, eles deram motivo pra pensar. Voltei querendo agitar umas coisas da MetaReciclagem que estão meio paradas.

Vamo que vamo!

Atualizando: encontrei os vídeos da reunião com o ministro e do debate durante o Agora/Ágora.

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qui, 07/07/2011 - 10:31

Bailux no Frequência Aberta

Regis Bailux foi entrevistado pelo programa Frequência Aberta da Rádio UFSCAR dessa semana. Escute aqui a entrevista.

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sex, 03/12/2010 - 00:48

Exercício de Identidade MetaRecicleira

Como eu tinha avisado aqui, dediquei uma tarde no meio do Fórum de Cultura Digital a brincar de identidades metarecicleiras. Levei a tela de silk (é, aquela de 2006 que ainda tá rendendo), tintas, rodo, uns panos. Descolei umas folhas de flipchart, umas canetas e me instalei ali na tenda Hands On do Fórum. Um monte de gente passou por lá, estampou a própria camiseta, levou bandeirolas. Conversamos sobre laboratórios, metareciclagem, lista, thinner, bebês, comida, futuros. Pasteur Eixo dos Santos aproveitou a audiência para pregar sobre a liberdade e o compartilhamento de felicidade e conhecimento. Distribuímos mais algumas cópias impressas do História/s da/de MetaReciclagem. MetaRecicleirxs (metarecicleiréchs) de toda parte passaram por lá, até quem mora mais longe: a família Puraqué, Régis Bailux e Paty Pataxó, entre outras dezenas.

Eu rabisquei um roteiro para o exercício de identidade. Em resumo: faça sua bandeira, compartilhe suas experiências.

Foto de VJ Varga

(foto de Daniel Varga)

No meio da tarde, levei a F4bs até o canto onde o Pitanga estava trabalhando com a Makerbot do Garoa Hacker Clube. No dia anterior, eu tinha dado uma carona para ele levar a impressora para a Cinemateca, e perguntado pra ele se era possível dar saída no logo da MetaReciclagem (as famosas três setas criadas por Bernardo Schepop) em 3D. Ele falou que sim, se a gente tivesse o arquivo vetorial. Chamei a F4bs justamente pra ajudar a importar o SVG no Blender e poder transformar no formato que a máquina lê. Por razões que um leigo como eu não faz a menor ideia, o processo demorou algum tempo, mas no fim das contas deu certo. Uma vez enviado o arquivo, em menos de sete minutos tínhamos o primeiro exemplar do logo da MetaReciclagem em 3D.

3 setas, em ABS

Eu tinha copiado o arquivo do blender que a galera fez para o meu pendrive, mas ele resolveu se apagar sozinho uns dias depois. Vou pedir pra F4bs compartilhar e depois edito esse post. O arquivo está disponível para download aqui.

No fim, o exercício rolou, daquele jeito que a MetaReciclagem tem insistido em ser - um exercício afetivo que toma a tecnologia por dominada e se concentra no encontro entre pessoas, que é muito mais importante. Na semana prévia ao aniversário do falecimento do @dpadua, esse exercício me fez lembrar da oficina que fiz com ele e a Bia Rinaldi e a Elly Guevara durante o Sinapse Digital na Poli, alguns anos atrás. Já naquela época, não nos importava mais todo o discurso da migração para o software livre. Ele parecia rumar inexoravelmente para uma vitória, o que nos deixava livres para pensar em outras coisas.

Descolamos uma pilha de revistas e uma grande caixa cheia de papeis, cartolina, cola, tintas, canetas, tesouras, etc. Propusemos que as pessoas usassem aquelas tecnologias ali para expressar o que sentiam. Sim, aquilo era uma oficina de MetaReciclagem. No sentido mais puro possível: apropriação crítica de tecnologias para a transformação social. Se transformou alguma coisa na sociedade não sei, mas eu mudei para sempre.

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Saudades, meu irmão! Espero que tenhas comemorado bem o dia da consciência de todas as cores, onde quer que estejas.

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Atualizando: publiquei o vídeo da impressão 3D das 3 setas:

4095 leituras blog de felipefonseca
seg, 04/07/2011 - 17:41

mistura de diversos ativismos horizontais

"A lista da metareciclagem pra mim é isso: a mistura de diversos ativismos horizontais, onde cada um tem a liberdade para se colocar e ser ouvido e ser reinterpretado, dando novos significados e novos propósitos, reforçando ainda mais a vontade de continuar. O próprio significado de ativismo é metareciclado aqui na lista..."

Bruno Freitas na lista metareciclagem: http://thread.gmane.org/gmane.politics.organizations.metareciclagem/45166

 

1337 leituras blog de o2
ter, 28/06/2011 - 20:40

Uma data

28 de junho outra vez. Hoje fazem exatos nove anos que, em uma noite de resfriado & frustração, trocando conversas com um subcomandante, jogamos no mundo uma semente que se chamava projeto Metá:Fora. A semente brotou, viveu, apodreceu & virou adubo. Mas essa história já foi contada mil vezes.

Hoje estou quietinho, mas quero propor uma festa para daqui a um ano. A década de metá:fora vai ser comemorada com brincadeiras, homenagens e invenções. Todxs estão convidadxs.

1527 leituras blog de felipefonseca
qua, 22/06/2011 - 15:46

Stalker, onde leio alguma coisa tua?

>Stalker, onde leio alguma coisa tua?

Na revista Doc On-line http://www.doc.ubi.pt/08/artigo_braulio_neves.pdf Na Semeiosis http://www.semeiosis.com.br/imagens-camera/ E no Estúdio Livre, quando o site voltar on-line, o texto "ciberbarricadas", (que também foi aceito no último congresso da ABCiber, <http://www.abciber2010.pontaodaeco.org/trabalhos> e na I Jornada de Pesquisa sobre Documentário na Unicamp. >

>Aquele "diálogos na casinha" é uma boa referência?

É boa referência para os assuntos e pra dar uma visão geral da abordagem. Mas, como tudo que rolou na Casinha da Luminárias, está ainda meio confuso.

> Como você vê a tua fala ali e naquele período?

Eu estava começando a usar a abordagem etnometodológica da tecnociência do Bruno Latour, então estava ainda meio deslumbrado com as idéias gerais da "antropologia simétrica" que ele inventou. Depois, eu vi que apesar de muito pertinente e sedutora, a idéia de "atores rede" não podia depender tanto dos operadores analísticos que vem da tradição da teoria da narrativa estruturalista, como são os "grafos sociotécnicos" e depois o método de análise de controvérsias. Afinal, a narratologia estruturalista é completamente cartesiana. Ainda estou para inventar os recursos de traçagem das "trajetórias" dos "atores-rede" a partir do pragmaticismo. Ou seja, sem nenhum pressuposto de descontinuidade entre sujeito/mente cognoscente e objeto/mundo cognoscível. O caminho para isso é um método bem exotérico de notação inventado pelo Ch.S. Peirce, chamado "grafos existenciais".

> Acho que gosto dessas coisas que você anda lendo, hehe!

Pode ser muito legal você ler "A esperança de Pandora" (Latour) e, em seguida, "From Cause to Causation" (Hulswit). Por caminhos diferentes, eles chegam à conclusões bem parecidas sobre as mazelas da epistemologia moderna. Isto é especialmente importante para quem tá envolvido com tecnopoeses politicas/tecnopolíticas poéticas. 

http://thread.gmane.org/gmane.politics.organizations.metareciclagem/41745/focus=41858

 

 

1306 leituras blog de o2
seg, 20/06/2011 - 14:22

TecnoMagia: Códigos

Há um desejo, um anseio, uma pretensão de demiurgo em todo escritor – como, de resto, em todo artista. Deixemos de lado (se é que é possível) a arrogância e o ego superinflado; há, no entanto, alguns que legitimamente têm o direito de se aventar a, com toda a propriedade, se dizerem Criadores. Em primeiro lugar, são aqueles que têm o domínio e o poder totais sobre a matéria-prima com que trabalham: se fazer do ofício a língua, o código, conhecer a ferramenta e saber operá-la – a pá e a lavra, ou a palavra, com todas suas nuances e sutilezas, explorando toda a potencialidade de cada combinação de letras e símbolos, dando forma e sentido harmônicos a o que, em suma, é a mesma fonte do caos. Este, o Caos, talvez o pai de toda criação.

E, no processo de (re)criação, sempre, remeter-se ao Caos: só quem pode e tem o direito de subverter a ordem, em princípio, é quem a domina e pode tratá-la intimamente. Só quem faz da sintaxe o sentir natural, a respiração, o fluir imanente do tudo arrisca-se, em algum momento, a quebrá-la ou subvertê-la – humildemente, é ciente da heresia potencial que comete, mas assume o risco lúdico de, mais e mais, (re)criar. É esse (ar)riscar que justifica nossa existência – que sejam poucos os que o fazem; são os que nos redimem a todos.

É para quem o “código”, com tudo o que tem de secreto, divino, misterioso, torna-se familiar, cotidiano, expressando-se e sendo expresso em cada detalhe. O poder alquímico de transmutar sintaxes, baldear parágrafos intransponíveis em busca de veredas redentoras, desvendar os intrincados labirintos espelhados dos símbolos primordiais, extrapola o consciente – mas, em algum momento, a lucidez embaça a própria consciência: momento mágico que se desvela no conjunto de signos, significados e significantes, como que numa revelação absurda daquilo que ofusca por ser tão claro.


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